Em 2024, surgiu um novo feriado nacional, o “Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra”. Por que agora? Como surgiu este feriado? São muitas as questões envolvidas que merecem a gente voltar no tempo e analisá-las. Provavelmente você, assim como eu, estudou na escola que, em 13 de maio de 1888, a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea e aboliu a escravidão no Brasil. O que pouca gente sabe é que a data de 13 de maio foi um feriado nacional por muitos anos, até que, na década de 1930, Getúlio Vargas caçou o feriado sob o argumento de que queria um dia para todos os brasileiros e não só para os negros. Afinal, o que os negros tinham de especial para ter um feriado só para eles? No mesmo decreto que anulou o feriado de 13 de maio, criou o 1º de maio, como Dia do Trabalho – Feriado Nacional.
Em 1969, surgiu na África do Sul o Movimento da Consciência Negra (MCN) que pregava, entre outras coisas, a necessidade do povo negro agir como um grupo. Este movimento era liderado por Stephen Bantu Biko, que dizia que a libertação psicológica precedia a libertação física e foi também um divulgador do slogan “Black is beautiful”.
No Brasil, os movimentos negros não reconheciam o 13 de maio como uma data símbolo das suas lutas. Em 1971, quatro jovens negros em Porto Alegre, Antônio Carlos Côrtes, Oliveira Silveira, Vilmar Nunes e Ilmo da Silva, fundaram o grupo Palmares e propuseram a inclusão no calendário do Dia da Consciência Negra a ser celebrado no dia 20 de novembro, data que rememora a execução de Zumbi dos Palmares. Zumbi foi líder do Quilombo dos Palmares no Estado de Alagoas e, por 15 anos, lutou contra o exército português, tendo sido degolado e a sua cabeça exposta na Praça do Carmo no dia 20 de novembro de 1695.
Os movimentos negros foram criando força em todo o Brasil e, em 9 de janeiro de 2003, por meio da Lei 10.639, a qual instituiu “História e Cultura Afro-Brasileira” como componente curricular obrigatório nas escolas, determinou também o dia 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra, mas não estabeleceu como feriado nacional. Em 2011, a Lei 12.519 oficializou como Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, novamente não transforma esta data em feriado nacional, mas previa que governos estaduais e municípios podiam optar pela adesão ou não. Seis estados aderiram: São Paulo, Rio de Janeiro, Alagoas, Amazonas, Amapá e Mato Grosso. Muitos municípios de outros estados também decretaram feriado nesta data.
Finalmente, em 21 de dezembro de 2023, com a lei 14.759, a data foi oficialmente reconhecida como feriado nacional. Mas por que este feriado será diferente dos demais? Será diferente porque se trata da celebração de uma conquista que ainda não se concretizou. O Dia 20 de novembro não é apenas para falar da consciência negra e de Zumbi, mas também para discutir o racismo no Brasil, algo que ainda perdura. Seria como celebrarmos o Dia da Independência em meio à luta contra o exército português, ou da Programação da República quando ainda não existisse uma república implantada. É uma conquista, sim, mas que precisa ser concretizada.
Segundo o censo do IBGE, 54% dos brasileiros se autodeclaram negros. Olhe para os lados nos ambientes em que você estiver e verifique se a metade das pessoas presentes é negra. Caso contrário, este ambiente não representa a população brasileira. Sim, existem razões para isso, e estas razões devem ser refletidas ao longo do ano todo, especialmente no dia 20 de novembro.
Existem fatos do passado, como os 338 anos de escravidão, que repercutem até os dias de hoje, bem como condições do presente, como pessoas negras receberem 31% a menos do que as brancas (IBGE 2020). Políticas institucionais como as de cotas raciais, que visam minimamente corrigir distorções, mas que num eventual governo de direita, podem ser “caçadas”, como foi o feriado do 13 de maio. As pequenas conquistas e o combate ao racismo precisam ser assumidos por toda a população para que não haja recuos. Vi um cartaz na Escola ACM de Porto Alegre que dizia “Assim como as flores, pessoas têm cores diferentes”. Me pareceu tão inocente, e ao mesmo tempo tão profundo. Infelizmente, ainda é necessário reafirmar que pessoas de cores diferentes são pessoas, que possuem o mesmo valor com belezas distintas.
Referências:
- Dia da Consciência Negra: significado, importância e dia do feriado.
- Dia da Consciência Negra é feriado nacional? Entenda a origem da data idealizada em Porto Alegre.
- Dia 20 de novembro, quarta-feira, é feriado nacional ou ponto facultativo?
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Foto da Capa: Cartaz dos alunos da segunda e terceira série do Colégio ACM de Porto Alegre