Vou fazer como nas séries de TV e vou lembrar o que aconteceu no nosso último episódio. Na coluna da semana passada, confessei para vocês o meu hábito de ver e ler posts de pessoas com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) no Instagram. Contei que sou muito bom nisso, pois eu me identifico com todos!
Comecei a comentar uma publicação do perfil “Jovem Senhora TDAH” com o irresistível título: 5 SINAIS DE QUE VOCÊ PODE TER TDAH E NÃO SABE!!! (Adoro listas!)
Uma das razões para gostar desses posts é ver outras pessoas passando pelas mesmas situações que vivo frequentemente. Isso me permitiu que eu compreendesse por que tomava certas atitudes e fosse menos rigoroso comigo mesmo.
Da lista feita no post acima citado, falei de duas características: “você vive esquecendo as coisas” e “você começa a fazer algo, do nada para no meio do caminho, e aí quando vai ver já começou a fazer outra coisa”.
Vamos ver as demais características apontadas pela jovem senhora e como elas acontecem no meu cotidiano!
Você se distrai facilmente no meio de uma conversa
Para mim, um clássico. Caso você for falar comigo, evite longas explicações. Eu simplesmente desligo, parece que o meu cérebro ligou um misturador de voz ou apertou em uma tecla “mute”.
No segundo minuto de conversa, eu posso estar pensando em um detalhe que você falou antes e já não prestei atenção em nada do que veio depois. Quando eu tenho intimidade com a pessoa, muitas vezes eu suplico: por favor, resuma o que você acabou de falar em apenas duas frases!
E penso: Vá direto ao ponto!
Outra distração fatal para mim são sotaques diferentes, dificilmente eu vou sossegar antes de adivinhar de onde a pessoa é. Muitas vezes, eu paro a conversa e pergunto, pois, se não faço, não vou conseguir nem prestar atenção no que ela está falando. Semana passada, aqui no meu trabalho, interrompi um paraibano. Acertei o sotaque. Como diria o personagem Chico Vendedor Raiz: conta ponto!
Anotem aí: não há elogio mais sincero que um TDAH prestando atenção no que você está falando e sem fazer “cara de paisagem” nem por um minuto!
Você não consegue olhar no olho das pessoas
Essa é uma característica muito comum no autismo. Até conversei com a autora do post que me comentou que ela, TDAH, passava por isso. Apesar de não constar nas listas que consultei sobre características do TDAH, há algo aí que me identifico muito.
Não consigo sustentar o olhar durante muito tempo em uma conversa. O olhar vai para a mosca na janela (aliás, que zumbido irritante, parece que só eu estou ouvindo) ou o botão que está prestes a cair na camisa do meu interlocutor, isso se não estou pensando na gíria que a pessoa usou e começo a olhar para o nada. “Tá ligado?”
Você sempre pede para as pessoas repetirem o que elas acabaram de dizer
Como dizem na Internet: Isso é raro, mas acontece muito. Tanto que virou piada aqui na minha casa. Minha mulher e meus filhos brincam que eu sempre falo “que” ou “oi”.
Existem algumas situações distintas em que isso acontece. Pode ser que eu esteja concentrado fazendo algo e começam a falar comigo, mas eu nem ouço. Daí, minha dica é me chamar antes, para captar minha atenção. O único problema é que estarei tão concentrado que vou tomar um susto, o que é constrangedor para todo mundo.
Tem aquela situação em que me desconcentrei e perdi o fio da meada no meio da fala. A pessoa tá lá me explicando onde eu devo entregar o formulário para cancelar o serviço que eu não pedi e eu me perco na metade da fala. Resultado: peço para falar de novo.
Mas há outra situação que é bem comum. Quando eu demoro um pouco até eu entender o que foi dito, parece que eu ouço com “delay” como dizem das transmissões de tv. Dia desses, eu vi um post no Instagram que dizia exatamente o que eu sentia:
“Às vezes, meu cérebro só entende as palavras que alguém me diz DEPOIS de eu dizer “o quê?” e eles começam a repetir tudo.
De repente, eu sei exatamente o que disseram da primeira vez, e agora meu cérebro está realmente irritado por ter que ouvir tudo de novo.”
Daí parece que estou com o rádio e a TV ligados ao mesmo tempo, passando o mesmo jogo e, nessas situações, eu nem sei de quem foi o gol.
Você tem hiperfoco em coisas ou pessoas
O hiperfoco é outra característica que as pessoas com TDAH compartilham com quem tem autismo: é um interesse intenso que leva à capacidade de grande concentração em um tema ou objeto de estudo. O hiperfoco faz que a gente saiba tudo sobre o assunto, mas tudo mesmo. É tipo aquele torcedor fanático que sabe tudo sobre o seu time, datas e escalações.
Meu filho Amir, que é autista e TDAH, tem hiperfoco em futebol americano, Eurovision e a banda sueca Sabaton. E ele sabe tudo sobre esses assuntos! Não ouse desafiá-lo!
Ao encerrar essa coluna, mais uma vez, lembro que as situações que relato não são coisas que acontecem uma ou outra vez, mas são recorrentes e afetam a minha vida há bastante tempo e fazem com que eu tenha que criar estratégias para lidar com isso no dia a dia.
Caso você faça as mesmas coisas que eu ou as que são citadas no post e você, mesmo se esforçando, continue fazendo as mesmas coisas, lembre-se que “Ao persistirem os sintomas, o médico deverá ser consultado”.