Lúcia Monteiro demoliu a estereotipada patricinha Margot Robbie em artigo publicado na Folha de S. Paulo. Lembrou que a reunião de cúpula no quartel-general da Mattel – a tal fábrica escravocrata da bonequinha capitalista – foi comandada por homens. Apesar de falarem que a alma do negócio é a agência feminina, a capacidade de fazer escolhas com independência e liberdade, aquela diretoria de héteros-caucasianos, machos-alfas com suas gravatas vistosas, mostra que no final quem manda é o patriarcado decadente capitalista.
Lúcia aponta que em determinados momentos, Barbie se torna a própria encarnação daquilo que critica ao abordar os bonecos da Mattel que saíram de linha: Allan, o não-hétero, e Midge, a Barbie grávida. A descontinuidade do Allan e da Midge escancara a submissão da fábrica à lógica escrota de uma sociedade hipócrita que só faz reproduzir sexismo e misoginia.
A articulista não se deixa seduzir com a diversidade de Barbies no filme, já que negros, asiáticos e outras minorias são simplesmente uma estratégia de marketing para compensar os danos que o padrão de beleza irrealista, inatingível e racista da boneca loira, com seios volumosos e pernas longas, causou. Mais do que isso: a pseudo diversidade não atinge os papeis de protagonistas, reservados aos loiríssimos Margot Robbie e Ryan Gosling.
Usam-se causas progressistas para perpetuar a submissão feminina a padrões de beleza da elite racista branca, patriarcado cínico e capitalismo misógino.
Enquanto a Margot Robbie com sua estonteante beleza branca tenta se humanizar ao descobrir uma imperceptível celulite na sua coxa torneada a mão por Deuses do Olimpo, a Mattel despeja milhares de dólares achacados de trabalhadores do terceiro mundo em publicidades para fazer com que crianças africanas rejeitem seus biotipos ancestrais.
No filme, a ninfeta do capitalismo diz que não tem vagina tentando cinicamente se dessensualizar, como se aquele monumento de mulher não fosse a encarnação da concentração estética, a anticristo de milhares de proletárias da beleza que tem de se contentar em ser quando muito engraçadinhas, com maridos carecas, barrigudinhos e de pau pequeno enquanto a Barbie se refestela com Kens perfeitos que lavam suas cuecas nos próprios abdomens de tanquinho e transam naquele ritmo bate-estaca.
A Barbilândia cinematográfica foi concebida pra lembrar que é proibido às pessoas comuns acessar o mundo rosa da burguesia hétera, branca e judaico-cristã, quando muito podem trabalhar em algum porão de país subdesenvolvido montando a tal bonequinha pra receber um humilhante salário de fome.
Fico imaginando como seria a Barbie ideal dos esquerdistas…
A primeira providência seria se livrar da Margot Robbie, pois, além de reproduzir o padrão estético ariano, mora no Tio Sam e estrelou o Lobo de Walt Street interpretando uma cadelinha do capitalismo.
A Barbie esquerdista seria uma mescla de Marilene Chauí, Jeans Willys e Luciana Genro, enquanto a Barbilândia seria aclimatada no Rio de Janeiro. O rosa seria substituído pelo vermelho do sangue proletário derramado na luta contra o capital.
Barbie teria um cargo na CUT, apesar de nunca ter pisado na iniciativa privada e ter passado sua vida sustentada pelos país num apartamento de classe média na Tijuca no Rio de Janeiro. Sua jornada de trabalho se resume a assinar o ponto uma vez por mês no sindicato.
Ken a conheceu numa manifestação em defesa da democracia venezuelana sob Maduro. Ele a abordou para perguntar se aquela camisa do Guevara tinha sido comprado em Cuba e despertou a atenção da revolucionária pela folha de maconha desenhada na camisa.
O boneco contou que faz parte do Coletivo Libera a Erva. Seu trabalho é passar o dia fumando maconha na beira da praia para afrontar a sociedade careta e continua morando com os pais aos 42 anos num apartamento em Copacabana.
Ficaram maravilhados ao descobrir a quantidade de coincidências nas suas vidas. Ken também é sustentado pelos país e começou a estudar sociologia e depois história na UFRJ. Acabou trancando depois de não conseguir concluir os cursos. Atualmente está há nove anos tentando ser formar em Serviço Social. Ambos tiveram cargo não remunerados no Diretório Acadêmico e ainda acusam os pais de serem burgueses escrotos por cederem a lógica do capitalismo ao trabalharem para sustentar a casa.
Barbie contou que está filiada ao Partido da Causa Operária, só vê autoritarismo na democracia burguesa e tem ânsia de vômito com a american way life. Disse que na sua cabeceira os livros Cartas do Cárcere e O Capital são presenças confirmadas e não se separa do poster da África de las Heras por um milhão de dólares. Confidenciou que já quebrou três vitrines de Mc Donald´s com paralelepípedos e também fuma maconha regularmente.
Ele convida, e Barbie aceita, tomarem um chope na Avenida Barata Ribeiro. A madruga os encontra sentados no Arpoador discutindo o melhor modelo socialista pro Brasil. Enquanto a boneca defende algo mais sisudo tipo a velha Albânia, Ken vê com bons olhos o socialismo tropical cubano. Quando a discussão começa a ficar acalorada, os lábios se encontram encerrando os debates.
Durante o beijo banhado pela luz da lua, Barbie pega a mão dele e a conduz à sua virilha e confidencia que tem vagina e não a depila, ao que Ken responde que pra isso não tem pênis. Ela pergunta: – “É por que você é um boneco?” Ele responde: – “Não, de tanto fumar maconha, fiquei broxa” e começa a chorar no sovaco cabeludo da boneca.
Ken chama um uber pra Barbie. No dia seguinte, ela tem um protesto na frente de uma escola infantil pra implantação da ideologia de gênero e banheiro unissex, enquanto Ken combinou de fumar maconha na Barra da Tijuca com seus amigos do coletivo.
Foto da capa: Perfil Barbie Socialista/Facebook