Na sua essência, uma cidade não é feita de monumentos, pontes, parques e prédios. Uma cidade é feita das pessoas que nela vivem, convivem e trabalham.
É nas cidades e seus territórios que estabelecemos nossas conexões, nossos afetos e projetamos nossos sonhos.
De qualquer sorte, nas grandes cidades do sul global, nos deparamos com duas realidades: temos a cidade instagramável dos museus, dos monumentos, das vias bem cuidadas, enfim é a cidade do conteúdo das redes sociais e, em contrapartida, temos a cidade invisível, que é a cidade da quebrada, do kit, do funk, da mãe solo sem esperança, da criança que teme a polícia, da ausência do estado, mas também da resiliência, da criatividade e da abertura à construção cidadã.
Educar para a Cidadania é se preocupar em formar o homem social ciente de seus deveres e direitos que acima de tudo compreenda os valores globais de liberdade, amor, responsabilidade social, ambiental e respeito à diversidade em todas suas dimensões.
Uma cultura cidadã bem construída humaniza as relações, diminui os investimentos do estado e aproxima as pessoas em favor de uma melhor organização social.
Em termos de cultura cidadã, a experiência da Cidade de Medellín, na Colômbia, nos ensina muito. Vem de lá o conceito de urbanismo pedagógico, que nos mostra que todos os espaços de convivência são espaços para educar e que o primeiro pedagogo deverá ser sempre o representante do estado, mas na sua ausência a sociedade jamais paralisa. Ela rapidamente se organiza, demanda a sua presença, se for o caso, e também educa!
Assim, numa comunidade cidadã e consciente, além da escola e da família, também é considerado ambiente pedagógico, a quadra da escola de samba, a praça, o terreiro, a igreja, o campo de futebol, a associação dos moradores, o ponto de ônibus e qualquer lugar sob o céu naquele território.
Nos últimos dias 26, 27 e 28 de agosto, os coletivos POA Inquieta e Ponta Cidadania organizaram o 1º Congresso Popular de Educação para Cidadania nas comunidades da Vila Planetário, Bom Jesus e Morro da Cruz, regiões periféricas da nossa cidade.
O Congresso contou com dezenas de rodas de conversa embaladas por quatro temáticas: inclusão social, empreendedorismo, educação social e educação ambiental.
Nessas rodas de conversa ouvimos crianças de 9 anos até adultos de 80 anos, moradores desses bairros, falando sobre a Porto Alegre que temos, a Porto Alegre que queremos e qual o caminho para chegarmos até essa cidade que queremos.
Foi um trabalho de empatia profunda, experiência transformadora e uma colheita que mobilizou e transformou mais de 700 pessoas dessas comunidades. Tudo feito com dezenas de voluntários, em espaços e escolas públicas que estavam abertos para nos receber sem pedir nada em troca.
Para mim, a experiência trouxe entre outras coisas a certeza de que as regiões periféricas da cidade devem ser prioridade no exercício de modelos e propostas de construção de cidadania, mas não porque estejam mais vulneráveis e sim por estarem muito mais prontas.
Nas comunidades de Porto Alegre, persiste em grande parte a matéria prima para a evolução da cultura cidadã, que pressupõe a capacidade de colaborar, a resiliência, a visão coletiva e a criatividade para propor novas experiência e novos modelos.
Na verdade, em termos de cidadania a quebrada dá aula e tem muito a ensinar à cidade instagramável.
*Cesar Paz é Empreendedor e Articulador do POA Inquieta