Foram instalados em Porto Alegre, desde o dia 13 do mês de março, em torno de 450 novos contêineres para resíduos sólidos recicláveis urbanos, em locais estratégicos de quatro bairros da cidade: Centro Histórico, Cidade Baixa, Menino Deus e Praia de Belas, automatizando, assim, a coleta destes resíduos. No entorno de alguns deles existem agentes de educação ambiental, que estão nas ruas, conversando e orientando a população sobre a forma correta de fazer a destinação eficiente dos resíduos orgânicos e recicláveis. A prefeitura pretendia, num prazo de 21 dias, instalar mais equipamentos pela cidade.
Existe uma grande discussão social sobre o impacto destes equipamentos para os catadores autônomos, que atuam na rua e dependem deste material para sua sobrevivência. Porém, este não é o foco deste artigo.
Estes materiais são destinados, num projeto-piloto, para associações e cooperativas contratadas pelo DMLU (Departamento Municipal de Limpeza Urbana).
Apenas duas associações de catadores contratadas pela Prefeitura aceitaram participar deste projeto, recebendo em média 02 cargas por semana, à noite ou durante o dia, cada uma. A desmotivação da maioria das associações/cooperativas contratadas, que optou por não receber este material, se dá pelo não pagamento do serviço prestado, aumento dos custos (mais uma pessoa para triar este resíduo, pois vem solto e colocado no chão, o que dificulta colocar no cesto, uma outra pessoa para retirada do rejeito e impacto no índice de rejeito que reflete em descontos no valor do contrato). Além disso, existe uma dúvida sobre a qualidade destes resíduos. Convém registrar que duas outras instituições de catadores contratadas pela Prefeitura receberam este material, uma delas uma única vez e outra 4 vezes, ambas desistiram por entenderem que não valia a pena o custo-benefício.
Segundo dados coletados junto ao DMLU, os caminhões desta coleta possuem capacidade aproximada de 1 tonelada. Este cálculo é aproximado, pois pesagens realizadas em algumas cargas/dia realizadas e encaminhadas para a UT Lomba do Pinheiro, onde está localizado o transbordo, variam entre 480kg e 1.420 kg.
Assim, vamos para a parte prática. Eu mesma realizei uma gravimetria do material recebido pelas 2 associações que participam do projeto-piloto para averiguar se vale a pena acessar este material e a amostragem após 30 dias do início do projeto é essa:
A pesquisa ocorreu em dois dias em que estava acumulado o material de duas cargas recebidas no turno do dia e da noite e estavam aguardando a triagem de cada associação. Então, foram gravadas quatro cargas. Tive a ajuda de quatro associados (dois de cada associação).
Estima-se que cada carga tenha um peso de 600kg, assim sendo, trabalhamos com aproximadamente 2.600 kg de material entre as duas associações. Para armazenamento do material, utilizamos bags e bombonas com capacidade de 50kg cada.
Material | Kg | |||
Papelão | 49 | |||
Papel Branco | 15 | |||
Tetra | 85 | |||
Pet Branca | 08 | |||
Pett Verde | 02 | |||
PEADB | 21 | |||
PEADC | 43 | |||
PEBDB | 105 | |||
PEDC | 143 | |||
PVC | 02 | |||
Balde/Bacia | 62 | |||
Latinha | 04 | |||
Sucata de Ferro | 06 | |||
Vidro
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220
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Total 765kg de material produzido por associação, gerando, em média, o valor de R$ 495,00 de comercialização para cada grupo a cada duas coletas recebidas e uma média de 1.835 kg de rejeito.
O que mais impressiona é que em torno de 60% deste rejeito poderia retornar para a indústria se os materiais produzidos pela própria indústria tivessem reciclabilidade, proporcionando, assim, o fechamento da logística reversa. Quando falamos de falta de reciclabilidade, estamos tratando de modelos de embalagens que não têm possibilidade de reciclagem, como as embalagens PETs coloridas (com exceção das azuis e verdes), as embalagens de bolachas, as embalagens de café a vácuo pacote e de macarrão, por exemplo. Estas embalagens contêm na sua composição materiais que inviabilizam a reciclagem, gerando um índice muito alto de material que vai para o Aterro Sanitário.
Também se observou muito resto de alimentos e podas de arbustos, deixando claro que deveria ter um aumento na compostagem, por meio de ações educativas e de geração de renda para os catadores. da mesma forma, são necessárias ações efetivas de Educação Ambiental junto à população. Entendo que essa divulgação deve acontecer especialmente nas mídias sociais e veículos de comunicação de massa, para pontuar de maneira constante os tipos de materiais que não tem reciclabilidade e estimulando a observar e não consumir determinadas marcas por conta da embalagem. Além disso é uma ferramenta de tensionamento na indústria.
Quanto à parte pedagógica, ficamos muito otimistas com a nova lei de Educação Ambiental nas Escolas, o PL 4820/24, que prevê obrigações para educação ambiental em escolas púbicas e privadas.
Porém, enquanto ações de conscientização não ocorrem, concluímos que é prejuízo para as associações e cooperativas o recebimento destes materiais, já que é um trabalho redobrado, cansativo e que causa um aumento nas despesas operacionais e no índice de rejeito, impactando no valor a receber pelo serviço prestado junto ao DMLU.
Entendemos que o descarte dos resíduos é um problema que vai além da implementação dos contêineres por parte da Prefeitura e que envolve, sim, questões como medidas educativas e a fabricação de embalagens reutilizáveis. Existe uma questão social envolvendo os catadores individuais e os contratados pela Prefeitura que trataremos em outro artigo.
Simone Pinheiro é assessora técnica de Associações e Cooperativas de Unidades de Triagem, assistente social, mestre em Ciências Sociais e articuladora do POA Inquieta
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Foto da Capa: Alex Rocha PMPA