A indústria do petróleo é nossa malvada favorita. Nossa, de Hollywood e de muitos ativistas ambientais. Quase todos os dias ouvimos dizer que a queima de combustíveis fósseis (e nesse caso, pelo menos no Brasil, geralmente pensamos em diesel e gasolina) é a principal causa do aquecimento global. Seguidamente aparece um filme em que ambições corporativas trazem destruição e morte às comunidades em sua busca insana pelo precioso líquido.
Na verdade, as coisas são um tanto diferentes. Não que as petroleiras não mereçam a má fama que têm. Muitas delas, principalmente as grandes corporações multinacionais, têm um histórico tenebroso de associação com elites corruptas e ditadores sanguinários que ficam com todo o dinheiro pago pelas empresas enquanto deixam sua população condenada à miséria. E a queima dos derivados de petróleo é sim uma das principais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa (GEEs).
No entanto, como costuma acontecer, a realidade é mais complicada. Vejamos a seguir quais são os principais processo pelos quais os humanos emitem GEEs:
- Fabricação de materiais: 31%
- Geração de eletricidade: 28%
- Agricultura (e outras formas de uso da terra): 18%
- Transporte: 17%
- Aquecimento e refrigeração: 7%
Olhe bem esses números. A mim esses eles surpreenderam. Quando ouvimos falar que a fabricação de materiais é a principal fonte das emissões de GEEs? E a surpresa fica ainda maior quando ficamos sabendo que, embora nessa categoria estejam incluídos produtos da cadeia de produção de petróleo (mas não a queima dos derivados), a maior parte das emissões aqui são causadas pela fabricação de concreto e de aço.
Nas próximas colunas, começando nesta, vou me debruçar sobre esses itens. Talvez seja um tanto enfadonho ter que ler a descrição de processos industriais. Mas, se queremos de fato enfrentar os problemas com realismo, precisamos conhecê-los bem, e não ficarmos só nas generalizações simplistas.
Comecemos pelo concreto. O concreto é fabricado misturando-se cimento, cascalho, areia e água. Esses três últimos, embora sua obtenção possa causar problemas ambientais, não envolvem emissões significativas de GEEs. Mas o cimento sim. Ele é obtido a partir de calcário, uma rocha comum composta principalmente por carbonato de cálcio, cuja composição química é CaCO3. Do calcário, a parte que é utilizada para fabricar cimento é o cálcio. Para se obter o cálcio queima-se o calcário no forno e assim separa-se o cálcio, liberando oxigênio e CO2. Já percebeu, não? Todo o cimento, e todo o concreto que é fabricado a partir dele, resultam de um processo que libera CO2 na atmosfera. E continuamos a fabricar muito concreto.
Todos os anos os Estados Unidos produzem mais de 99 milhões de toneladas de cimento. O Brasil fabrica 70 milhões de toneladas. A Índia produz 280 milhões, com tendência de alta. Mas a produção da China é quase inacreditável. A China produz 2,4 bilhões de toneladas por ano! Para cada tonelada de cimento produzido, libera-se uma tonelada de CO2 na atmosfera. E não há perspectivas de que vá haver redução da produção.
Fabricar aço gera ainda mais emissões por tonelada. Seu principal componente é, naturalmente, o ferro, que os humanos conhecem há milhares de anos. O ferro geralmente é encontrado na forma de óxido de ferro. E, para se obter um material mais maleável e flexível (o aço), o ferro é misturado com uma pequena quantidade de carbono. O processo de fabricação do aço envolve fundir-se o óxido de ferro utilizando-se um tipo de carvão especial denominado coque. Uma parte do carbono do carvão se liga ao ferro, formando o aço, e o resto se liga ao oxigênio formando CO2. Muito CO2. Para cada tonelada de aço produzida libera-se 1,8 toneladas para a atmosfera. O mundo produz 1,95 bilhões de toneladas de aço por ano, e as estimativas são de que vai aumentar.
O terceiro material cuja produção envolve muito carbono é o plástico. No entanto, embora os processos de produção do plástico liberem certa quantidade de CO2, a maior parte do carbono fica retida no próprio produto, e será liberada lentamente conforme o plástico degrada. Esta característica seria boa se o plástico fosse corretamente descartado e reciclado. Mas isso não acontece. Apesar das empresas que produzem ou utilizam o plástico fazerem muita propaganda da reciclagem, o fato é que a reciclagem de plástico é um conceito que fracassou. Menos de 9% do plástico é reciclado.
A poluição plástica representa um ameaça talvez tão grande à vida e ao meio-ambiente quanto as mudanças climáticas. Voltarei a esse assunto futuramente.
Pois bem, apenas começamos a ver os processos pelos quais emitimos os GEEs, e já tivemos algumas surpresas. E, se você tiver paciência para ler esses textos mais técnicos – e, portanto, um tanto maçantes, reconheço – vai terminar com uma visão muito diferente daquela que tinha antes. Pelo menos para mim foi assim quando eu estudei esse assunto. Sem cansar de ser repetitivo: temos que conhecer bem os problemas se quisermos de fato resolvê-los. Então, nos a semana que vem!