Falar de diferença considerando que somos inegavelmente diferentes, encarando a fragilidade da condição humana e contrapondo-se ao preconceito estrutural é desafio urgente e necessário. Até porque a discriminação que nos ronda é implacável. Mesmo assim, seguimos firmes nesta incrível caminhada pela diversidade – que é minha, é tua, é de cada um de nós. Uma caminhada desafiadora que precisa ser impulsionada por muitas vozes. E vozes libertárias!
A sociedade deveria ser o reflexo das diferenças que nos constituem como sujeitos únicos e não criaturas hipoteticamente iguais. Já escrevi sobre isto várias vezes e vou escrever quantas vezes sentir necessidade de fazer a minha e a voz de tantas pessoas ecoarem. Para além da eliminação de barreiras físicas, acessibilidade é cidadania, direito social, independência, respeito, capacidade de olhar o outro e acolher.
É preciso mostrar, instigar e fazer pensar, evitando o sensacionalismo e o desgastado discurso da superação, que não contribui em nada para o nosso estar no mundo. Promover a inclusão de pessoas com deficiência física, intelectual, visual, auditiva, com autismo, superdotação ou altas habilidades, entre outras diferenças – e são muitas! – significa reconhecer nossa condição de alcançar, com confiança e autonomia, trabalho, equipamentos urbanos e mobiliários adequados, espaços públicos de lazer, meios de transporte. Enfim! A lista é enorme.
O direito de ir e vir, com segurança e tranquilidade, é fundamental. Mas o que temos ainda é pouco, apesar das promessas, das frentes parlamentares, dos discursos inflamados e barulhentos. Mais de 45 milhões de brasileiros têm algum tipo de deficiência, o que significa que não correspondem ao padrão instituído e reconhecido pela sociedade normalizada. É praticamente 24% da população. Não é pouco. E não corresponder ao padrão não é submeter-se ao discurso reducionista da meritocracia ou ao discurso capacitista, que julgam constantemente e não reconhecem talento em uma pessoa diferente da média.
Portanto, o respeito ainda passa longe!
E o estranhamento? E os olhares invasivos que nos perseguem? E as piadinhas que pessoas com nanismo ouvem nas ruas? E as piadinhas de mau gosto que rolam nas redes sociais para divertir uma boa camada de usuários? Em relação ao nanismo, são inúmeras. Até aquelas que dizem que é um “defeitinho”. A internet possibilitou que as pessoas exerçam suas maldades sem mostrar o rosto, covardemente, como convém aos hipócritas. E o melhor a fazer é ignorar. Não dar palco para tanta maldade, ignorância e insensibilidade.
O preconceito avassalador está por todos os lados.
O que dizer, por exemplo, da discriminação racial que se alastra Brasil afora? E da discriminação de classe?
Mas não estamos acomodados de jeito nenhum, muito menos sozinhos. O que me anima hoje é acompanhar o protagonismo dos negros e participar de associações e grupos focados em esclarecer e combater a discriminação como deve ser combatida, com determinação e justiça, sem a espetacularização. Até porque as fronteiras entre o público e o privado estão muito borradas e precisamos cuidar da nossa privacidade e viver o cotidiano da melhor maneira possível.
Em relação ao nanismo, temos a Annabra/Associação Nanismo Brasil e a Annabra/RS que fazem um trabalho maravilhoso no sentido de conscientizar as pessoas sobre como tratar física e psicologicamente as crianças e como lidar com o preconceito na família, na escola e em ambientes públicos. Recentemente promoveram o Simpósio Brasileiro de Nanismo, no Rio de Janeiro (dias 20 e 21 de outubro) que reuniu famílias do Brasil inteiro. Kênia Rio (foto da capa), carioca, presidente da Annabra, e Vélvit Severo, gaúcha, diretora de Políticas Públicas, são mulheres de ação e muita sensibilidade que me estimulam cotidianamente a não desistir.
O poeta Carlos Drummond de Andrade já disse: “Não há guarda-chuva contra o mundo”. Portanto, há que se mergulhar com arte e determinação, faça chuva ou faça sol.
Foto da Capa: Instituto Nacional de Nanismo