Que tal começar o ano na companhia de criações de dois brasileiros exemplares? Ou dois dos melhores exemplares de brasileiros? Dos bons brasileiros, claro. Falo da Louca Esperança, de Mário Quintana, e do Realista Esperançoso, que o Ariano Suassuna preferia ao Tolo Otimista e ao Chato Pessimista.
Na hora zero do 1º de janeiro deste 2024, a velha louca Esperança voou do 12º andar do ano, explodiu e renasceu em fogos coloridos, driblou o tolo otimismo e o chato pessimismo e deu a mão ao Realismo Esperançoso que a esperava para mais uma jornada de vida.
Vamos lá, disse a Esperança renovada. Vamos à Utopia. Olha! Ela está ali, no horizonte, ao alcance dos nossos olhos…
Vamos, concorda o Realismo, mas não esqueça o que disse…
Não esqueço, não, interrompe Esperança. Eu sei bem o que disse, um dia, o cineasta argentino Fernando Birri. A Utopia está no horizonte! Então, seja mais esperançoso nesse seu realismo. Caminhe comigo em busca do horizonte…
Claro! Caminhemos! Mas não podemos esquecer outra frase do Birri, continuou o Realismo. Ele explicou, para uns universitários colombianos, que ela – a Utopia – está no horizonte e que ele – o horizonte – cada vez que a gente anda dois passos, se afasta dois passos…E quando a gente corre 10 passos o horizonte se afasta na mesma velocidade.
Então, na real mesmo, nós nunca vamos alcançar a Utopia, a ilha criada pelo talento de Thomas Morus em 1516, que abrigaria uma sociedade onde ninguém nem imagina o que é autoritarismo, onde a intolerância e a violência não vigoram. Onde só se vive em paz.
Ora, ora meu companheiro de jornada, pois é para isso que eu existo e me renovo sempre: para caminhar e nunca desistir. Foi o que disse Fernando Birri, a Utopia existe para isso: para nos fazer caminhar.
E, tenho certeza meu parceiro Realista, para isso você anda de mãos dadas comigo. A gente não pode alcançar o horizonte, mas pode conquistar um pouquinho da Utopia todos os dias, né? Utopia pode não ser destino a ser alcançado, mas pode ser farol a indicar caminhos que nos levem a tempos mais iluminados.
O Realista Esperançoso apertou um pouco mais a mão da Esperança e disse animado: é… esse caminho é cheio de obstáculos, mas com você a nos guiar vamos seguir em frente, cada um criando, a cada momento, a sua própria Utopia.
Pois é… a pessoa pobre que chega à universidade começa a viver a própria Utopia, comemora a Esperança. O portal de notícias UOL, no dia 5 deste janeiro de 2024, conta a história da jovem Vanusa Gonçalves dos Santos, órfã desde pequena, que vive até agora nas ruas, vendendo balas, entregando panfletos de dia e dormindo em abrigos, que passou, pelo ENEM, no vestibular de Letras.
É…diz o Esperançoso, com um suspiro do fundo do seu realismo. Eu li a história da Vanusa. Ela disse uma frase bonita: “A educação vai me tirar da rua”. Mas não esqueça que ela é uma exceção e que está nas mãos daqueles que o povo escolhe como governantes, como parlamentares, criar as condições para que cada vez menos Vanusas, Mariazinhas, Joãozinhos andem por aí, sobrevivendo debaixo de viadutos e marquises e sem vislumbrar sequer um sinal no horizonte, quanto mais imaginar a Utopia…
Então, amigo Realista, não podemos, nunca, desesperar. Se alguns eleitos não cumprem seus papéis, a gente os tira do caminho na eleição seguinte e bota outros no lugar deles esperando, sempre, que os substitutos sejam melhores que os antecessores.
Hoje mesmo, oito de janeiro, lembra Esperança, nós, eternos utópicos, maioria absoluta em todos os povos do mundo, comemoramos a vitória da liberdade, do direito à diversidade, da igualdade, contra uns poucos distópicos – ou antiutópicos – que tentaram, um ano atrás, impedir que o Brasil seguisse na estrada da democracia a caminhada em busca da Utopia…
Nesse ponto, o Realismo interrompeu a Esperança: é, minha querida amiga, mas eles estão aí e vão continuar criando dificuldades, empurrando o horizonte ainda mais para lá…
Estão aí e vão continuar por todo o sempre, parceiro. São os golpistas de sempre. Por isso, você precisa seguir caminhando comigo. Como dois craques da bola, nossa tabelinha – Esperança e Realismo – vai acumular vitórias contra quem quer que se oponha ao nosso avanço na direção da sociedade mais justa que todos queremos.
Com você ao meu lado, Realismo, espero voar – outra vez – do 12º andar deste em meio a uma sinfonia universal iluminada só por fogos de artifício, sem os estrondos tristes dos mísseis, dos canhões e das metralhadoras. E quero, outra vez, dar a mão a você e a todas as Vanusas, Marias e Joãozinhos que a educação tiver resgatado das ruas e seguir deixando pelo caminho tudo e todos os que ousarem impedir nossa eterna caminhada em busca da Utopia.
Abraçados, Realismo e Esperança seguem rumo ao horizonte. Ele está logo ali..
Foto da Capa: Freepik