Resolveram organizar uma verdadeira festa da confraternização. Ela foi bem-vinda, que o mundo estava mesmo precisando disso. Era para ser uma festa eclética, e foi mesmo. Tinha judeu e árabe, tinha gremista e colorado, tinha bolsonarista e lulista. Tudo ia razoavelmente bem até que os convivas começaram a se conhecer melhor, ao mesmo tempo em que bebericavam, soltando as suas mais sinceras impressões e expressões.
E, como ondas no céu ou águas no mar, houve movimentos migratórios, no meio do salão principal. Algumas músicas (discutidas) depois, já havia grupinhos bem delimitados, escondidos em cada canto, e que não se misturavam aos demais. Judeus com judeus, árabes com árabes, gremistas com gremistas, colorados com colorados, bolsonaristas com bolsonaristas e lulistas com lulistas.
O pessoal confinado foi se conhecendo melhor e já nasciam novas amizades eugênicas, incluindo alguns lances amorosos, com direito a mãos dadas, abraços e beijinhos. Mesmo assim, a organização estava frustrada, pois desejava que aquilo acontecesse entre os diferentes grupos, e não com aquele retorno às tribos originais, sem abertura maior nem mistura interna. Mas o pior estava por vir. E veio.
Havia gremistas absolutamente contra a permanência do Renato Portaluppi como treinador. Juravam que ele havia se transformado em uma estátua que se considerava acima da humanidade e, com a sua arrogância, só vinha afundando o time. Para o resto dos tricolores, tratava-se de um grupo ingrato que estava cuspindo no prato mais valioso que comeu, e agora precisava ser banido.
Quanto aos colorados, havia aqueles que perdoaram os gols perdidos pelo Enner Valencia, contra o Fluminense, na Libertadores, e esperavam dele o protagonismo nos títulos de 2024. Foram alvejados pela turma do “cachorro ovelheiro” garantindo que um alvo torto jamais poderia ser consertado e convinha mandar o ex-craque de volta para o Equador, o mais rápido possível.
Quanto aos árabes, o grupo cristão maronita fazia críticas severas ao pessoal muçulmano, e vice-versa, pouco importando que houvesse uma Líbano em comum para os seus ancestrais. Melhor deixar de conviver uns com os outros, antes que fosse tarde. Entre os bolsonaristas, os menos radicais juravam que nunca quiseram o golpe, e os mais radicais riam disso, com escárnio.
Entre os lulistas, havia aqueles que consideravam Lula mais importante do que o próprio Renato e já não eram suportados pelos que teciam críticas a algumas falas do Presidente, a quem, naquele momento, não ergueriam uma estátua. Na mesma hora, deu o maior racha entre os judeus, depois que o primeiro asquenazi afirmou que sefardita nenhum é confiável.
O pau só não correu soltou, porque cada um se abrigou na sua própria sinagoga.
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Foto da Capa: Freepik