A Inteligência Artificial (IA), cada vez mais presente em diversos setores, já é uma realidade, algo que indiscutivelmente traz muitos ganhos para a humanidade. Através da utilização da IA podemos resolver mais rapidamente problemas de trânsito, econômicos, de saúde, de engenharia, realizar avaliações políticas, sociais, explorar outras galáxias, e há quem jure que pode ser utilizada até mesmo para encontrar a pessoa amada.
No mundo jurídico não é diferente. Esta tecnologia emergente tem o poder de mudar a maneira como os advogados trabalham, desde uma simples pesquisa até a análise de grandes volumes de documentos legais. A ferramenta pode ser muitíssimo útil já que ajuda a acelerar processos, aumentar eficiência e diminuir custos. Claro que, como em todo processo revolucionário de mudança, muitos veem o IA como uma ameaça substituindo os advogados em várias tarefas.
A IA é uma tecnologia que permite que máquinas, robôs, sistemas, simulem uma inteligência similar à humana. Ela é muito mais do que um simples programa que executa comandas. Ela é capaz de ir além, pensar, tomar decisões de forma autônoma, valendo-se de sua análise sobre padrões armazenados em enormes bancos de dados. A grosso modo, no mundo do Direito, uma IA poderia simular o raciocínio de um advogado, estagiário, juiz, promotor etc.
Assim, podemos definir inteligência artificial como a capacidade das máquinas de pensarem como seres humanos: aprender, perceber e decidir quais caminhos seguir, de forma racional, diante de determinadas situações.
Obviamente os computadores precisam de bons modelos de dados, acesso a grandes quantidades de dados não processados, e uma computação com custo acessível, o que já está disponível em abundância, até mesmo no Brasil.
Para a análise desses dados, as IA usam algoritmos, que são sequências com instruções definidas, usualmente utilizadas para a solução de problemas de matemática, a execução de tarefas, cálculos e equações.
Chamam-se algoritmos “preditivos”, aqueles que aprendem com os dados iniciais. Por isso quanto maior for o número de dados para servir de exemplo, mais rápido o algoritmo irá aprender e desenvolver um raciocínio baseado nas informações que lhe foram fornecidas. As informações de entrada em um algoritmo preditivo são constituídas de uma série temporal. O algoritmo abastecido com informações sobre a variação do preço de um determinado produto, por uma série de anos, poderá prever qual será a variação de preço nos anos subsequentes.
Entendida a definição de Inteligência Artificial e como ela funciona, podemos afirmar que esta tecnologia tem mudado o campo do direito de várias maneiras, trazendo novas possibilidades bem como desafios a prática jurídica. Como exemplo podemos citar:
- Análise de documentos tais como contratos, petições, decisões judiciais. Ajuda na análise de documentos legais podendo identificar informações importantes, insights e padrões úteis que podem ser utilizados em tomadas de decisão;
- Automação de tarefas repetitivas como preenchimento de formulários, triagem de casos, gerenciamento de documentos…isso poupa tempo e permite que os advogados concentrem-se em trabalhos mais dispendiosos;
- Pesquisa jurídica aumentando a precisão na busca por precedentes e jurisprudência;
- Análise Preditiva ajuda a prever resultados em casos legais com base em dados históricos. Ajudam os advogados a entender as chances de sucesso em um caso e a tomar decisões sobre o como proceder;
- Assistência Jurídica em larga escala. A IA pode fornecer informações legais e orientações sobre direitos e responsabilidades legais.
Embora a IA possua muitos benefícios, também apresenta desafios, como as questões éticas, de privacidade e de segurança. É imprescindível que os advogados entendam como usar a IA de maneira eficaz e responsável.
No Brasil, a IA já está sendo utilizada pelos operadores do direito e da justiça há alguns anos visando dar maior celeridade aos órgãos públicos. Como exemplo, menciono o Supremo Tribunal Federal com o robô Victor, o Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal de Justiça de Rondônia com o robô Sinapses.
Conforme publicado no artigo da Dra. Fernanda Ivo Pires, Responsabilidade Civil e o “Robô Advogado”, no livro Responsabilidade Civil e Novas Tecnologias, publicado pela Editora Foco, em 2020, segundo o ministro Luiz Fux, o robô Victor teria “o condão de trazer para o quotidiano do STF, um “robô inteligente” que possui entre outras potencialidades:
I) Converter imagens em textos no processo digital;
II) Separar e classificar as peças processuais mais utilizadas nas atividades do STF. Assim, a máquina consegue fazer em 5 segundos um trabalho que antes era feito por servidores em aproximadamente 30 minutos;
III) Identificar a incidência dos temas de repercussão geral mais comuns. Neste caso, segundo o ministro, o robô auxilia na resolução de 10 mil recursos extraordinários que chegam ao STF;
IV) Potencial auxílio na resolução de 1/8 dos Recursos Especiais que chegam ao STF.
Consoante também informa o referido artigo, o ministro Fux, além de deixar claro que não caberá ao um robô julgar, que isso é uma atividade humana, ainda criticou os equívocos na utilização de uma ferramenta de IA pelo Poder Judiciário nos Estados Unidos, chamada “The Compass”. Inclusive foi salientado no artigo que “o então Advogado-Geral da União dos EUA, Eric Holder, afirmou que estudos vêm se preocupando cada vez mais com a existência de vieses de algoritmos em relação a tais sistemas de inteligência, em especial no tocante ao quesito raça”. Todavia, cumpre informar que em alguns países, por exemplo, na Estônia, a IA já vem sendo utilizada para decidir causas simples, com valor até 7 mil euros.
Recentemente, o Ministro do STF, Luís Alberto Barroso anunciou ter solicitado para a Amazon, Microsoft e Google, três “encomendas” de Inteligência Artificial, para que sejam usadas pelo poder judiciário. Mencionou inclusive um programa capaz de realizar resumos de processos e a harmonização dos sistemas judiciais eletrônicos.
Como advogado, considero que a IA é um grande avanço no poder judiciário, que ganhará maior celeridade e previsibilidade, além de aumentar a eficiência e a precisão, economizar tempo e recursos, e auxiliar nas tomadas de decisão. Vejo a inteligência AI como mais uma ferramenta, uma tecnologia excelente ao nosso dispor que, saliente-se, já vem sendo utilizada em vários escritórios jurídicos no Brasil, que usam sistemas de armazenamento de dados que geram relatórios, dos quais é possível se extrair diversas consequências e previsões.
Ainda que a IA possa permitir que pequenos problemas ou controvérsias possam ser resolvidos por uma máquina, sem a necessidade de uma disputa judicial acompanhada por advogados, sempre haverá conflitos e processos em que o olhar humano será muito importante para o entendimento. Outrossim, por mais que existam formulários padronizados, ou elaborados por uma IA, determinados contratos ou situações mais complexas, sempre precisarão de um olhar e de uma negociação humana, e não menos importante da experiência de um advogado para alertar seu cliente dos riscos e vantagens que ele terá se fechar um contrato.
A subjetividade de cada parte, algo fundamental no direito, é imprescindível para se avaliar, sem o olhar ou a percepção humana. Para se calcular/considerar a validade de uma obrigação, examinar a boa-fé objetiva das partes, a real compreensão e intenção das contratantes ao se fechar um negócio, o que era esperado por cada uma delas, o que elas estavam sentindo ao praticar determinado ato, não tenho dúvida que, por enquanto, um cérebro humano é bem mais treinado.
O fato é que a IA está aí, sendo usada inclusive nos provedores de redes sociais, nas consultorias econômicas, políticas e sociais. A IA é uma realidade que se impôs, e que trará cada vez mais mudanças para a sociedade e todos os operadores do direito. Entretanto, otimista que sou, creio essas mudanças serão na sua maioria, benéficas. Imagino que a advocacia ainda será uma profissão necessária nas próximas décadas e distante da obsolescência. Quem viver, verá.
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