Caso você não esteja por dentro da polêmica da semana nas mídias sociais, eu explico: a comediante Livia La Gatto postou um vídeo imitando o “masculinista” Thiago Schutz. Caracterizada com bigode e cabeça calva como ele, Livia fala uma sequência de frases misóginas e machistas. O vídeo viralizou e, apesar de Livia não o citar nominalmente, Thiago enviou uma mensagem para a comediante com a seguinte mensagem: “Vc tem 24h para retirar seu conteúdo sobre mim. Dps disso processo ou bala. Vc escolhe”.
O fato de a polícia ter aberto inquérito para investigar as ameaças de Thiago contra Lívia desencadeou um acontecimento ciberjornalístico de grande repercussão com notícias em veículos de imprensa e até manifestação da marca de bebida Campari. Isso porque o coach masculinista é conhecido como o Calvo da Campari já que ficou famoso ao dizer que não deixaria de tomar o drink mesmo se uma mulher o oferecesse uma cerveja num bar. O grupo Campari emitiu uma nota de repúdio às falas de Thiago.
O acontecimento foi o estopim de um posicionamento abusivo e tóxico que o coach e palestrante adota nas mídias sociais onde se diz capaz de resolver os problemas de relacionamento e masculinidade dos homens com frases polêmicas como “vou te explicar por que um cara que come 1000 mulheres não é igual a uma mulher que dá pra 100”, “o cara filho da puta consegue mulher e o bonzinho dorme sozinho” e “mulher malandra tem que ser tratada desta forma”, “é instintivo e biológico, o homem sempre teve um monte de mulher à disposição”, “pra dormir com cem mulheres ao longo da vida tem que ser um cara foda”, “Pra mulher dormir com cem caras ela só tem que querer dar para 100 caras”, “a mulher quer brigar por um cara para se sentir escolhida por ele”, “a mulher poderosa recebe o máximo de atenção dando o mínimo de sexo em troca, o homem foda é o que tem o máximo de sexo delas” e por aí vai o desfile de preconceitos e manifestações de desvalorização da mulher em relacionamentos e na sociedade.
Neste show de misoginia, o termo red pill (pílula vermelha) virou munição para atacar as mulheres. A pílula vermelha é uma referência a uma cena do filme Matrix na qual Morpheus (Laurence Fishbone) oferece uma pílula vermelha e outra azul a Neo (Keanu Reeves): caso escolhesse a azul seguiria na Matrix, se optasse pela vermelha teria liberdade e acesso ao mundo real. Ao longo dos anos o significado das pílulas foi transformado e a metáfora da pílula vermelha foi adotada por grupos que têm aversão às mulheres. Para os “red pills”, o propósito é batalhar pela valorização da masculinidade em um mundo no qual o sistema favorece as mulheres e o feminismo. O movimento cria uma oposição aos homens blue pills (pílula azul) que seriam aqueles que vivem uma ilusão e se deixam ser usados pelas mulheres.
Thiago Schultz é um entre outros influenciadores de comportamento e relacionamento que se posicionam contra a diversidade e o respeito à diferença de gênero, não possui nenhuma formação em psicologia, sociologia, psicoterapia ou qualquer outra base lógica e científica. Não possui legitimidade nem conhecimento, mas alcança alta visibilidade na internet. Ele é homem e se considera masculinista e isto basta se autointitular coach e somar 338 mil seguidores no Instagram. Como disse certa vez Umberto Eco sobre as redes sociais darem voz a uma legião de idiotas: “antes só falavam em uma mesa de bar depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a humanidade. Eram rapidamente silenciados. Agora têm o mesmo direito de falar que um prêmio Nobel. É a invasão dos imbecis”.
Fim.