Há cerca de três décadas eu pesquiso e trabalho com temas relacionados à sustentabilidade. Nos anos 90 eu precisava mostrar dados para tentar convencer alguns alunos de que jogar lixo nos rios e desmatar florestas traria consequências para eles mesmos, mas eles me respondiam dizendo que esta conversa era mais um modismo, logo ninguém mais iria falar nestas coisas. Quando fiz concurso para ser professor no Curso de Administração, alguns me questionaram por que na Administração? Não seria melhor ir trabalhar lá na Ecologia, Biologia ou áreas afins?
Tive a oportunidade de criar a primeira disciplina de graduação sobre o assunto num curso de Administração no Brasil. Já no início dos anos 2000, o tema foi se popularizando e o foco das minhas aulas era mostrar que era lucrativo para as empresas reduzir os desperdícios de água, energia e matéria-prima. A redução dos impactos ambientais era um subproduto, uma consequência da adoção destas medidas. Fui percebendo que as empresas que incorporavam na sua cultura as preocupações com o meio ambiente tinham melhores resultados do que as que utilizavam estas medidas apenas como um procedimento gerencial. Estou contando tudo isto para dizer que há muito tempo venho percebendo que se não mudar as pessoas, se não mudar os “influencers”, as organizações não mudam e o Planeta continuará indo de mal a pior.
Fico feliz em saber que estão se multiplicando redes globais como a “Inner Development Goals”, que focam na mudança interior das pessoas para conseguir mudar o mundo. Esta rede dos Objetivos de Desenvolvimento Interior está conectada com a Agenda 2030 e os 17 ODS da ONU, reúne mais de 4.000 cientistas e defende o autoconhecimento, consciência da complexidade, construção de sentido e outras questões que especialistas como Cláudio Senna Venzke e Vivan Laube já vêm fazendo nos seus trabalhos de consultoria para empresas e grupos de pessoas interessadas nestas transformações. Os especialistas dizem que nós sabemos onde estão os problemas, nós temos as soluções, mas nós não as implementamos.
Lembrei também das palestras da professora Lucia Helena Galvão quando ela diz que o homem coloca uma cerca e diz que aquele pedaço de terra lhe pertence. Imagine o que diria a Terra: “Eu estou aqui há bilhões de anos e este aí vai ficar poucas décadas aqui e se sente dono de mim?” Em outro momento ela comenta que o homem criou coisas sofisticadas que transformaram a vida de bilhões de pessoas, mas não conseguiu que estes bilhões de pessoas se tornassem pessoas sofisticadas. E na mesma linha dos Objetivos do Desenvolvimento Interior, a filósofa cita a fábula do príncipe que descobre forças que desconhecia e luta contra um dragão para libertar a princesa. Ela destaca que quando o homem se compromete com causas nobres, os seus poderes latentes afloram e propõe que nós transformemos sentimentos como inveja, cobiça, preguiça e intriga numa barata, que quando pousa na nossa cabeça queremos nos livrar dela o mais rápido possível.
Embora este tema de mudar as pessoas para mudar o mundo pareça batido, ele continua sendo o grande desafio, por isto concordo com o que diz o advogado ambientalista Gus Speth: “Eu pensava que o nosso principal desafio eram as mudanças climáticas…, mas agora percebo que o principal desafio é vencer o egoísmo, ganância e apatia”. Estes sentimentos fazem mal para a nossa saúde e para o Planeta. Então, quando eles pousarem nas nossas mentes, vamos nos livrar como se fossem a barata que pousou no nosso cabelo. Vamos começar por nós mesmos. Todas as grandes transformações começaram com pequenos passos.
Referência:
– Inner Development Goals – Youtube
– O desenvolvimento da vida interior com a filósofa Lúcia Helena Galvão – Youtube