Houve um tempo em que os grandes jornais tinham credibilidade. Hoje, alguns ainda checam as informações antes de divulgá-las, mas as redes sociais, onde não há responsabilização sobre a veracidade das postagens, possuem mais poder de propagação que a mídia tradicional.
No podcast “O Espiral da Verdade: a crise do PIX e o poder da desinformação”, Michel Alcoforado discute como, diante de fatos controversos, muitas pessoas não se satisfazem com as informações veiculadas pelo governo e pela imprensa e buscam outras fontes, frequentemente em redes sociais e nos grupos de WhatsApp. A diversidade de versões sobre um mesmo tema gera dúvidas e questionamentos sobre em quem acreditar.
Segundo Michel, a percepção da realidade é influenciada pela identificação do público com quem transmite a informação. As pessoas valorizam aqueles que expressam suas ideias não verbalizadas ou que articulam suas preocupações de maneira convincente.
Ele cita como exemplo a polêmica da suposta taxação do PIX, proposta pelo governo no final de 2024, que previa o monitoramento de transações superiores a R$ 5 mil para pessoas físicas e R$ 15 mil para empresas, com o objetivo de reportar à Receita Federal. Apesar de não haver previsão de tributação, a oposição inventou que se tratava de uma artimanha do governo para taxar o PIX e disseminou essa ideia nas redes sociais. A imprensa desmentiu essa interpretação, mas um vídeo do deputado Nikolas Ferreira, que questionava o monitoramento dos gastos da população e não dos políticos, disse o que a população queria ouvir e obteve 8 milhões de visualizações.
Michel considera que a direita e a oposição como um todo conseguiram captar as preocupações da população, explorando a desconfiança dos objetivos da medida. Em contrapartida, o governo falhou na comunicação, focando apenas em negar a taxação sem esclarecer o objetivo do monitoramento, resultando em dúvidas e falta de adesão popular.
No ambiente digital, onde a quantidade de informação compartilhada é alta, a credibilidade está atrelada à compreensão do público sobre a intencionalidade da mensagem. Michel entende que a direita tem sido muito eficaz na comunicação, enquanto o governo enfrentou dificuldades para explicar suas intenções de forma clara e convincente.
A conclusão é que a forma como a informação é comunicada é mais importante que o fato em si. A estratégia de disseminação da dúvida voltou a ser utilizada: “Se não tens como negar, semeie a dúvida”. Esse tema é discutido no livro “Mercadores da Dúvida” de Naomi Oreskes e Erik M. Conway, no qual eles demonstram como a incerteza pode ser explorada para influenciar a opinião pública.
Por fim, num ambiente onde a disseminação de informações ocorre de forma rápida e sem filtros, a confiança do público está cada vez mais vinculada à identificação com a mensagem e seus emissores. Assim, mais do que apresentar dados concretos, é fundamental que os comunicadores consigam estabelecer um diálogo transparente e próximo com a sociedade, respondendo às suas dúvidas e preocupações antes que narrativas paralelas ganhem força.
Referências:
- Michel Alcoforado - Podcast: O espiral da verdade: a crise do PIX e o poder da desinformação.
- Livro: Merchants of Doubt - Naome Oreskes e Erik M. Conway. Bloomsbury Publishing. Estados Unidos, 2011
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Foto da Capa: Gerada por IA