Passada uma semana do evento climático mais recente ocorrido em Porto Alegre, que deixou por vários dias a população sem água, energia elétrica e internet, será que tiramos lições desses episódios que estão ocorrendo com frequência em nossa cidade e estado? Que aprendizados tiramos nós enquanto sociedade e o gestor público? São questionamentos a serem respondidos.
A devastação foi imensa, casas destelhadas, famílias desalojadas, árvores arrancadas pela força do vento que derrubou postes de luz e propagandas. Muitas famílias afetadas independente da classe social. Todos foram atingidos. E a maior preocupação da maioria naquele momento era encontrar uma tomada para carregar o celular e a busca de sinal de internet. Várias discussões sobre esses temas ocorrem nos spins (grupos) de sustentabilidade e resíduos do coletivo POA Inquieta.
Paro para pensar na nossa omissão quando não separamos adequadamente nossos resíduos, quando descartamos a céu aberto ou em qualquer lugar; quando não nos preocupamos com a poda de árvores e reposição delas, quando esquecemos do cuidado com das nascentes, dos arroios (só observarmos o Dilúvio, ao longo da Ipiranga!), e outros riachos e rios. Somos sim responsáveis pelas mudanças climáticas que nos atingem constantemente. Precisamos com urgência nos reeducar, perceber a necessidade de mudança de comportamento no nosso dia a dia. Pararmos com o consumo desenfreado, o uso de veículos sem necessidade e buscarmos alternativas de transporte. Definitivamente, o planeta é único.
A economia capitalista baseada no acúmulo de riquezas e extração de recursos naturais de forma predatória, moldou e transformou a relação homem-natureza, rompendo com a harmonia que outrora existia nesta relação. O modo de produção baseado no consumo generalizado de produtos industrializados e demandante de matérias-primas, marca a trajetória de mudanças econômicas, sociais e ambientais estabelecidas pelo sistema produtivo. Associado a isso, a ideia de crescimento econômico, ganhou força e estabeleceu as bases para o desenvolvimento econômico (Edilene de Jesus Santos, Economista. Doutora em Economia-UFBA,2017).
Chega de deixamos as ações descontroladas do capitalismo com o único objetivo do lucro a qualquer preço. Precisamos pensar sobre a nossa sobrevivência e das gerações futuras. A natureza dia a dia está nos cobrando esta “promissória”.
A inclusão do ambiente “natural” nas condições gerais da produção capitalista cria visões radicalmente opostas no campo teórico e na prática das políticas públicas. Uma delas é quanto as crises e o papel da regulação estatal. Com relação as crises periódicas, estas surgem dos conflitos entre as necessidades da acumulação do capital e as condições gerais da produção. Então intervém a regulação estatal. (Montibeller-Filho, 2000).
A preocupação com a questão ecológica e ambiental foi colocada em destaque na conferência de Estocolmo em 1972, que elucidou a importância do meio ambiente e a necessidade de uma pesquisa permanente e global das possibilidades do futuro humano. De lá até hoje inúmeros eventos globais são realizados com a presença de Chefes de Estado, lideranças mundiais ativistas e muito pouco se vê de mudanças.
E cabe aqui também tecermos comentários e cobranças sobre as ações do gestor público, tanto na esfera municipal quanto na estadual. Os nossos governantes são alertados pelos serviços de meteorologia sempre que existe alguma previsão de temporal, chuvas fortes, etc. Ultimamente, com frequência, tanto o governador Eduardo Leite como o prefeito Sebastião Mello estão usando as mídias para alertas a população sobre os eventos, colocam que estão com as equipes de retaguarda preparadas para qualquer emergência.
No entanto, isso não “tranquiliza” a população, ficamos a pensar o porquê de não termos ações preventivas, com a limpeza de bocas de lobo, investimento na rede de esgoto e na drenagem de tantos locais da cidade. Já sabemos que a cada chuva o alagamento virá e trará transtornos. Não se observa um cuidado com as árvores na questão de podas, remoções, replantio e plantio de novas mudas. E quanto ao serviço de energia elétrica que é essencial, desde que foi privatizado, o atendimento e a atuação só pioraram. A conta aumentou e o mais bizarro é que nem as autoridades conseguiam contato com a CEEE Equatorial nos primeiros momentos dessa última crise. Milhares de pessoas sem luz e água por dias. Pessoal muito despreparado.
O Ministério Público do Trabalho investiga casos de óbitos de trabalhadores terceirizados contratados pela CEEE Equatorial, que demonstra que o lucro e a ganância estão a cima da vida e de um serviço de qualidade para os consumidores.
Está mais do que na hora de nós todos nos reformularmos e praticarmos ações sustentáveis, esquecendo um pouco do individual para pensarmos no coletivo. Deixarmos de lado as planilhas de crescimento econômico e atentarmos a preservação da vida.
*Simone Pinheiro é mestre em Ciências Sociais, assessora técnica de associações e cooperativas de catadores e articuladora do POA Inquieta.
Fotos: registros feitos pela autora nos bairros São Geraldo e Floresta, em 17/01/24, em Porto Alegre.