Já faz algum tempo que o Grêmio adota esta prática nociva. Curioso, é que quando o time andava mal das pernas, em 2021, ameaçado pelo rebaixamento, não utilizava este recurso. Mas agora, surfando uma onda de bons resultados, a gestão do presidente Alberto Guerra incrementou o que já havia feito o antecessor, Romildo Bolzan Júnior: colocar torcedores para acompanhar as entrevistas coletivas do treinador e eventualmente de algum dirigente, depois dos jogos. Na semana passada, o clima foi de hostilidade entre os jornalistas e esta claque de apoio.
Com este procedimento, a sala de conferências da Arena é transformada numa espécie de Coliseu. Repórteres e entrevistados muitas vezes mantém conversas ásperas. Nem sempre os entrevistados estão preparados para responder sobre temas mais delicados e algumas entrevistas tornam-se mais tensas. E a claque se posiciona com vaias, aplausos, xingamentos e ameaças aos jornalistas.
Na última quinta-feira, o ambiente ficou tenso e perigoso quando um dirigente foi questionado se havia falta de transparência da direção gremista para tratar sobre a lesão de Luis Suárez. Este dirigente preferiu distorcer a pergunta, tratou como se o jornalista tivesse afirmado que faltou transparência, e protagonizou um rápido stand up comedy de desrespeito. A claque, como se esperava, se encarregou de amaciar o ego do tal dirigente, aplaudindo sua manifestação e afrontando a imprensa ali posicionada. Eram cerca de 40 torcedores, entre conselheiros e associados, e alguns mais desequilibrados ameaçaram os jornalistas.
Imediatamente após o episódio, o repórter da Rádio Gaúcha, José Alberto Andrade, fez uma manifestação incomum: “Terminou a coletiva da pior forma possível. Agora torcedores desacatam jornalistas. Ou o Grêmio toma providências ou não venho mais”, desabafou Zé Alberto.
No dia seguinte, o Sindicato dos Jornalistas emitiu nota condenando a presença de torcedores naquele ambiente. “Este tipo de procedimento também pode se caracterizar como cerceamento ao trabalho da imprensa”, escreveu o SindJoRS. A Associação dos Cronistas Gaúchos (ACEG) também se posicionou repudiando a postura do dirigente, o vice de futebol Paulo Caleffi, que segundo a entidade, tentou “diminuir e desconstituir” o repórter Matheus D’Avila.
Não imagino que este seja o objetivo do Grêmio, mas esta prática tem como consequência uma forma de constranger o desempenho da prática jornalística naquele ambiente – a sala de conferências. O presidente do Grêmio, Alberto Guerra, é, no mínimo, conivente com esta situação que, repito, é de risco. Se a ideia é causar algum tipo de censura nos veículos de comunicação do Estado não funcionou. E o Grêmio precisa saber que é responsável por colocar lado a lado jornalistas no exercício de sua profissão e torcedores apaixonados. Não responder as perguntas ou respondê-las de forma mais dura faz parte desta relação. Funciona assim há 100 anos. Mas colocar uma claque com objetivo de intimidar os jornalistas é uma decisão inconsequente.
Foto da Capa: Entrevista de Caleffi exigiu nota da ACEG / Divulgação