Durante a pandemia foi muito discutido que com tudo o que estava acontecendo, seja pela dor ou pela solidariedade que aflorou, quando terminasse a pandemia não voltaríamos ao normal, mas sim a “um novo normal”. A expectativa era de que a sociedade brasileira pós-pandêmica seria diferente da anterior à pandemia. Não foi isso que se constatou!
O Rio Grande do Sul vive agora a maior tragédia da sua história e a catástrofe da região metropolitana de Porto Alegre é apontada como a maior da América do Sul. Novamente está sendo impressionante a mobilização e a solidariedade entre os gaúchos e da população de todos os estados brasileiros que estão fazendo campanhas e enviando caminhões com doações e toda forma de auxílio. Chegam também doações do exterior. Nas unidades de atendimento encontra-se voluntários de vários estados e até do exterior. É comovente ver a solidariedade que o povo gaúcho está recebendo.
Todos fomos atingidos, mas posso dizer que eu e minha família somos dos “privilegiados” que apenas ficamos sem luz e água por alguns dias e que não tivemos nossas residências inundadas. A Escola de Administração/UFRGS, onde trabalho, foi inundada. Muitos dos meus alunos e dos meus amigos perderam o que tinham dentro das suas casas e outros perderam a própria casa. Alguns estão preocupados porque a água levou a empresa em que trabalhavam.
Não tenho dúvidas de que seremos capazes de manter esta mobilização por algum tempo e reconstruir as casas, as cidades e o RS. Meu convite para reflexão com este texto é sobre a oportunidade de transformação das nossas vidas. O sentimento de solidariedade que nos mobiliza é muito forte e muito bonito, mas ele é canalizado para o outro. Poderemos passar por tudo isto e continuarmos sendo os mesmos, voltando ao “nosso normal”.
Porém, se aproveitarmos este momento para refletirmos como toda esta tragédia questiona os nossos valores, o nosso modo de vida, de nos relacionarmos com as demais pessoas etc., pode sim iniciar aí uma transformação interior que nos levará a vermos a vida e vivermos de outra forma. Será uma oportunidade de autoconhecimento e de reconexões.
Em alguns casos, a água levou mais do que móveis, fogão e geladeira, levou também fotos e lembranças que não poderão ser recuperadas na reconstrução das casas. Talvez a reflexão possa começar por aí: “O que a água não levou? O que as tragédias não conseguem tirar de nós?” Cada um terá as suas respostas e sobre elas é que podemos reconstruir nossas vidas.
Este exercício de repensar a vida não levará necessariamente a uma vida mais espiritualizada. Para alguns, talvez esta seja uma oportunidade para mudar o seu modo de consumo, de fazer uso da economia compartilhada e fazer uso dos bens sem a necessidade da posse. Estão surgindo novas formas de viver que são mais econômicas, mais sustentáveis e que integram as pessoas. A reconstrução é uma oportunidade para uma transformação dos nossos valores e do estilo de vida.
Não será fácil! Mas, lembrando a frase de Winston Churchill: “Um otimista vê uma oportunidade em cada calamidade. Um pessimista vê uma calamidade em cada oportunidade”. Eu não vejo utilidade em ser outra coisa que não otimista.
Foto da Capa: reprodução de redes sociais
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