A se repetir nas eleições de outubro o crescimento da soma das abstenções, dos votos brancos e nulos, estará constituída uma tendência política no Brasil: a indiferença do eleitor na hora do voto. E seguirão as minorias elegendo pelas maiorias…
Praticamente um terço dos eleitores não quis exercer seu direito/obrigação. A quem não vai, nem justifica, há uma multa irrisória, de R$ 3,51 reais. Isso, portanto, não é uma punição a quem não vota. Um mero alerta, que não paga mais nem metade da passagem de ônibus para ir à cabine eleitoral.
Nas eleições de 2018 no Brasil, o absenteísmo somou 28,8 por cento dos eleitores, chegando a mais de 42 milhões de brasileiros. Se Bolsonaro somou 57,9 milhões de votos em sua eleição, o absenteísmo teria mudado o resultado para Bolsonaro ou mesmo para seu adversário, Fernando Haddad, que somou 42,4 milhões de votos.
No segundo turno, Bolsonaro e Haddad chegaram a 57.797.847 votos (39,2 por cento do total) e 47.040.906 votos (31,9 por cento do total), respectivamente. Ocorre que, em nosso sistema eleitoral, os votos que não são dados nominalmente para um determinado candidato, não são computados para a definição de um vencedor das eleições e sequer contam no coeficiente eleitoral. Os dois candidatos somaram mais de 104 milhões, e os ausentes beiraram 42 milhões de pessoas.
Nas eleições presidenciais de 1989, brancos e nulos somaram 5,8 por cento do eleitorado, equivalente a 4 milhões de pessoas. As abstenções somaram 14,4 por cento do eleitorado, quase 12 milhões de pessoas. Aqui o pulo em menos de 20 anos: 48 por cento. Como se vê, é tendência definida.
Para se eleger para um cargo Executivo (presidente da República, governador de Estado ou prefeito de uma cidade), o candidato precisa obter 50% mais um dos votos válidos. Os votos nulos, brancos e abstenções acabam sendo considerados como votos inválidos. Excluídos, portanto, da contagem que determina a vitória eleitoral de um candidato. Com isso, Bolsonaro terminou com 55,1% dos votos válidos e Haddad 44,8%.
As eleições para os cargos proporcionais (vereadores, deputados federais e estaduais – senadores não são cargos executivos, mas sua eleição é majoritária, por representarem os Estados e não os eleitores), os números seguem a mesma tendência. Nas votações para os Executivos, porém, são mais evidentes e impactantes:
Alguns exemplos:
- Votos brancos, nulos e abstenções não podem anular uma eleição. Como exemplo, uma cidade com 100 mil eleitores, se 60 mil decidem anular ou votar em branco, ou seja, 60 por cento dos eleitores, o resultado das eleições se dará apenas pelo voto dos 40 mil eleitores que votaram efetivamente. Então, 40 por cento dos eleitores decidem os governantes pela totalidade dos eleitores. Ou seja, abster, votar branco ou nula não é manifestação política. É fastio ou desinteresse.
- Como no exemplo anterior, se dentre os 40 mil eleitores, um determinado candidato obtiver apenas 20,1 mil votos, ele estará eleito, pois terá obtido mais da metade dos votos válidos (50,02 por cento). Importante notar que se considerado todos os munícipes aptos para votar (100 mil) o candidato eleito prefeito terá conquistado o voto de apenas 20 por cento da população, uma minoria que decide pela maioria omissa.
- Uma consequência óbvia é que quanto maior for o absenteísmo em uma determinada eleição, menor será a quantidade de votos necessários para um determinado candidato ser eleito.
- Independente da disposição dos cidadãos em participar da política ou de votar, aquele que deixa de votar está também contribuindo para a eleição de alguém. Se não de forma direta, pelo menos de forma indireta.
- E como o eleito passa a ser o governante do todo, a maioria que preferir o absenteísmo será governada pelo eleito de uma minoria, a que se mobiliza para votar.
Assim estão dispostas as regras das disputas eleitorais. Claro que o voto em branco, nulo ou a abstenção são opções disponíveis para o eleitor no dia do voto. O absenteísmo não é uma forma protesto ou contestação.
Em uma eleição, a melhor maneira de demonstrar sua indignação ou vontade de mudança é a participação ativa. Afinal, em política há uma máxima que diz: não existe espaço vazio que não seja ocupado por alguém ou por um grupo. Sua abstenção, portanto, será sempre ocupada por outro que tenha preferido não se abster.
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