Um garoto de treze anos é preso, acusado de matar uma menina da escola. Ponto.
Não é spoiler, essa é a primeira cena da série de quatro episódios. Ao final de quase cinco horas, desligo a televisão com a sensação de ter levado um soco no estômago. Não consegui parar, só queria saber o desfecho.
Desde o primeiro momento, a série já prende nossa atenção. A cena fortíssima do início, aliada ao desempenho dos atores, já é um indicador de que vem coisa boa.
Para complementar, todos os episódios são inteiramente filmados em plano-sequência, cada um deles mostrando um determinado momento da trama. A ausência de cortes nos leva a mergulhar nos sentimentos dos personagens. É quase como estar ali.
Os dois primeiros episódios são muito bons, contudo, os dois últimos são de tirar o fôlego.
A conversa entre uma psicóloga e o menor, no terceiro capítulo, merece ser vista e revista muitas vezes. O desempenho do “adolescente” é impressionante, e é justo ali que se constrói sua verdadeira personalidade.
O último retrata o drama vivido pela família. Enquanto os pais e a irmã tentam levar uma vida minimamente normal dentro de casa, ainda têm que lidar com as consequências sociais do ocorrido. Simplesmente desgarrador.
O objetivo principal da trama não é manter um tom de suspense ao redor do crime, e sim trazer uma abordagem extremamente contemporânea sobre como a vida é vista pelos adolescentes sob o viés das redes sociais. Além disso, aborda outros temas bastante complexos, como a masculinidade tóxica e a violência juvenil como consequência da pressão social.
Outro tema trazido à tona é a cultura incel. Eu, particularmente, não sabia do que se tratava e imediatamente fui buscar referências. O termo se popularizou pela primeira vez na década de 1990 por meio de um site pessoal chamado Projeto Celibato Involuntário de Alana, criado por uma mulher conhecida apenas pelo primeiro nome. Conforme o termo se espalhou, começou a assumir significados diferentes, especialmente entre grupos masculinos com tendências à misoginia. A questão vem como uma “pincelada”, mas é um ponto que chama bastante atenção. Fiquei surpresa ao saber que comportamentos assim estão vivos. Na internet, o discurso ganha contornos bastante violentos.
De todas as frases que fiz questão de anotar, uma não sai da minha cabeça: “Eu só queria ser um pai melhor, e será que fui?”
Pais e mães entenderão.
A série nos deixa, então, com um incômodo difícil de nomear. Não se trata apenas do choque pelo crime em si, mas da complexidade dos fatores que levaram até ele. Somos forçados a refletir sobre como a sociedade molda nossos adolescentes, como a solidão e a frustração podem se transformar em raiva, e como a falta de diálogo – dentro e fora de casa – pode ter consequências irreversíveis.
No final, não há respostas fáceis. O sentimento de culpa paira sobre todos os personagens, e a pergunta que fica ecoando não é só a do pai, mas a de qualquer um que já tenha se perguntado até onde poderia ter feito algo diferente. A série não julga nem oferece soluções, mas nos obriga a encarar questões que muitas vezes preferimos ignorar. E talvez essa seja sua maior força.
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Foto da Capa: Divulgação