A necessidade de mudar a sociedade e a nossa relação com o Planeta já parece o status quo atual. Bom dia, vamos ter atitudes positivas. Boa tarde, minha empresa é sustentável. Boa noite, os governos não fazem nada. As catástrofes naturais, mesmo que ampliadas pela nossa ação, e os desastres humanos deixam uma sensação de urgência pulsante. Se não fizermos nada agora, será tarde. O que não faltam são opiniões e sugestões do que fazer e de como nos prepararmos para o novo momento, que há de vir, estamos quase lá.
Sou um admirador de frases e, em um trabalho que faço, me deparei com um provérbio chinês que usei no âmbito de mudanças de atitudes que considero necessárias: “Se você quer manter limpa a sua cidade, comece varrendo diante de sua casa.” Achei um dito relevante porque o que mais vejo são opiniões de como os outros devem agir para que o mundo seja um lugar melhor. Não são poucos os exemplos, em diversas áreas, de defensores disso ou daquilo serem, logo em seguida, desmascarados por praticarem o oposto do que sugerem. Usando o inverso de uma frase pronta, que essas não acho que tenham valor, digo que o que muda o mundo são pessoas que “botam ovo e não cantam”.
Enxergo como maior desafio para enfrentar o caminho traçado para a extinção da espécie humana a própria cultura em que estamos acomodados. Estamos acostumados a exigir de todos, mas merecemos a exceção. Assim como não haverá equilíbrio econômico sem que alguém aceite ganhar menos, não teremos diminuição dos impactos da sociedade no clima se não agirmos individualmente e, sim, abrirmos mão de benefícios pessoais que consideramos necessários e que “temos direito”.
Cada ação que praticamos na nossa vida tem um reflexo direto no Planeta. E, por mais que a preguiça seja a mãe da invenção, o que precisamos agora é de esforço. Trabalho de formiguinha, como diziam os antigos, que eram educados para observar a natureza e não só compartilhá-la. Nossa mente deve sair do modo “é só hoje” ou “sou só eu”, para o modelo de “só o que faço sozinho, no meu dia a dia, é que vai fazer realmente diferença”. Sei que é bem mais fácil do que parece e que só exige renunciar a breves comodidades.
Não são compartilhamentos, ideias, exigências, propostas, reuniões, conglomerados, comunidades que iluminam o caminho da mudança, mas atitudes. A ideia de que apagar a luz quando se sai do banheiro é mais importante que assinar um tratado; que colocar o papel de bala no bolso causa mais impacto que seguir uma instituição sustentável. E a bituca de cigarro, quem joga no chão perde o direito de reclamar da sustentabilidade no planeta. E veja, a responsabilidade não é de quem não disponibiliza lixeira. “Somos responsáveis por aquilo que cativamos”, noutra frase famosa que quem usa um cinzeiro de bolso entende o verdadeiro significado.
Por mais redundante que seja, pois estamos acostumados a nos defender em uma sociedade opressora, sempre reforço que cada um tem seus limites e necessidades para agir, e meu pensamento é que cada um faça o que pode. Na verdade, mais do que pode, o que consegue. É esforço mesmo, diário, constante, eterno, realmente mudar a formatação do cérebro. Para o universo, somos carbonos aglomerados, um detalhe em um planeta em uma constelação em um canto, que mostra o quanto os detalhes são relevantes. Entendo que são nos pequenos gestos que vamos reverter a, até o momento, certa eliminação dos humanos do Planeta.
Assim, me sinto feliz no desconforto, em quebrar a rotina de facilidades para diminuir nosso impacto. Mais relevante uma bolacha que use menos plástico na embalagem do que uma que agrade ao meu paladar, e por aí vai. Isso de acharmos que tudo tem que ser da melhor forma para nós ainda vai acabar mal.
André Furtado é, por origem, jornalista; por prática, comunicador, de várias formas e meios. Na vida, curioso; nos Irmãos Rocha!, guitarrista. No POA Inquieta, articulador do Spin Música.
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