A capital gaúcha e várias outras cidades do estado enfrentaram, no dia 16 de janeiro de 2024, um temporal com ventos que atingiram mais de 80-100 km/h, o que afetou mais de 1 milhão de pessoas, deixando várias regiões da Grande Porto Alegre sem água ou luz, inclusive com períodos de até 01 a 07 dias consecutivos.
Hora faltava água nas hidráulicas do DMAE (Departamento Municipal de Água e Esgoto), hora faltava água nas caixas d’água das casas e edifícios. Várias casas e comércios perderam muitos alimentos mantidos refrigerados. Árvores bloqueando ruas. Verdadeiro caos que atingiu coletivamente os porto-alegrenses.
Há um jogo de empurra sobre a responsabilidade do atraso na religação da energia entre a CEEE Equatorial, há poucos anos privatizada e que demitiu boa parte dos seus antigos funcionários, e a Prefeitura Municipal, que pediu doação de motosserras a seus cidadãos e que terceirizou, nas últimas duas gestões, o manejo da arborização urbana dos logradouros públicos.
Embora ambas entidades tenham sido criticadas por suas gestões no enfrentamento deste temporal – que digam as dezenas de manifestações nas ruas de cidadãos furiosos ocorridas – o principal fator responsável por este caos que se instalou na cidade foi nossa atitude, como sociedade humana, de fabricar em série Eventos Climáticos Extremos (ECEX).
O problema maior não é a CEEE Equatorial nem a Prefeitura de Porto Alegre, o problema maior é o nosso clima em crise.
Se não houvessem ventos tão fortes como aqueles 89 km/h medidos em nosso aeroporto e até mais em cidades vizinhas, a maioria das árvores que tombaram não teriam sido derrubadas total ou parcialmente. Esse entendimento técnico é essencial.
Por melhor que sejam tratadas e adubadas, a partir de ventos de 75 km/h não são todas arvores que resistem a essa classe de velocidade do vento, mesmo as sadias, quem dirá as mal podadas!
Evento parecido a este só ocorreu em 29 de janeiro de 2016, época em que eu trabalhava na Redenção (Parque Farroupilha) e quando também centenas de árvores tombaram total ou parcialmente nas ruas, parques e praças do município. Passaram-se praticamente 8 anos entre um evento e outro. A derrubada das árvores em Porto Alegre, em tal quantidade, durante um temporal era um fenômeno praticamente sem registo. Tudo isto é a ponta do iceberg de um problema maior: a crise do clima.
O que há em comum nesses anos é que em ambos, 2016 e 2024, assim como em 1941, quando aconteceu a grande cheia do Guaíba, ocorreram também sobre o efeito do fenômeno climático El Niño! Esse fenômeno, no Sul, traz chuvas mais frequentes e intensas do que em anos sem a sua presença
Inclusive no ano de 2016 houve um super El Niño em função de sua severidade.
Portanto num ambiente de aquecimento global, fica um alerta às prefeituras das cidades arborizadas do Sul do país e às respectivas concessionárias de energia elétrica para a necessidade de haver um reforço numérico de funcionários qualificados e equipamentos nas suas equipes de manutenção, pois, muito provavelmente, nos próximos verões com El Niño, a chance de ocorrer outros eventos climáticos extremos (ECEX) é elevada.
Desta forma, com antecedência e planejamento, a nossa sociedade poderá se tornar “resiliente” ao conseguirmos atenuar o caos que se instala temporariamente nas cidades sem água e sem luz após a passagens desses temporais.
Isso pode nos dar tempo para alterarmos o modelo causador do aquecimento global antropogênico, aquele causado pelas ações humanas.
Acima, Ipê Roxo sadio que não resistiu a força do vento e quebrou justamente na base da ramificação de seu ramo secundário, um dos locais típicos que indicam a ação de ventos fortes. Parque Farroupilha (Redenção), 23/01/2024.
Árvore caída no Parque Farroupilha com mesma característica de quebra de tronco logo abaixo dos ramos secundários, característico de fortes ventos, 23/01/24.
Em algumas árvores a resistência que a sua volumosa e densa (compacta) copa produz à passagem de ventos fortes (acima de 75 km/h) causa o tombamento de toda a sua estrutura e a exposição de suas raízes. Pinheiro Europeu. Parque Farroupilha, 23/01/24.
Celso Copstein Waldemar é engenheiro agrônomo e botânico. Servidor aposentado da Prefeitura Municipal de Porto Alegre e ex-gerente do Parque Farroupilha (Redenção). Foi vice-presidente da AGAPAN e é membro do conselho deliberativo da ASTEC (Associação dos Técnicos de Nível Superior do Município de Porto Alegre). Participa do POA INQUIETA – spin Sustentável, Crise do Clima_Plante e Orgânicos. E-mail: celsocww@gmail.com
Fotos: Acervo do autor
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