Noto em consultório uma ânsia por saber como é uma vida não monogâmica e muito interesse em entender o que é um amor diferente do romântico padronizado pela sociedade. Alguns pacientes afirmam que é moda e que daqui a pouco vai passar, outros repensam suas relações ou confundem monogamia com heterossexualidade. Diante disso, procuro explicar que o conceito de monogamia se aplica a qualquer relação com um só parceiro e não monogamia é justamente o contrário, cabe se relacionar com mais de um parceiro.
Vivemos numa sociedade que cultua o amor romântico heteronormativo, ou seja, dentro triângulo homem-mulher-filhos. A Igreja tem um papel fundamental nesta construção, pois mantém a tríade familiar como sagrada e coloca o homem como centro da família. Essa dinâmica favorece sentimentos como o ciúme e atitudes relacionadas à posse, pois foi entendido ao longo dos anos que essa era a única possibilidade. Através dos movimentos sociais vieram questionamentos desses conceitos que possibilitaram pensar e viver fora do padrão imposto.
Falar sobre ter um ou mais parceiros abertamente pode ser novidade, porém o comportamento é bem antigo principalmente para os homens que, em sua maioria, praticam ou praticaram às escondidas em nome de uma constituição familiar respeitada e autorizada pela sociedade.
Discutir formas não monogâmicas de se relacionar mostra que as pessoas estão se olhando com maior clareza e tentando encontrar o seu “eu” na forma de amar. Peço que não confundam monogamia ou não monogamia com falta de caráter, os termos são diversos, mas o conceito de responsabilidade afetiva é único e de extrema importância na hora de trocar carinhos. Responsabilizar-se pelas expectativas que criamos e comunicar os nossos sentimentos e ações é primordial.
Viver uma relação amorosa exige combinações e essas são bem específicas de cada parceria. Qualquer interação social exige respeito e acordo entre as partes e é isso que eu tento passar aos que questionam como praticar a não monogamia, afinal é uma relação como as outras, não depende de forma de corpo mas, sim, atravessamentos e sensações de ambas partes.
O amor livre, conceito amplo que mostra que todo o tipo de interação é válida, requer autoconhecimento, desprendimento de regras sociais, autoestima e principalmente abertura de diálogo para que sejam revistas as combinações que não saíram como imaginado ou para que se mantenha o que está dando certo.
Pois é minha gente, não é simples!
Viver novas experiências exige coragem, curiosidade e vontade de aprender, pois dependem da desconstrução de conceitos rígidos e muito bem estruturados. Vale ressaltar que nada é regra, mas sim possibilidades de viver em harmonia com pensamentos e vontades.
Nem todo mundo está preparado e maduro psicologicamente para experimentar novas formas de viver o amor e está tudo bem. A principal orientação é o diálogo mútuo e a comunicação dos sentimentos para que se mantenham atitudes que fomentem o respeito em todas as relações.
Jennifer Cereja é mãe, ativista, psicóloga e palestrante. Trabalha em consultório, apaixonada pela clínica e os atravessamentos que a prática proporciona. As escrevivências, como diz Conceição Evaristo, tem o olhar afrocentrado sempre considerando o indivíduo como protagonista de sua história.