“A Sociologia é a arte de salvar rapidamente o Brasil!” Esta frase de Anísio Teixeira (1900-1971) mostrava um curioso fenômeno cultural muito presente entre nós, que é o de crer que há uma profissão (ou um grupo de profissionais) capaz de oferecer à Nação o remédio definitivo para seus males. Tudo depende do diagnóstico. Um deles foi o da presença negra e a degeneração social que a “mestiçagem” provocava: a chamada Escola do Recife (Tobias, Romero, Bevilacqua, Tito Rosa…), encharcada de spencerianismo e de determinismo social, via no Direito (e nos Bacharéis) uma forma eficiente de definir pela Lei o destino da Nação, inclusive com legislação atinente ao branqueamento da raça. Os médicos da Faculdade de Medicina da Bahia (leia-se Nina Rodrigues) com a instituição da Medicina Legal viram no fenótipo racial – e suas características intrínsecas, inclusive a do “criminoso nato” lombroseano – um objeto privilegiado de estudo “científico” que devia ser controlado inclusive através de legislação penal própria para os negros. Foi com Gilberto Freyre que começamos a rever o mito eugenista. Mas…
É nos anos 30 que os educadores se tornam os novos arautos dos destinos da Nação, tendo em Anísio (depois em Paulo Freire) seus intelectuais mais proeminentes: entendida como uma doença que precisava ser “erradicada”, o analfabetismo das massas e o seu despreparo profissional exigiam o fim da educação como privilégio. A lei que regulamentou a matéria (LDB) levou longos 13 anos para ser adotada (1961), desde a apresentação do PL de Clemente Mariani (1949) até o Substitutivo de Carlos Lacerda (1961), fazendo concessões à educação privada, sobretudo católica, sob a forma de renúncia fiscal!
Quando o analfabetismo se juntou com a questão do subdesenvolvimento, sociólogos (ISEB) e economistas (Celso Furtado) começaram a dar as cartas: mas até então a “consciência” política estava na base do “projeto” nacional. No período militar, saem de cena educadores e sociólogos (exílio e expulsão das instituições de ensino e pesquisa) e ficam administradores e economistas, reunidos em torno de uma tecnoburocracia de Estado que vê a Nação como um problema de planejamento e de meios: quem entende mesmo de educação, por exemplo, são os… economistas, versados em “capital humano” (o “tecnicismo pedagógico”, do qual Mendonça Filho e A. Weintraub foram apenas rebentos tardios e despreparados)! A crença de que nosso destino era resultado de uma forma qualquer de “consciência” levava nossos intelectuais a pretenderem postos políticos (Florestan, Lacerda, FHC, Marco Maciel, Darci, Cristóvam Buarque…).
Depois vieram os gestores, os empreendedores, passamos pela autoajuda e seus “influencers” e terminamos na Inteligência Artificial: tenho absoluta certeza de que esta sim nos salvará!
De resto, a “consciência” foi substituída por (um desejo de) “competência”. Mas o que temos mesmo é Cleptocracia, uma sensação (bem real!) de corrupção generalizada e da política como refúgio contra a ação penal (homizia) e, mais recentemente, um forte cupiditate tyrannidis, um desejo de tirania. Aliás, como também não temos mais “projeto nacional”, qualquer aventureiro…
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Foto da Capa: Anísio Teixeira / Reprodução