Às 15h do dia 19/11/2024, na sede da Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho (TRT4), em Porto Alegre, foi realizada a 4ª sessão de mediação entre a Prefeitura Municipal e os catadores da Capital. O processo, iniciado em 13/03/2024, teve ainda reuniões em 09/04 e 11/07, finalizando com esta última. A mediação, solicitada pelos trabalhadores, tinha a seguinte pauta:
– Novo contrato com as 17 Unidades Contratadas, com pagamento sobre o serviço; e
– Parceria Pública Privada (PPP), para privatização do gerenciamento dos resíduos da cidade por 35 anos.
Ao longo destes quatro encontros, surgiram novas demandas e encaminhamentos diversos. Apesar de poucos avanços, este espaço, conquistado pelos catadores, foi extremamente importante, pois eles se sentiram “protegidos” com a tutela do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Destaco que esta mediação foi intermediada pelo ministro Alberto Bastos Balazeiro, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), coordenador do Comitê Gestor Nacional do Programa Trabalho Seguro.
Para surpresa da maioria, logo após a abertura da reunião de 19/11, os representantes da Prefeitura colocaram que não existem recursos para um reajuste às associações/cooperativas contratadas este ano, devido ao evento da enchente ocorrida no estado do RS e, em destaque, em Porto Alegre. Uma alegação foi que o município teve gastos extras e está com os “cofres vazios” e que as demais demandas trazidas foram atendidas. Sendo assim, a Prefeitura entende que encerra a sua participação. Apesar dos apelos feitos pelos representantes do Ministério Público, Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública do Estado, Tribunal de Contas e dos Catadores, a Prefeitura se manteve irredutível. Ficou acertado que as negociações seguem em um novo formato, com um Grupo de Trabalho formado pelos representantes dos catadores, Ministério Público, Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública do Estado e representantes da Prefeitura que discutiram sobre a PPP e o contrato.
Diante do posicionamento da Prefeitura, ficou a sensação de frustração, não somente para os catadores, mas também para os representantes dos diversos órgãos do judiciário ali presentes. Lembro que o ministro Alberto Bastos Balazeiro, na abertura da primeira mediação, ainda mencionou que Porto Alegre poderia ser protagonista numa nova relação de trabalho entre catadores e a Gestão Pública, através de um contrato inovador. Não aconteceu! Isto porque a Prefeitura optou por não seguir com a mediação e transferir para um espaço próprio as negociações.
Agora, a secretária Municipal de Parcerias, Ana Maria Pellini, abrirá a Consulta Pública para discussão da PPP do Gerenciamento dos Resíduos de Porto Alegre por 35 anos. É o momento de garantir a participação massiva da sociedade civil organizada neste espaço de posicionamentos, tanto os prós quanto os contra. Já, de antemão, sabemos que os que concordam com esta PPP estarão com forte representação.
A secretária, durante as mediações, deixou em aberto uma possibilidade de opção para os catadores em relação ao contrato: assinar com a concessionária que vier a vencer o edital ou manter o contrato com a Prefeitura.
Nas negociações, também ficou claro que a intenção é repassar e transferir para a concessionária a responsabilidade financeira dos serviços prestados pelos catadores das Unidades de Triagem, justificando a falta de recursos para reajustes e investimentos de infraestrutura e manutenção dos galpões. A grande armadilha está aí, na possibilidade de as associações e cooperativas poderem escolher entre um contrato com a Prefeitura, dentro dos moldes atuais (já que o município não apresenta uma proposta digna, pois alega falta de recursos), ou assinar com a concessionária (onde os catadores perderão seus espaços de gerenciamento e autonomia sob alegação de incapacidade), com valores “maiores” e investimentos em infraestrutura.
Este é o cenário que Porto Alegre vive hoje, com a tendência de desmanche do Gerenciamento dos Resíduos da Cidade, hoje realizado pelo DMLU (Departamento Municipal de Limpeza Urbana), que se tornará um escritório de fiscalização do contrato da concessionária. É sucateamento de uma categoria de trabalho que é um elo importante no Processo da Reciclagem (a mais fragilizada), que nunca teve investimento e, por isso, é rotulada de INCAPAZ de gerir um negócio social. Uma categoria que, mesmo assim, mostra sua força e CAPACIDADE após passar por uma gestão que durante dois anos não pagou o contrato.
A luta continua e é desgastante! Um assunto tão importante que deveria ser Política Pública permanente, como é o Auxílio Reciclagem, uma complementação salarial para Segurança Alimentar dos catadores e seus familiares que os representantes da Prefeitura deixaram claro que cessa em dezembro.
Enquanto isso, vemos na imprensa notícias sobre um possível caso de corrupção no DMLU de Porto Alegre. Talvez seja hora de começarmos a juntar as peças do quebra-cabeça e entenderemos o porquê de não haver recursos para investimentos e no pagamento de um contrato digno às associações e cooperativas de catadores contratadas. São investimentos no DMLU que, a cada dia que passa, está mais sucateado estruturalmente e no corpo de seus servidores, além da precariedade em investimentos em Educação Ambiental.
Mais uma vez, fica aqui o apelo ao Prefeito Sebastião Melo, reeleito com alto índice de votos pela população, que tenha mais atenção com quem presta um serviço fundamental à cidade.
Por isso, prefeito, assim como fiz na carta aberta escrita neste espaço do POA Inquieta aqui na SLER, volto a apelar ao homem do chapéu de palha e chinelão que escute e dê atenção às associações e cooperativas de catadores. Já são quase 35 anos de prestação de serviço de suma importância para Porto Alegre. Chame uma reunião com o intuito de resolver este problema que se arrasta há tanto tempo. Valorize, invista e não privatize!
Simone Pinheiro é assistente social, mestre em Ciências Sociais e articuladora do POA Inquieta.
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Foto da Capa: TRF 4