Nesta semana eu testei o aplicativo da Lensa. É um editor de fotografia, mas a empresa responsável, a Prisma Lab, decidiu adicionar um comando de inteligência artificial na programação para gerar avatares criativos, disruptivos e personalizados para cada usuário. O resultado é artisticamente irresistível para a vaidade humana – e digital. Quando fiz o download no celular, o aplicativo solicitou imagens de selfies minhas e autorização para acessar dados de consumo no meu telefone. Com as informações, o robô Lensa decidiu aplicar estilos como anime, cosmic, fantasy, Kawaii, pop, iridescent e fairy princess. O resultado foram imagens sedutoras e divertidas.
Antes de seguir, uma janela de professoral – sim, tenho este terrível defeito que também é uma qualidade: ser professora. Não resisto a explicar as diferenças de termos antes de seguir. Se preferir, pule o parágrafo. Vamos lá: nem tudo que é automatizado é inteligência artificial, mas depende da programação de comandos algorítmicos. Em outras palavras, os algoritmos são comandos que permitem a automação controlada pelo usuário ou pelo programador e que também são os comandos iniciais para a aprendizagem de máquina, ou seja, a inteligência artificial, a IA. Com quantos robôs você conversou hoje? Por mais que a automação da prestação de serviços seja irritante em muitas situações, é inegável que o desenvolvimento de aplicações digitais cria soluções eficientes para problemas crônicos da sociedade. É o caso de aplicativos de entregas, de transporte, de troca de mensagens e tantos outros que viraram indispensáveis em nossa rotina. A questão é que para um algoritmo funcionar de forma autônoma, ele precisa aprender a partir de informações que nós humanos fornecemos. O humano é o professor da inteligência artificial. E este é o ponto onde eu queria chegar para voltar a falar sobre os meus sedutores avatares da Lensa.
Os avatares sobre fotografias selfie produzem um efeito de arte automático irresistível para a vaidade dos instagrammers como eu. Mesmo sendo uma crítica do desrespeito à privacidade dos dados, defensora da regulação e limitação de manipulação de dados por plataformas digitais e tudo mais, eu avatarizei porque não resisti à trend que é resultado do efeito viral de downloads do aplicativo Lensa. A dona do app, a Prisma Labs é uma startup criada em 2016 na Califórnia. O aplicativo, que pode ser baixado tanto em iOS como em Android, é um editor de fotos que pode ser usado “manualmente” pelo comando humano ou com acionamento dos recursos de inteligência artificial.
Como a inteligência artificial produz avatares que estimulam o imaginário humano, místico, ficcional, a aplicação do efeito virou mania. A viralização, aposto contigo, será um negócio de milhões para a Prisma. Eu mesma paguei pelos meus avatares, ou seja, estou alimentando o monstro com meus dados e meu dinheiro. E, pelo resultado, entendo que o algoritmo de inteligência artificial Lensa ainda tem muito a aprender. Na medida em que mais imagens de usuários vão sendo armazenadas nos bancos de dados da Prisma, melhor o aplicativo torna-se capaz de identificação facial. Paralelo à competência de ler traços de fisionomia, o robô também vai armazenando junto dados pessoais e de comportamento de consumo. Tudo isso está explícito nas letras pequenas dos termos e condições de uso, aquela caixinha que marcamos sem ler na pressa de usar a bacanice.
O efeito manada cobra um preço hoje – que pode ser bem baixo, no meu caso foi R$ 10 -, mas poderá custar uma fortuna no futuro. O uso dos meus, teus e nossos dados em caráter “irrevogável” concede à empresa o direito de armazenar estas informações e usá-las para novos negócios com manipulação de dados, performance algorítmica e inteligência artificial lá na frente. A vaidade digital de hoje pode ficar cara para o meu eu do futuro.
O mesmo raciocínio funciona para plataformas de mídias sociais como o Instagram e o Facebook. Ou seja, estamos todos vulneráveis e suscetíveis a decisões de grandes empresas de tecnologia que detêm os direitos de uso dos nossos dados. Os benefícios são inúmeros, não há como negar que a inteligência artificial melhora a vida. Não me interpretem mal, sou crítica, mas também sou entusiasta das novas tecnologias. Quero o melhor dos dois mundos: que a inteligência artificial nos preste os melhores serviços, mas com os menores riscos em invasão de privacidade, insegurança digital e publicidade ostensiva. É pedir demais, amigo robô?
Bem, eu confesso: entrei na trend consciente do investimento de alto risco, sem possibilidade de retorno financeiro. Mas, sabe aquela máxima “quem avisa amigo é”? Você está avisado.