Diariamente a imprensa noticia vários crimes cometidos contra crianças e adolescentes, e não raro alguns desses crimes são executados através da internet. A Lei 14.811, de 12 de janeiro de 2024, veio justamente para combater tais crimes, instituir medidas de proteção à criança e ao adolescente nos estabelecimentos educacionais. Ela também prevê a Política Nacional de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente e altera alguns artigos do Código Penal da Lei dos Crimes Hediondos e do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Vale lembrar que, em regra, considera-se criança a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Uma das inovações que considero muito importante é previsão de que a Política Nacional de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente não se limite às vítimas e considere também o contexto social amplo das famílias e das comunidades.
Em razão dessa Lei, a pena de homicídio contra menor de 14 (quatorze ) anos será aumentada em 2/3 se o crime for praticado em instituição de educação básica pública ou privada. E no caso de alguém induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça, a pena será aplicada em dobro se o autor for líder, coordenador ou administrador de grupo, de comunidade ou de rede virtual, ou por estes for responsável.
Essa lei também trouxe uma grande mudança ao alterar o Código Penal para definir de forma detalhada o que é “Intimidação sistemática”, o famoso bullying, e o que é “Intimidação sistemática virtual” (cyberbulling).
“Intimidação sistemática (bullying)
Intimidar sistematicamente, individualmente ou em grupo, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, de humilhação ou de discriminação ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais. A pena para esse crime será a de multa, se a conduta não constituir crime mais grave.
Intimidação sistemática virtual (cyberbullying)
Se a conduta for realizada por meio da rede de computadores, de rede social, de aplicativos, de jogos on-line ou por qualquer outro meio ou ambiente digital, ou transmitida em tempo real, a pena será de reclusão, de 2 (dois) anos a 4 (quatro) anos, e multa, se a conduta não constituir crime mais grave.
Em razão dessa lei, também passaram a ser considerados crimes hediondos:
- o induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação realizados por meio da rede de computadores, de rede social ou transmitidos em tempo real;
- o sequestro e cárcere privado cometido contra menor de 18 (dezoito) anos;
- e o tráfico de pessoas cometido contra criança ou adolescente.
Outrossim, essa lei trouxe importante modificação para o Estatuto da Criança e ao Adolescente.
Passou a incorrer nas mesmas penas do crime de produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente, quem:
I – agencia, facilita, recruta, coage ou de qualquer modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas acima referidas, ou ainda quem com esses contracena;
II – exibe, transmite, auxilia ou facilita a exibição ou transmissão, em tempo real, pela internet, por aplicativos, por meio de dispositivo informático ou qualquer meio ou ambiente digital, de cena de sexo explícito ou pornográfica com a participação de criança ou adolescente.
Também, de acordo com essa nova lei, incorrerá na pena de multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência, quem exibir ou transmitir imagem, vídeo ou corrente de vídeo de criança ou adolescente envolvido em ato infracional ou em outro ato ilícito que lhe seja atribuído, de forma a permitir sua identificação.
Essa lei ainda acresceu ao Estatuto da Criança e do Adolescentes as seguintes estipulações:
“As instituições sociais públicas ou privadas que desenvolvam atividades com crianças e adolescentes e que recebam recursos públicos deverão exigir e manter certidões de antecedentes criminais de todos os seus colaboradores, as quais deverão ser atualizadas a cada 6 (seis) meses.
….
Os estabelecimentos educacionais e similares, públicos ou privados, que desenvolvem atividades com crianças e adolescentes, independentemente de recebimento de recursos públicos, deverão manter fichas cadastrais e certidões de antecedentes criminais atualizadas de todos os seus colaboradores.”
E finalmente, passou a criminalizar a conduta de deixar o pai, a mãe ou o responsável legal, de forma dolosa, de comunicar à autoridade pública o desaparecimento de criança ou adolescente. Crime esse com pena prevista de reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro anos), e multa.
Considero essa lei muito importante, inclusive pelo fato de criminalizar as condutas cometidas pela internet, que com o ordenamento jurídico defasado pelo tempo e com as tecnologias hoje existentes, dificilmente seriam punidas.
Espero que a Política Nacional de Prevenção Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente seja executada o mais rápido possível, para que o combate aos crimes contra as crianças e os adolescentes decole no Brasil.
Foto da Capa: Marcelo Camargo | Agência Brasil
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