1 – Não sei quando começamos a chamar as coisas de brasileiras.
2 – O café sempre tinha sido só o café; o sal, o sal; a paçoca, a paçoca.
3 – Aqui é o lugar onde se começa, e onde vivo, diz um verso da poeta Mirta Rosenberg.
4 – Num livro de ensaios poéticos, Martin Prieto conta que a poeta foi fazer uma leitura na universidade em Rosário e que ele e um outro amigo estavam no auditório. Quando Mirta encerrou e já estava prestes a se levantar, veio o esperado pedido de bis. Ela voltou ao microfone e disse: não fodam.
5 – Meus amigos brasileiros, que não serão xingados por poetas daqui.
6 – Meus amigos que antes eram meus amigos apenas.
7 – Nossas gatas revelam este espaço fronteiriço que ora habitamos. Joni Mitchell é brasileira, de Morro Reuter; Anna Swir é argentina, de Lomas de Zamorra.
8 – Temos amigos brasileiros que vivem aqui e logo calha de serem como nós, doble chapa, ou até mais portenhos, antes de qualquer outro pertencimento. O Alexandre, que foi meu aluno nos tempos do pré, já introjetou os extremismos e as convicções dos argentinos da gema. Uma de suas certezas mais hilárias era que todas as pessoas que usavam camperas (esses casacos de nylon acolchoado que estão em toda parte) eram irremediáveis cuzonas. Uns 70% da população de Buenos Aires no inverno.
9 – E de contrabando celebro, sendo o tema a amizade, a Glória, nossa jovem amiga que começa agora sua recuperação, depois de um flagelo tremendo, filha do meu velho amigo Frank Jorge e da Dani que, além de ser a valente mãe da Glória, professora e poeta, é uma pessoa que tivemos a sorte de conhecer aqui como talvez não conseguíssemos quando todos morávamos em Porto Alegre.
11 – Um lugar não para fugir, mas para se encontrar. Acho que é uma frase de um livro, mas agora pertence a esta crônica. Penso na ranzinza Mirta, em tudo o que conheci neste país, e penso no país dos meus amigos, que é do que sinto falta.
10 – Aqui é o lugar onde se começa, e onde vivo.
11 – Trato de tentar entender essa sabedoria.
Mais textos de Pedro Gonzaga: Clique aqui.