Lula parece querer cutucar onça com vara curta. Ainda no Egito, após conferência na COP27, ele voltou a criticar o teto de gastos e fez referência à reação negativa do mercado, após seu discurso inicial a respeito. Ele também atribuiu às oscilações de índices financeiros a especuladores. E citou: “Vai cair a Bolsa, vai aumentar o dólar? Paciência”, ironizou.
E segue: “Quando você coloca uma coisa chamada teto de gastos tudo que acontece é você tirar dinheiro da saúde, tirar dinheiro da educação, tirar dinheiro da ciência e tecnologia, tirar dinheiro da cultura. Você tenta desmontar tudo aquilo que faz parte do social. E você não mexe em um centavo do sistema financeiro. Você não mexe um centavo daquele juro que os banqueiros têm que receber”, cutucou forte desta vez.
Lula morde, mas sua assessoria, incluindo dirigentes partidários e o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, assopra. O governo eleito planeja ceder para tentar aprovar a PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição. E no jogo de força com setores do Congresso, diz que não abre mão de que o aumento da exclusão do teto tenha validade por quatro anos, todo o seu futuro mandato. Capitaneados por Ciro Nogueira, atual chefe da Casa Civil de Bolsonaro e senador do PP em exercício de mandato, diz que seu lado pretende conceder apenas o primeiro ano, já que a proposta era comum tanto ao futuro quanto ao atual Presidente da República.
Porém, a orientação do futuro governo é não negociar um prazo menor do que os quatro anos. A intenção é aprovar com boa margem no Senado para que chegue, depois, com força à votação da Câmara. Alguns aliados de Lula dizem que, se fosse para aprovar uma medida por apenas um ano, não seria necessário o desgaste para aprovar uma PEC, que exige 308 votos na Câmara e 49 votos no Senado.
Uma ala do Centrão e pequenos partidos que ainda negociam adesão ao governo eleito, têm ampliado a articulação para que o Congresso aprove a medida apenas para o primeiro ano do novo governo. A avaliação é que o Legislativo perderá poder de barganha se autorizar o aumento de despesas por todo o mandato do petista.
Para tentar costurar um acordo no Senado, ponto inicial da tramitação da PEC, os petistas já contam com o apoio do presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Casa, Davi Alcolumbre, (presidente do Senado entre 2019 e 2020 com o apoio de Bolsonaro, mas com mandato renovado neste ano com o apoio do PT do Amapá). Simpatias e conveniências geram diálogos e avanços. Alcolumbre já articula pessoalmente com os 27 integrantes da Comissão para assegurar a aprovação da PEC.
Na semana passada, assumiu a linha de frente na reunião com o vice-presidente eleito na apresentação da versão preliminar da PEC. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ainda estava no Egito, na COP27. O plano inicial era que a PEC poderia ir direto à votação em plenário, mas Alcolumbre pediu que o rito seguisse o trâmite normal. Assim, o senador ganha poder de negociação e passa a ter créditos com o governo eleito. No encontro, confirmou aos aliados de Lula que boa parte do Congresso preferiria o prazo de um ano, mas aceitou trabalhar para aprovar a proposta com quatro anos.
E o Presidente sumiu
Passadas três semanas desde sua derrota no segundo turno das eleições, o presidente vive uma rotina de reclusão, com apenas duas breves idas ao Palácio do Planalto, seu local de trabalho. Depois de 44 horas de silêncio, falou em rede de televisão para explicar que o bloqueio de estradas por caminhoneiros. Bolsonaro avaliou que as manifestações antidemocráticas promovidas por seus apoiadores são fruto de “indignação e injustiça” com as eleições e não pediu o fim dos bloqueios, o que só fez em vídeo no dia seguinte.
Com agenda enxuta, de parcos compromissos, nesses dias, vazou um vídeo em que Bolsonaro desola-se ao ver o anúncio de sua derrota pelo Jornal Nacional, da Rede Globo. Curva a cabeça apoiando a cabeça baixa segurada pelas mãos. E rejeita os afagos dos assessores de seu lado.
Na última sexta-feira, Bolsonaro deixou à reclusão para uma consulta de emergência no Hospital de Base. Na madrugada, sentira fortes dores abdominais. Foi examinado e medicado com analgésicos. Foi nesta ocasião que o candidato a vice-presidente derrotado, general Braga Neto, avistou pela primeira vez o presidente. E disse que ele voltará a despachar no Planalto. Mas não precisou a data.