Não é nenhuma novidade que estamos vivenciando uma reviravolta sobre o envelhecimento feminino. O marco dos cinquenta anos na vida de uma mulher hoje não tem nada a ver com o de alguns anos atrás. Porém, porém, porém…
Muitas análises cabem aqui, cada uma com sua dose necessária de reflexão. Vi recentemente um post da jornalista Fátima Torri, do perfil @fala.feminina, no Instagram, questionando nossa capacidade de escolha. Fátima cita uma frase do escritor uruguaio Eduardo Galeano na qual ele diz: “A gente não escolhe nada, a gente só escolhe o molho com o qual seremos devorados”. Pois bem, trazendo a citação para a realidade feminina, esse “molho” até pode trazer novos ingredientes, mas vai deixar um gosto bem amargo na boca. E somos nós mesmas que estamos envenenando este banquete. Se estávamos esperando uma folga para, enfim, podermos envelhecer sendo generosas com nós mesmas, esquece. Essa “revitalização” da imagem da mulher madura acabou nos impondo novos – velhos – padrões. É uma cobrança sutil, disfarçada, mas muito presente.
O que se espera agora é um exército de mulheres saradas, sem rugas, com barriga chapada e fôlego de sobra. Cabelos brancos? Sim e não. Se você ficar “bonita”, sim, se te “envelhecer”, não.
Depois do “mamãe tá on”, agora é o “vovó tá on”. E, é claro, há uma indústria por trás dessa geração de mulheres que chegaram ao cume da montanha e que anseiam fazer uma descida suavezinha.
E o discurso? Este também é potente e vem com palavras bonitas sobre envelhecer, sobre se conhecer, sobre reconhecer, sobre aceitar, sobre não criticar. Utopia. Sinto muito decepcionar, mas quem tá vivendo em “real time” esse momento sabe bem que não é assim. Concordo com a Fátima quando afirma que somos tão vítimas como culpadas.
Vítimas porque nos deixamos iludir, culpadas porque valorizamos o belo a todo custo, mesmo que ele seja acessível para poucas. Lutar contra as marcas do tempo requer mais do que força de vontade. Seguir o padrão das mulheres famosas e lindas que se tornaram “influencers 50+” demanda dinheiro de sobra. Olha nós sendo engolidas de novo.
Voltamos ao de antes. Mulheres lindas, ricas e famosas dizendo como nós, simples mortais, devemos envelhecer.
É um ciclo interminável e nunca somos livres para escolher nosso caminho.
É impossível descontextualizar todo esse movimento do poder e influência das redes sociais na sustentação desta que chega como uma nova hierarquia estética. É mais do mesmo: o controle dos corpos e padrões de beleza por meio de normas socioculturais. Nós, que queríamos ser disruptivas, caímos dentro da panela.
A comparação entre mulheres sempre esteve no centro da construção da identidade feminina. Seguimos esperando a mulher de que nos fala Simone de Beauvoir: aquela que não é uma vítima incapaz, e sim capaz de forjar a própria liberdade porque “não nascemos livres, tornamo-nos.”
Referências:
Fala Feminina
Para além da mera vaidade - Revista Piauí
O feminino que nasceu com Simone de Beauvoir - El País
Todos os textos de Pat Storni estão AQUI.
Foto da Capa: Freepik / Gerada por IA