A data de 31 de outubro de 2023 é um marco histórico para os catadores das unidades de triagem de Porto Alegre. Durante os 33 anos de implementação da coleta seletiva em Porto Alegre foi a primeira vez que os catadores das unidades de triagem elaboraram e entregaram à gestão pública uma minuta de contrato, contendo no seu texto, além de valores dignos para a prestação de serviço e remuneração dos trabalhadores destes espaços, também as responsabilidades pertinentes das associações/cooperativas junto à administração pública.
Assim teremos um salto de qualidade no serviço prestado, bem como a demonstração da organização das entidades para cumprimento do contrato.
O Fórum de Catadores das Unidades de Triagem de Porto Alegre entende que com um contrato que tenha um valor condizente, que proporcione um salário digno para os trabalhadores, pode estimular a abertura de mais campos de trabalho para além do serviço de triagem, para setores administrativos e financeiros.
Outro ponto importante é que, com um acordo que atenda as demandas operacionais, as associações e cooperativas podem fazer investimentos em itens mecanizados que proporcionem um aumento produtivo, sem excluir postos de trabalho. Este feito mostra que os catadores estão organizados e demonstra sua capacidade de participar da gestão de resíduos sólidos urbanos da cidade como protagonistas e não como atores coadjuvantes como no passado, onde a gestão pública trazia suas resoluções sem poucas ou nenhuma possibilidade de negociação.
Penso que é importante ressaltar aqui que através do coletivo POA Inquieta, em destaque o Spin Resíduos, os catadores se conectam com outros agentes da sociedade envolvidos na questões que envolvem os resíduos e constroem redes que resultam em ações, como as campanhas durante a pandemia de apoio aos catadores e da última realizada no mês de setembro, que proporcionou a compra de equipamentos e reparos emergenciais em virtude das fortes chuvas que afetaram algumas Unidades de Triagem.
Além de uma exposição na mídia, de forte impacto, esta participação fortalece os catadores e os emponderam ainda mais para caminharem com suas “próprias pernas e pensamentos”.
As negociações, que se iniciaram no último 31 de outubro, talvez ainda não venham alcançar o contrato ideal, mas com certeza será mais condizente do que o que temos hoje em vigor.
Muito mais do que qualquer conquista esse feito mostra que os catadores tem voz e independência e não precisam de instituições que usam os catadores como escada para autopromoção.
Simone Pinheiro é mestre em Ciências Sociais, assessora técnica de Unidades de Triagem e membro do Coletivo POA Inquieta.
Foto da Capa: Câmara Municipal de Porto Alegre