O ano de 2025 inicia com incertezas e temores para a população de Porto Alegre, bem como para parte dos servidores públicos da Capital. Uma situação que também afeta as ONGs, OSCs e OSCIPs que têm contrato com o Município. O desmonte de alguns órgãos públicos e contratos de PPPs ou “Parcerização”, como denomina o prefeito Sebastião Melo, terão impactos imensuráveis na população .
Já eram aguardadas as ações de uma PPP sobre o DMAE (Departamento Municipal de Água e Esgoto), que assim como o DMLU (Departamento Municipal de Limpeza Urbana) vem sendo sucateado há décadas. Porém, em uma nova surpresa, o prefeito encaminhou um projeto para a extinção da FASC (Fundação de Assistência Social e Cidadania), no mesmo pacote que levou para votação na Câmara de Vereadores a proposta que poderia abrir a PPP do DMAE.
Através de uma ação judicial movida pelo SIMPA (Sindicato dos Municipários de Porto Alegre), a sessão do Legislativo de Porto Alegre foi encerrada sem a votação.
A pleno vapor segue a PPP que transfere o Gerenciamento dos Resíduos da Cidade, por 35 anos, para a iniciativa privada. A UniCatadores (União dos Catadores), com o apoio de mais de 30 entidades, conseguiu liminar na Justiça solicitando a ampliação do debate sobre o Edital lançado pela Prefeitura. Existe uma equipe multidisciplinar debruçada sobre o documento para levantar e propor mudanças, buscando atenuar os efeitos maléficos da PPP sobre os catadores. Além de assegurar duas audiências públicas na modalidade presencial e não apenas uma, como foi proposta pelo município, e online.
São inúmeros os pontos a serem discutidos, porém, existe a busca incessante de uma proposta mais justa para os atores envolvidos. Forçar a prefeitura a alterar o modelo estabelecido são matérias em que o coletivo técnico está diretamente envolvido, assim como o engajamento da sociedade civil organizada e do Ministério do Meio Ambiente. Mesmo com a prorrogação do prazo para 21 de fevereiro, o tempo segue muito curto. Observa-se falta de detalhamentos, de tratativas prévias e estamos em um período difícil de mobilização, onde pessoas estão de férias e as aulas ainda não iniciaram, por exemplo, dificultando os debates. A falta de um debate amplo só irá piorar a situação do elo mais fraco e mais importante desta engrenagem, em um processo pensado e orquestrado pela gestão municipal.
Há itens especialmente estarrecedores na proposta de edital, como o fato de ser a própria concessionária que indicará quem irá realizar a fiscalização. Também não está claro como fica a situação das Associações e Cooperativas que optarem por não contratarem com a concessionária. Os valores de quem quiser manter o contrato com o município, como ficam? A coleta do rejeito, a segurança de que no fim do contrato o município irá renovar, a permanência no local onde estão estabelecidas as entidades dos trabalhadores (pois parece que a prioridade é da concessionária); são muitas questões que não estão claras no modelo apresentado. Onde está a garantia da autonomia da gestão de um negócio social feita pelos catadores e não da concessionária, através dos técnicos contratados para atuar dentro dos espaços?
É diante destas incertezas que 700 trabalhadores e suas famílias vivem em apreensão com o futuro. Nem sobre a manutenção do Auxílio Reciclagem o Fórum de Catadores das Unidades de Triagem de Porto Alegre teve resposta, quando questionou o Gabinete do Prefeito por meio de ofício. O último repasse aconteceu em dezembro de 2024, no valor de R$ 670,00. Foi mencionado em diferentes espaços de debate que não haverá reajuste dos contratos no ano de 2025, o que sugere que, pelo menos, a manutenção deste benefício deveria ocorrer, focado no objetivo de promover a segurança alimentar destes trabalhadores e suas famílias. Convém o registro de que, independente de reajustes contratuais, este benefício deveria ser uma política pública permanente da cidade.
Os catadores e catadoras estão à “espera de um milagre” para poderem exercer um direito: trabalhar de forma digna e autônoma, como foi até agora. A categoria não suplica por assistencialismo, mas valorização e reconhecimento do trabalho que realiza. Este artigo faz um recorte sobre os catadores que mantêm contrato com a Prefeitura, mas ainda temos os individuais, os autônomos e os grupos informalizados, que também dependem do resíduo para tirar o seu sustento e de suas famílias.
Estamos indo na direção inversa ao que ocorre no mundo. Está comprovado que Privatizar/Parcerizar não dá certo. Fica aqui mais um apelo ao Prefeito do Povo, Sebastião Melo: invista nos órgãos públicos, em concursos, em tecnologia. Temos certeza de que o retorno da qualidade de serviços para a população e para os trabalhadores envolvidos de forma direta, que dependem desta atividade para tirar o seu sustento, e para a população de rua desassistida será maior e mais humanizado. Reflita, prefeito, temos milhares de pessoas que ficarão ainda mais marginalizadas e excluídas com estes processos que o executivo propõe.
Simone Pinheiro é assistente social, mestre em Ciências Sociais e articuladora do POA Inquieta.
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Foto da Capa: Sessão na Câmara de Vereadores / Fernando Antunes/CMPA