Estou em uma loja. Perto de mim, há uma mulher adulta, cadeirante, também fazendo compras. Ela faz uma pergunta à atendente que responde para a pessoa que a acompanha. A pessoa com deficiência faz mais uma pergunta enquanto a atendente segue suas explicações à pessoa que está em pé ao lado da cadeira. Depois de mais algumas tentativas de obter alguma explicação, a mulher simplesmente sai da loja, seguida por sua amiga.
Como diz o meme, isso é raro, mas acontece muito. Eu sei, porque eu já presenciei essa situação inúmeras vezes. Tenho um filho autista e é comum alguém, ao saber disso, começar a falar comigo como se ele não existisse. Isso tem nome: capacitismo.
Mas você sabe o que é capacitismo?
O termo, é relativamente novo, mas vem sendo mais falado nos últimos tempos. Pode ser uma palavra ainda rara de se ouvir, mas as atitudes capacitistas são comuns. O tema, inclusive, foi tema de uma a coluna da Lelei Teixeira aqui na SLER (leia aqui).
Segundo o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (Volp) da Academia Brasileira de Letras, capacitismo é:
- Discriminação e preconceito contra pessoas com deficiência.
- Prática que consiste em conferir a pessoas com deficiência tratamento desigual (desfavorável ou exageradamente favorável), baseando-se na crença equivocada de que elas são menos aptas às tarefas da vida comum.
Assim, dito da forma mais simples possível, o capacitismo é o preconceito contra pessoas com deficiência. A própria página da Academia nos informa que se trata de um preconceito equivalente ao racismo ou machismo, nas questões relacionadas a raça e gênero. O corpo sem deficiência seria considerado o ‘normal’, ou seja, aquele condizente com a norma social, enquanto o corpo com deficiência seria o desviante, a ser corrigido.
O combate ao capacitismo é tema de campanha do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania junto com outras instituições, como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocuz).
Descrição da imagem:
Cartaz com fundo azul claro.
Em letras brancas, há o seguinte texto:
Combata o Capacitismo
Respeite o Protagonismo das Pessoas
Dirija-se à pessoa com deficiência quando quiser solicitar alguma informação. Não use diminutivos ou voz infantilizada para falar com a pessoa com deficiência.
Não reduza a pessoa a estereótipos.
Não Infantilize Pessoas com Deficiência
Comunicação: Direito de todas as Pessoas
Garanta acessibilidade comunicacional por meio de audiodescrição, legendas, libras, linguagem simples e fácil, comunicação aumentativa e alternativa (CAA). O uso de fonte ampliada, um bom contraste, pouca informação na tela e descrição das imagens, entre outros, favorecem a comunicação.
Acessibilidade Comunicacional é Direito Garantido por Lei
Abaixo do texto, um homem com camisa vermelha e branca sentado em uma cadeira de rodas observa um caderno com figuras. Ao lado, uma mulher branca com camiseta rosa e um adolescente negro com camiseta azul e boné vermelho com a aba para trás.
Na parte inferior do cartaz, os logotipos dos órgãos que realizam a campanha.
A campanha traz exemplos do cotidiano e um dos cartazes me lembrou a cena que presenciei. Situações que se repetem e que, muitas vezes, são relatadas nas palestras e cursos que dou sobre diversidade e inclusão.
…
Como já referi na Descrição da Imagem, sob o título “Respeite o Protagonismo das Pessoas”, temos algumas dicas práticas, como “Dirija-se à pessoa com deficiência quando quiser solicitar alguma informação”.
Era essa a dica que a atendente da loja deveria receber. Quem estava conversando com ela era uma pessoa com deficiência. No entanto, ela ignorou essa pessoa como se as suas perguntas não fossem válidas ou ela não pudesse compreender as respostas. Ela, de fato, não viu uma pessoa completa, mas uma cadeira de rodas. Ela enxergou somente a deficiência e viu incapacidade. Perdeu uma venda e tornou pior o dia de duas possíveis clientes.
Segue a campanha: “Não use diminutivos ou voz infantilizada para falar com a pessoa com deficiência”. Muito mais comum do que se pensa. Lembro de um relato de um desembargador cego que, ao chegar com a esposa em um restaurante, ouviu do garçom algo como: “Que sorte! Vai escolher um papá bem gostoso hoje.”
Na dúvida lembre-se: crianças com deficiência são crianças, adultos com deficiência são adultos, trate-os como tal. Como diz o cartaz “Não Infantilize Pessoas com Deficiência.”
Outra dica importante da campanha: “Não reduza a pessoa a estereótipos“.
As pessoas são diferentes, inclusive as pessoas com deficiências. Não é porque você conhece uma pessoa surda que sabe como agem todas as pessoas surdas. Não os cegos não são todos iguais nem os autistas. Existem pessoas com deficiência tristes e alegres, cada uma é única, assim como você. Aliás, lembrar sempre que cada pessoa é diferente e única é uma dica e tanto. Não está no cartaz, mas é bom lembrar.
Foto da Capa: Freepik