Em razão dos acontecimentos recentes em Brasília, em que a praça e as sedes dos três poderes foram invadidas, depredadas, saqueadas, vandalizadas, o Brasil está vivendo nos últimos dias em um Estado de Exceção, o que significa que temporariamente os poderes do Executivo foram reforçados em detrimento dos poderes Legislativo e Judiciário, ainda que apenas no âmbito da segurança pública do Distrito Federal.
Desde já, vale esclarecer que são três os institutos constitucionais que caracterizam o Estado de Exceção no Brasil: o estado de defesa, o estado de sítio e a intervenção federal.
No caso acima referido, a opção constitucional adotada pelo Presidente da República (Presidente) foi a intervenção federal, pois cada um desses institutos possui características e requisitos legais próprios.
Desse modo, no dia 08 de janeiro, foi decretada pelo Presidente uma intervenção federal limitada à área de segurança pública do governo do Distrito Federal (GDF), com prazo de vigência até o dia 31 de janeiro de 2023.
Conforme o Decreto nº 11.377, de 8 de janeiro de 2023, o objetivo da intervenção é pôr termo ao grave comprometimento da ordem pública no Distrito Federal, marcado por atos de violência e invasão de prédios públicos.
O Decreto atribuiu ao interventor nomeado as ações necessárias para a segurança pública, e deixou claro que ele está subordinado ao Presidente, e não está sujeito às normas distritais que conflitarem com as medidas necessárias para a execução da intervenção.
Para cumprir suas atribuições o interventor poderá “requisitar, se necessário, os recursos financeiros, tecnológicos, estruturais e humanos do Distrito Federal afetos ao objeto e necessários à consecução do objetivo da intervenção”, bem como requisitar a quaisquer órgãos, civis e militares, da administração pública federal, os meios necessários para consecução do objetivo da intervenção.
Segundo o Decreto, as demais atribuições que não tiverem relação direta ou indireta com a segurança pública permanecerão sob a titularidade do Governador do Distrito Federal (GDF), que saliente-se foi afastado do cargo de governador por 90 (noventa) dias, pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, que em síntese entendeu que os atos “terroristas” ocorreram com a conivência do GDF, pois os atos “preparativos para a arruaça eram conhecidos” e que a conduta do governador afastado foi “dolosamente omissiva”.
Outrossim, em razão do Decreto, o interventor passou a exercer o controle operacional de todos os órgãos distritais de segurança pública, e poderá requisitar durante o período da intervenção, “os bens, serviços e servidores afetos às áreas da Secretaria de Estado de Segurança do Distrito Federal, da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Distrito Federal e do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal, para emprego nas ações de segurança pública determinadas pelo Interventor”.
Intervenção Federal, Estado de Defesa e Estado de Sítio Federal
A Intervenção Federal ocorrerá em situações excepcionais, em que haja anormalidades nas unidades da federação. Em razão da intervenção federal haverá a suspensão temporária da autonomia dos estados ou municípios. Ela visará corrigir essas situações, como é o caso da falta de segurança pública no Distrito Federal, que permitiu a invasão da praça dos três poderes e das respectivas sedes, e a perpetuação de um número grande de crimes, de diversas espécies.
A intervenção federal é um ato privativo do presidente, e uma vez decretada caberá ao congresso nacional aprová-la ou suspendê-la. Uma intervenção federal não precisa ser previamente autorizada pelo congresso, o que seria necessário se fosse o caso de estado de sítio, como abaixo se verá.
De acordo com a Constituição Federal (CF), a União somente poderá intervir nos Estados ou no Distrito Federal para:
I – manter a integridade nacional;
II – repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra;
III – pôr termo a grave comprometimento da ordem pública;
IV – garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação;
V – reorganizar as finanças da unidade da Federação que:
a) suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força maior;
b) deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos prazos estabelecidos em lei;
VI – prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial;
VII – assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:
a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;
b) direitos da pessoa humana;
c) autonomia municipal;
d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.
e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.
A este passo vale salientar, também, que o Estado somente poderá intervir em seus Municípios, e a União nos Municípios localizados em Território Federal, quando:
I – deixar de ser paga, sem motivo de força maior, por dois anos consecutivos, a dívida fundada;
II – não forem prestadas contas devidas, na forma da lei;
III – não tiver sido aplicado o mínimo exigido da receita municipal na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde;
IV – o Tribunal de Justiça der provimento a representação para assegurar a observância de princípios indicados na Constituição Estadual, ou para prover a execução de lei, de ordem ou de decisão judicial.
Importante deixar claro que uma vez que cessem os motivos da intervenção, as autoridades afastadas de seus cargos a estes voltarão, salvo impedimento legal.
O decreto de intervenção deve ser submetido à apreciação do Congresso Nacional ou da Assembleia Legislativa do Estado. No caso da Intervenção Federal decretada pelo presidente Lula, foram tão horríveis os atos e crimes perpetrados que houve uma votação simbólica do texto do decreto, que foi aprovado por unanimidade pela Câmara dos Deputados. Em que pese o Decreto também tenha sido aprovado pelo Senado, em votação simbólica, oito senadores, ligados ao ex-presidente, foram contrários a medida.
O Estado de Defesa será decretado para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou por calamidades de grandes proporções natureza.
De acordo com a Constituição Federal, o decreto que instituir o Estado de Defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes:
I – restrições aos direitos de:
a) reunião, ainda que exercida no seio das associações;
b) sigilo de correspondência;
c) sigilo de comunicação telegráfica e telefônica;
II – ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.
O tempo de duração do estado de defesa não será superior a trinta dias, podendo ser prorrogado uma vez, por igual período, se persistirem as razões que justificaram a sua decretação.
Na vigência do Estado de Defesa:
I – a prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal, facultado ao preso requerer exame de corpo de delito à autoridade policial;
II – a comunicação será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico e mental do detido no momento de sua autuação;
III – a prisão ou detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder Judiciário;
IV – é vedada a incomunicabilidade do preso.
Saliente-se, também, que o Decreto instituidor do Estado de Defesa ou que o prorrogue, precisará ser submetido ao Congresso Nacional, que decidirá por maioria absoluta. Se for rejeitado o decreto, cessará imediatamente o Estado de Defesa.
O Estado de Sítio poderá ser decretado pelo Presidente, uma vez ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, desde haja autorização por maioria absoluta do Congresso Nacional.
As situação que ensejam o Estado de Sítio são:
I – comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;
II – declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.
No decreto do estado de sítio deverá constar a sua duração, as normas necessárias a sua execução e as garantias constitucionais que ficarão suspensas, e, depois de publicado, o Presidente da República designará o executor das medidas específicas e as áreas abrangidas.
Somente poderão ser tomadas as seguintes medidas, contra as pessoas, na vigência do Estado de Sítio:
I – obrigação de permanência em localidade determinada;
II – detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns;
III – restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei;
IV – suspensão da liberdade de reunião;
V – busca e apreensão em domicílio;
VI – intervenção nas empresas de serviços públicos;
VII – requisição de bens.
Não estão incluídas nas restrições do inciso III a difusão de pronunciamentos de parlamentares efetuados em suas Casas Legislativas, desde que liberada pela respectiva Mesa.
Espero que nenhuma das situações acima, que dão ensejo ao “Estado de Exceção” no Brasil voltem a ocorrer, e que a sociedade faça um grande esforço pelo bem do Brasil.
Essa polarização só trará prejuízo ao país, a prisão e a desgraça de pessoas, que terão suas vidas marcadas e prejudicadas para sempre, por atos impensados, impulsivos e emocionais, que se não fossem permanentemente instigados pelas mais diversas mídias e formas, inclusive pelas redes sociais, jamais aconteceriam.
Creio que a grande maioria das pessoas que participaram do que era para ser uma manifestação política, o que é salutar em uma democracia, não cometeram qualquer ato de vandalismo, agressão ou ódio. Todavia, como estavam no meio da confusão poderão vir a ser condenadas no mesmo “balaio de gato”, ou no mínimo se incomodarão bastante e gastarão muito com advogados.
Entretanto, não dá para ignorar que algumas pessoas cometeram barbaridades, uma gama enorme de crimes ao invadirem a praça e as sedes dos três poderes, o que retira o caráter democrático e legal de qualquer manifestação. Elas precisam ser punidas de forma exemplar. Isso não pode se repetir, em lugar algum do país.
Independentemente de partido, credo, ideologia, as pessoas devem pensar duas, três, dez, cem vezes, antes de partir para a violência e destruição, ainda que estejam muito descontentes ou revoltadas com os nossos agentes políticos, o que não é difícil de acontecer. Isso não dá certo. A impressão que ficou, inclusive internacionalmente, foi péssima para os manifestantes e apoiadores do ex-presidente. O “tiro saiu pela culatra”.
Gostemos ou não, as instituições precisam ser respeitadas, a ordem precisa ser mantida, violência é sempre o pior caminho a ser tomado, e normalmente quem “paga o pato” é o povo, e não aqueles que o incentivam a cometer tremendas insanidades. Paz por favor!