As questões demográficas do envelhecimento populacional brasileiro têm sido diárias, intensa e amplamente debatidas. É senso comum que a pirâmide etária já mudou de formato, a expectativa de vida aumentou significativamente, o carpe diem é o que norteia o novo comportamento, porém a população 60+ tem uma percepção muito ruim das soluções, serviços e produtos que são obrigados, por falta de opção, a consumir. O fato é que poucas empresas estão se preparando para competir pelos bilhões que passarão em suas mãos este ano.
O “aging in place” que preconiza oferecer condições estruturais, arquitetônicas, ergonômicas, de segurança, logística, sociais, médicas e econômicas para que as pessoas possam envelhecer, seguras, felizes, independentes e pelo maior tempo possível, nas suas casas, é um mercado em crescimento e milionário. São desde serviços até equipamentos desenvolvidos e pensados para suprir antigas e novas necessidades se adequando aos novos comportamentos dos 60+ focados na Fase I das questões do aumento e mudanças nas características da longevidade.
O que propomos é que avançar para a Fase II do tema Consumo 60+ para tratarmos a relação dos maduros com o mercado de consumo e seu novo modo de vida. Somente desta forma o “aging in place” terá condição plena de acontecer. Viver mais tempo dentro do seu lar, depende dos serviços e produtos que estão fora dele. O marketing já estudou os Millennials e agora coloca atenção nas gerações Y, um corte do grupo que também integra os Millennials e a geração Z, procurando sempre as melhores formas de criar interações e relações de consumo. Faz total sentido dar a mesma atenção para o consumidor 60+. O que já foi descoberto vai alterar a percepção e o foco de atenção dos empresários, diretores comerciais, marketing, produto e varejistas. Pequenos ajustes e adequações podem suprir e atender melhor este nicho conquistando suas preferências. Os 60+ representam mais de 23% do consumo de bens duráveis e serviços no país. Marcas, produtos e serviços têm muito a ganhar ampliando o olhar sobre eles.
Proponho o Aging in Market como fase II da Economia Prateada. Uma nova visão que insiste na interação, curiosidade das marcas e produtos quanto às motivações de consumo, interesses, características fisiológicas e sutilezas de design necessárias a uma experiência de compra e relacionamento mais adequada dos 60+. Quem aplicar os conceitos adequadamente ampliará share de mercado e de marca. A história de que o consumidor maduro não troca de marca ficou no baú do passado. O novo consumidor 60+ está aberto a novas experiências desde que se proponham e entreguem uma experiência singular.
Ao contrário do que possa parecer o Aging in Market não se propõe apenas a desenvolver novos produtos e novas marcas. Antes de tudo ele propõe ampliar e ajustar o olhar para este consumidor, entendendo suas necessidades, desejos, motivações, gatilhos cognitivos, desafios de design, usabilidade de embalagens, formato, peculiaridades no relacionamento (se leia atendimento) e detalhes de layout de loja e PDV. Simples assim, certo? Aí que está o desafio.
O segmento 60+ passou batido pela maioria dos currículos universitários e MBAs assim como nos estudos de mercado dos anos 1990 e primeira década dos anos 2000 que formaram e influenciaram os profissionais que atuam e movem o mercado hoje. Estamos em plena transição e o novo, o jovem ainda exerce grande atração no marketing e desenvolvimento de produtos o que deixa os 60+ fora do radar. A própria terceira idade de hoje está sendo a responsável por esta ruptura. São diferentes hoje porque na sua juventude quebraram todos os tabus e transformaram o mundo. Pense bem no que uma pessoa que tem hoje entre 65 e 78 anos viu e viveu na sua adolescência. O fenômeno Elvis Presley que mudou a música para sempre, o surgimento da pílula anticoncepcional, Woodstock, sutiãs sendo queimados, mulheres entrando no mercado de trabalho, homem pisando na Lua, do rádio a válvulas para a smart tv, do carteiro ao Whats App. Eles sim, nossos 60+ foram e ainda são revolucionários. Agradeça aos seus avôs pelo estilo de vida que você tem hoje.
Tenho utilizado um exemplo de como o Aging in Market pode ampliar os horizontes na área de tecnologia. Hoje temos mais de 27,5 milhões de 60+ com acesso à internet no Brasil. Destes, 26,3 milhões possuem smartphone. A indústria de desenvolvimento de apps que investe milhões para conquistar os usuários Millennials que por sua vez não querem pagar nada pelo serviço. Querem os apps de graça e sempre encontrarão outro aplicativo gratuito que substitua o que ousar cobrar alguma coisa. Já os 60+ entendem que se o aplicativo é bom, se atende às suas necessidades é justo pagar por isto. Esta é a memória das relações de valor que eles construíram. Desta forma faz todo o sentido focar neste usuário com soluções adequadas e obter grande rentabilidade. O Aging in Market é uma grande oportunidade para startups de tecnologia.
07 exemplos práticos de ajustes e oportunidades que o conceito pode oferecer em diversas áreas:
- Comunicação – utilizando uma linguagem e referências que considerem seus valores, desejos e que sejam percebidas como age friendly. Mais do que apenas aparecer no filme ou no anúncio eles querem ter certeza de que a marca os compreende. Observe os filmes durante os jornais da noite, horário que o público 60+ domina as grades de audiência. São raros os filmes que conversam com eles. Um desperdício de verbas. Na mídia impressa as cores e suas tonalidades não são um detalhe para este público. As mudanças na estrutura ocular mudam a percepção de tons pastéis, por exemplo, que serão interpretados como cinza.
- Desenvolvimento de APPs – com navegação mais intuitiva aos códigos dos 60+ assim como um app design ou uma web design que apresente menos ruídos visuais e distrações sem finalidade nas telas. Objetividade, linguagem clara e coloquial garantirão uma boa experiência.
- Design de Embalagem – muitas marcas ainda produzem embalagens que são um desafio tanto na abertura quanto em sua manipulação por mãos mais fracas e envelhecidas pela idade. Após os 50 anos de idade muitas mudanças acontecem nas articulações principalmente das mãos. Por exemplo, a força de pinça do polegar com o indicador, não tem mais a mesma capacidade de puxar, rasgar ou torcer um lacre ou uma tampa.
- PDV – desde corredores com obstáculos e pouca iluminação até disposição dos produtos mais comprados pelos 60+ em alturas de prateleiras que desconsideram a antropometria (altura média) das brasileiras desta faixa etária transformam a experiência de compra em um exercício de determinação e muitas vezes na perda de um cliente porque simplesmente ele não alcança o produto.
- Industria de alimentos – que possam ampliar suas linhas desenvolvendo produtos com menos sódio, menos açúcar e mais cálcio, por exemplo. O cuidado na alimentação passou a ser a prioridade número um para os 60+. Vá ao supermercado no meio da manhã ou da tarde e observe-os lendo ou tentando ler os rótulos e suas composições.
- Design de Serviços – a fila de atendimento prioritário não é mais um diferencial. Só isto não basta. Eles estão vivendo mais, vivendo melhor e muito mais ativos. Com isto novas necessidades e oportunidades surgem a cada dia. De serviços de auxílio a organização e segurança no lar, às atividades lúdicas e de lazer para manter a mente ativa e estimulada.
- Varejo e Experiência do Cliente – com equipes treinadas para interagir e se relacionar melhor com este público, conhecimento sobre as linhas de produtos mais amigáveis e principalmente preparados para oferecer uma experiência de compra ajustada ao timing e forma que os 60+ tomam suas decisões. Uma pergunta: seu manual de treinamento de vendas um capítulo dedicado a diminuição da Atenção Dividida, normal para 100% dos nossos 60+? Se não tiver creio que sua empresa esteja perdendo vendas e clientes.
Em 2021 a população 60+ teve uma renda total de R$ 1,3 trilhão no Brasil e parte disso virou consumo em produtos e serviços. O tamanho da fatia que as marcas, produtos e serviços irão conquistar desde bolo daqui para frente depende somente do que farão ao terminar de ler este texto. Mais do que um desafio, a aplicação do conceito Aging in Market é uma oportunidade para marcas, produtos e serviços.