Esta semana, o Brasil vivenciou um marco histórico. Pela primeira vez, o Dia da Consciência Negra foi oficialmente celebrado como feriado nacional, convocando o país a refletir sobre a importância da luta contra o racismo e a valorização da cultura afro-brasileira. Instituída em 10 de novembro de 2011, essa data não apenas nos reconecta com a história de Zumbi dos Palmares e com a memória das comunidades quilombolas, mas também nos desafia a olhar para o presente, onde as desigualdades sociais continuam a persistir e exigem ações concretas para a construção de uma sociedade mais justa.
O Dia da Consciência Negra nos lembra que a história da população negra no Brasil é marcada por séculos de luta contra a exclusão e a violência estrutural. Desde o período colonial, o negro foi sistematicamente desumanizado e relegado a posições de subserviência, um legado cruel que persiste nas desigualdades sociais e econômicas. Essa herança se reflete nos números alarmantes de desemprego, encarceramento e violência que afetam desproporcionalmente a população negra. Apesar disso, a presença negra na sociedade é também uma história de resiliência e contribuição inestimável. Na música, na arte, na culinária, na ciência e no esporte, homens e mulheres negros moldaram a identidade do Brasil, deixando um impacto cultural inapagável.
A literatura, por sua vez, tem sido um espaço de expressão para escritores negros, que vêm rompendo barreiras e contando suas histórias. Autores como Conceição Evaristo, Jefferson Tenório, José Falero, Itamar Vieira Junior, Carolina Maria de Jesus e Djamila Ribeiro têm ampliado a visão do que é a literatura brasileira, explorando temas como a desigualdade, o racismo, a ancestralidade e a resistência. Conceição Evaristo, por exemplo, criou o termo “escrevivência” para descrever como sua literatura nasce da experiência de ser mulher, negra e periférica. Carolina Maria de Jesus, com o Quarto de Despejo, mostrou ao mundo a realidade das favelas brasileiras, tornando-se um símbolo de luta e voz das classes oprimidas.
A contribuição dos escritores negros vai além das palavras impressas; eles ajudam a formar uma nova consciência social. Suas obras revelam narrativas ocultas, questionam estruturas de poder e inspiram as novas gerações a abraçar suas histórias. Poetas negros denunciam em sua obra, a violência vivida pelo seu povo, como podemos sentir no poema Gritaram da porto-alegrense Lilian Rocha (foto da capa).
Gritaram o teu nome
No meio da noite
A lua brilhava
E as sombras
Escondiam
O teu corpo
Caído no chão
Gritaram de novo
Berraram até
Já não ouvias
Observavas de cima
Teu corpo preto
Inanimado
Olhos vidrados
Além de poetisa, Lilian Rocha é um símbolo de resistência e representatividade. Ela atua como membro da Coordenação do Sarau Sopapo Poético – Ponto Negro da Poesia, Vice-Presidente da Academia de Letras do Brasil – Seccional RS, Vice-Presidente Social da Associação Gaúcha de Escritores (2023/2024) e foi Patrona da Feira do Livro de Canoas/RS em 2021.
A celebração do Dia da Consciência Negra nos oferece a oportunidade de valorizar histórias como a de Lilian Rocha e tantos outros, reconhecendo que a construção de um país mais justo e plural depende de enxergarmos, celebrarmos e respeitarmos as diversas vozes que compõem nossa identidade.
Todos os textos de Andréia Scheffer estão AQUI.
Foto da Capa: Lilian Rocha / Reprodução do Facebook