De onde estava, ele conseguia ouvir a conversa dos dois, ali, recostados no balcão. Um, degustando, devagarinho, a cachacinha do fim de semana. O outro, tomando, mais depressa para não deixar esquentar, um copo da cerveja posta no balde de gelo. Esse ouvinte me contou o papo, que reproduzo aqui.
— Este ano vai ser dureza, disse o da cachaça.
— Verdade, concordou o da cerveja.
— Mal começou e parece que tá acabando. Só se ouve falar em 2026…
— É… Isso é verdade. E as notícias? Cada uma pior que a outra, não? E, em todas elas, a lembrança do 3 de outubro, dia da eleição no ano que vem, quer dizer, daqui a quase dois anos…
— Ruins para o governo, que, no jogo político, tem tudo para dar as cartas e jogar de mão, mas, parece, prefere ficar na encolha. Agora mesmo, nessa história de aperto na fiscalização do PIX, o governo fez a aposta em setembro do ano passado e se fechou em copas. Em janeiro, já neste 2025, o senador Cleitinho (Republicanos/MG) blefou afirmando que o governo, na verdade (verdade dele, Cleitinho) ia mesmo é taxar os mais pobres… O governo ficou na muda…
— Pois é, atalhou o da cachaça, mas é isso que eu não entendo. Como é que o governo, com toda a sua infra de comunicação, se fecha e não vai para o ataque para explicar uma medida que mexe com tanta gente e no ponto mais sensível de cada um: o bolso…
— Incrível, né? Se a mudança nas normas da Receita Federal tinha como foco os sonegadores de impostos e as lavanderias de dinheiro, por que não deixar isso bem claro logo na hora que anunciaram a decisão?
Cansado do que considera falhas de comunicação, o presidente Lula trocou um parceiro na mesa. Mandou para casa o deputado Paulo Pimenta e chamou o marqueteiro Sidônio Palmeira, responsável pela vitoriosa campanha de 2022.
— No dia da estreia do Sidônio, o governo sofreu outro blefe… O deputado bolsonarista Nikolas Ferreira (PL/MG), manipulando bem as palavras e as informações, em vídeo nas redes sociais, reduziu a intenção do governo de apanhar sonegadores e lavadores de dinheiro, a uma medida que só pegaria os mais pobres, os MEIs, os motoristas de aplicativos, os autônomos…
Dizem que o vídeo teve mais de 200 milhões de vistas.
— Agora, veja você: a reação do governo ao vídeo do deputado bolsonarista foi um misto de erro político e falha de comunicação… E justo no dia da estreia do novo Secom… decidiu, o governo, revogar as medidas da Receita Federal e não dizer nada ao deputado que, mentir, não mentiu.
— É… pode não ter mentido, mas manipulou muito bem as informações, como no vídeo em que comemora a volta atrás oficial, quando disse que Lula tentou parar o Brasil, mas foi parado pelo vídeo dele, Nikolas.
Pretensão só possível pela inação do governo.
O da cachaça pede a saideira e arremata: nessa coisa de comunicação, quanto mais pé no chão, mais perto do jeito do povo, mais sucesso se pode conseguir. A melhor resposta ao deputado correligionário do Bolsonaro só apareceu no domingo, 19 de janeiro, e não saiu de nenhum gabinete do Planalto, nem da Esplanada dos Ministérios, veio do Congresso Nacional.
A deputada Erika Hilton, do PSOL/SP, em vídeo idêntico ao do Nikolas, tenta colocar as coisas no seu devido lugar e devolve o bolsonarista para a verdadeira posição dele, na extrema direita. O vídeo da Erika, eu vi no Estado de São Paulo, mas já está nas redes, sóbrio e bem articulado, é bom indicador do caminho a ser seguido pela nova equipe de comunicação do Palácio do Planalto. Olho no olho com o povão, comunicação simples e objetiva…
Nesse ponto da conversa, o ouvinte, minha fonte, entrou no papo:
— Olha aqui, meus guris. Para mim, 2025 pode ficar conhecido como o ano que não existiu. Vai ser assim: ou o governo toma a iniciativa e vai conversar com o povo, do jeito que estes tempos de WhatsApp, X, Instagram e não sei o que mais exigem, ou vai perder mesmo o ano respondendo aos mentirosos que continuam por aí…
A sorte, nossa, é que esses que querem fazer o tempo passar com olhos só nos próprios interesses, esquecem que tem mais um contricante nesse jogo: sua excelência, o eleitor…
O povo passa o jogo todo sofrendo com cartas ruins, a dama de paus da inflação, o sete de espadas do desemprego, o rei de copas da mentira e da desinformação.
Mas, na hora no vamos ver, no dia 3 de outubro, o coringa, que supera tudo, está nas mãos dele, o povo. Esse coringa é o voto. E é com ele, o povo eleitor que o governo precisa conversar, num papo franco e direto. É isso, ou a mentira pode vencer e voltar…Tchau pra vocês!
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Foto da Capa: Gerada por IA