Estamos em 2023*, as informações abundam e são onipresentes, mas ainda vemos pais e mães de bebês se espantando, dizendo que “nunca imaginaram que seria tão difícil”. Talvez meu pessimismo atávico tenha me ajudado, mas hoje não tenho mais dúvida de que me preparar para o pior foi a melhor coisa que eu poderia ter feito durante a gravidez ou os anos desejando um rebento. Ontem foi meu aniversário como mãe. 11 anos depois do nascimento da minha filha, Lina, finalmente me sinto habilitada a dizer: a maternidade é a viagem mais gostosa (e difícil) desta vida! Desde, claro, que você curta viajar e cuidar e esteja disposto a deixar de ser o centro do universo.
Filho não é brinquedo, não é presente, não é egotrip, não é convenção social, não é acidente. Pelo menos não deveria ser. Um bebê é fofinho, mas, se tudo der certo, ele vai chorar, mamar, golfar e fazer xixi, cocô e nada de interessante durante muito tempo antes de começar a fugir da gente no meio do shopping numa disparada incompatível com as perninhas curtas, de se atirar no chão no meio da areia suja da pracinha por não saber como lidar com os próprios sentimentos, de responder com um desaforo a cada pedido para fazer alguma coisa em casa, de dizer que te odeia porque está na hora do banho e não tem conversa, de se trancar no quarto e sair de lá resmungando quando chamado, de se revoltar contra as convenções sociais caretas e achar que vai mudar esse mundo lixo em que ele sequer queria ter nascido!
É preciso estar preparado para tudo isso para conquistar o direito ao cheiro da nuca do bebê recém saído do banho ou azedinho depois de um dia de brincadeiras, aos sorrisos desbragados diante da nossa volta para casa depois do dia de trabalho, às correrias e às danças dentro de casa, às noites dormidas em família, às leituras na hora de dormir, aos cafunés na cabeça, aos pedidos de colo que fazem com que nos sintamos gigantes poderosos, às trocas de impressões sobre o mais novo filme de super-herói (que a gente jamais veria de moto-próprio), à cumplicidade das histórias mais palpitantes da escola, aos temas escolares feitos em família, aos abraços espontâneos acompanhados de um “eu te amo” depois de um dia divertido (ou complicado).
Nem romantizar, nem demonizar. Se você está entrando ou já entrou nessa brincadeira, garanto: vale a pena. Muito. Mas estou avisando, de novo, caso você não estivesse prestando atenção até aqui: não é fácil. E a gente nunca sabe como vai ser a próxima fase desse jogo.
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Este texto foi inspirado pela lista publicada na semana passada na página da The School of Life no LinkedIn. Com a autorização da filial brasileira, traduzi o material, que reproduzo abaixo. É o tipo de conhecimento que merece ser compartilhado infinitamente. Porque os filhos que botamos no mundo merecem que sejamos os melhores pais possíveis.
Dizem que ninguém sabe o que é ser um bom pai ou mãe, muito menos ser possível elaborar uma lista a ser seguida por futuros pais. Pedimos licença para discordar:
- Basicamente, tem a ver com amor, devidamente compreendido: uma disposição de deixar toda a sua vida de lado por 15 anos, pelo menos, a fim de entrar com imaginação na experiência infinitamente delicada e desconcertante de outra pessoa. Tem a ver com uma palavra que nos é pouco familiar: sacrifício
- Suavize tudo o que você precisar dizer, modere sua raiva, atenue suas frustrações. Edite a si mesmo. Você precisa desempenhar um papel. É um ser muito pequeno e muito frágil que você terá em mãos. Ele vai notar tudo o que você faz e é. E, no começo (quando tudo realmente conta), vai se culpar por cada erro que você cometer.
- Domine seus problemas para as horas de serviço necessárias. Suas neuroses não serão mais uma indulgência encantadora. A pessoa que você colocará no planeta ficará por aqui por cerca de 90 anos, e o desempenho que você tiver nos primeiros 10 significará tudo. Ninguém está obrigando você a fazer isso. Você está se voluntariando na base implícita de que possui as habilidades necessárias. Seu público não ficará impressionado se você não o fizer e não tem por que perdoá-lo.
- Permita-se ser “chato”. Ninguém quer um pai ou uma mãe emocionante. Apenas alguém confiável e humano. Tente não enlouquecer. Permita que eles sejam o centro maluco das atenções pelo tempo que for necessário.
- Não use sua vantagem de 35 anos para intimidar. Identifique todas as tentações – e anule-as uma a uma.
- Não culpe seus filhos por terem uma vida melhor do que a sua: permita que sejam mais inteligentes, bem-sucedidos e felizes do que você jamais foi. Isso é um prêmio, não uma humilhação.
- Cuide para estar com a sua sexualidade resolvida. Não arraste seus filhos para a sua solidão nem os use como muleta. O resto nem precisa ser dito.
- Tente se dar bem com seu parceiro. E quando não for mais possível (poucos conseguem), odeie-o educadamente.
- Entenda que o mau comportamento sempre será um sintoma de que algo está faltando. Tente descobrir o que é.
- Não exija que seus filhos sempre sejam “bons”. Prefira que eles sejam reais, com todos os dramas que isso implica.
- Permita-se ser odiado às vezes. Esteja preparado para ser o vilão em nome de direcionar seus filhos para o que eles precisam, não para o que querem.
- Prepare-se para falhar substancialmente – e aceitar o fracasso com total falta de defesa. Ofereça a eles um mapa para suas prováveis neuroses desde o início. Pague pelo primeiro terapeuta.
- No fim, há de fato apenas uma regra, não quatorze: ame seus filhos adequadamente.
*Texto originalmente publicado aqui em 13/04/2023