– Ontem, no parquinho da praça, meu filho fez um amiguinho novo. Quer saber como começou a conversa? – pergunta a mãe, empolgada.
– Como? Conta!
– Ele disse: “Tralalero tralalá, bailarina cappuccina”. Imediatamente o outro menino respondeu: “Crocodilo Bombardino”. Pronto, fizeram amizade e saíram brincando.
– Que amores!
Escrevo este diálogo fictício – não obstante, possível – em meio a uma grande crise existencial. Eu, que pensava ser da geração X, sou na verdade muito boomer. E fiquei sabendo disso pelo “teste boomer”, que está associado ao movimento digital mais falado dos últimos meses.
Os nomes Ballerina Cappuccina, Tralalero Tralalá ou Bombardino Crocodillo fazem parte de uma tendência chamada “Italian brainrot”, e são descritos pelos jovens e crianças das gerações Alpha e Z como “desenhos bizarros e sem sentido”. Sem sentido, sim – mas que rapidamente se tornaram a trend do momento.
Se você não sabe do que estou falando e não conhece pelo menos uma dúzia dessas criaturas híbridas e surrealistas, vamos dar as mãos e assumir de vez que somos boomers, muito boomers.
Antes de contextualizar esse tema, vou contar como tomei conhecimento da existência da bailarina com cabeça de xícara e seus amigos escalafobéticos.
Estávamos andando de carro com meu sobrinho de três anos na cadeirinha no banco de trás e, de repente, ele começou a cantar:
“Bailarina Cappuccina, tralalero tralalá… Bombardino crocodilo… lá, lá, lá, lá, lá…”
Com aquele jeitinho fofo que só uma criança de três anos tem. Viro para minha irmã e pergunto:
– Eles estão fazendo trava-língua na escolinha?
Pois bem, foi a partir deste momento – semana passada – que conheci a turma destes personagens digitais criados pelos prompts que saem das cabeças dessa garotada que hoje domina essa tal de IA. Confesso: quando vi a Bailarina Cappuccina, só me lembrava da xícara Copeira do desenho da Bela e a Fera. Eu e esse meu jeito boomer de ser!
Considerando o aceleradíssimo tempo da era digital, o assunto já começa a ser ultrapassado, mas como pra mim é novidade, vou seguir mesmo assim.
Esse movimento das criaturas estranhas, conhecido como “Italian Brainrot”, surgiu no início deste ano no TikTok como um meme online e rapidamente se espalhou para outras plataformas. O termo “brain rot”, que significa “podridão cerebral”, foi escolhido como palavra do ano pela Universidade de Oxford em 2024, referindo-se ao consumo de conteúdos online que não exigem muito esforço para serem compreendidos.
Oi? Meu cérebro está dando tilt aqui tentando entender o sentido disso tudo. Não propriamente dos personagens, mas do alvoroço que eles vêm causando. Já tem até competição para ver quem sabe o nome do maior número de personagens. E nem são muitos. O que torna esse quiz desafiador são nomes esquisitíssimos como Trippi Troppi, Fruli Frula, Pot Hotspot, Brri Brri Bicus Dicus Bombicus, Talpa Di Ferro e por aí vai.
Outra vez, meu cérebro boomer me dá uma cutucada, lembrando que mesmo quando eu tinha os três filhos pequenos, nunca consegui aprender nem sequer o nome daqueles bonequinhos que eles adoravam… como se chamavam mesmo? Ah, Pokémon! Ou seria Digimon? Deixa pra lá. Esse é um passado muito distante.
Enfim, precisamos aceitar que, a partir de agora, estaremos cada vez mais expostos a esses novos movimentos da cultura digital. Para a geração que cresce nesta era, o mais importante não é dar um sentido à coisa – a graça está em ter algo que só eles entendem. É algo como: “Nós achamos graça, mas nossos pais não”.
É claro que existem várias camadas para serem analisadas, que vão muito além da imagem em si. Há quem fale da aleatoriedade da mensagem; outros discutem a existência de discursos ocultos.
Para mim, o que mais chama a atenção é justamente a quebra de paradigmas. Nós, os boomers, crescemos acostumados com narrativas com começo, meio e fim, e com personagens com história. Mas, para essa nova geração, a narrativa é o próprio caos – e o nonsense é a regra.
Talvez, no fim das contas, seja menos sobre entender e mais sobre aceitar. Aceitar que não dá mais para acompanhar tudo.
Enquanto isso, sigo aqui tentando cantar a musiquinha do meu sobrinho sem tropeçar no “tralalero” e pensando se um dia conseguiria criar um “escalafobeticozinho” para chamar de meu.
E segue uma ajudinha para quem ainda está perdido com toda essa conversa.
Geração Baby Boomer (nascidos entre 1946 e 1964)
• Cresceram após a Segunda Guerra Mundial.
• Valorizam estabilidade no emprego e disciplina.
• Preferem comunicação formal e hierarquias bem definidas.
• Adaptaram-se à tecnologia, mas não nasceram com ela.
Geração X (nascidos entre 1965 e 1980)
• Vivenciaram grandes mudanças tecnológicas e sociais.
• Valorizam independência e equilíbrio entre vida pessoal e trabalho.
• Testemunharam o surgimento da internet e dos computadores pessoais.
• São considerados céticos e pragmáticos.
Geração Y / Millennials Nascidos entre: 1981 e 1996
•Testemunharam a transição do analógico para o digital
• Valorizam propósito e equilíbrio entre vida pessoal e trabalho
• São adaptáveis e conectados – cresceram com a evolução da tecnologia
• Preocupam-se com sustentabilidade e responsabilidade social
Geração Z (nascidos entre 1997 e 2010)
• Nativos digitais: cresceram com smartphones, redes sociais e internet.
• Valorizam diversidade, inclusão e causas sociais.
• Preferem comunicação rápida e visual.
• São multitarefas, mas com menor tempo de atenção.
Geração Alpha (nascidos a partir de 2010)
• Primeira geração totalmente nascida no século 21.
• Crescem imersos em inteligência artificial, realidade aumentada e tecnologia onipresente.
• Alto acesso à informação desde cedo.
• Tendem a ser mais autodidatas e influenciados por conteúdos online.
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Foto da Capa: Bailarina Cappuccina / Reprodução de Redes Sociais