A pauteira do jornal começa a soletrar o nome, para que eu envie um e-mail.
-V, de vaca…
Interrompo-a imediatamente.
-Tu não tens nada mais nobre para falar sobre teu nome?
Ela fica em silêncio, mas logo reage e diz:
-Não entendi.
Prossigo:
-A menos que você seja hindu, e na Índia a vaca é um animal sagrado, fica meio esquisito. De modo geral, “vaca” não tem uma conotação muito positiva por essas bandas…
-Ainda não entendi, confessa a colega.
-Já pensou se eu soletro assim o meu e-mail para ti: G, de gatuno; O, de oportunista; N, de nazista; T, de tarado; O, de ordinário e F, de falso?
-Nossa! – exclama – nunca tinha pensado nisso! Não vou mais falar assim não…
Indago há quanto tempo ela diz “V, de vaca”.
-Há pelo menos dez anos…
Já tive uma certa fixação nessa questão de como é a forma correta de soletrar qualquer coisa, especialmente o próprio nome. A maior exigência era comigo mesmo. Por um bom tempo, as palavras variavam de acordo com o tema da conversa e o interlocutor.
Não podemos desprezar a força das palavras!
Quando eu ligava para alguma redação para falar sobre clientes de Gastronomia da minha assessoria de imprensa, a Gontof, eu dizia:
-G, de guardanapo; O, de Oliva; N, de Nectarina….
Para bares, cabiam algumas adaptações…
-G, de garrafa; O, de Orloff….
Não sei se o leitor sabe, mas sabendo ou não, eu conto agora que casei pela primeira vez somente aos 39 anos.
Em minha “longa” vida de solteiro, muitas vezes tentei aproveitar as conversas ao telefone para encontrar minha cara-metade. Era só pressentir que do outro lado da linha telefônica havia uma mulher interessante, lá ia eu com meu jeito de soletrar:
-G, de Gisela; O, de Olivia; N, de Nádia; T, de Tereza; O, de Odete; F, de Flávia…
Eu achava que isso produzia uma certa inquietação, que a interlocutora pensava:
-Nossa, esse cara só pensa em mulher! Deve estar cheio de amor para dar…
Eu até que imaginava que provavelmente ela pensasse: “Que cara mais babaca!”, mas ainda assim mantinha a “soletrice”…
Aos poucos, já maduro, domei essa mania. Somos o que somos. Devemos causar impacto nas pessoas por nossos talentos e atitudes. Pelo que dizemos e pelo que fazemos! Não tem nada a ver essa história de tentar influenciar os outros pelo jeito de soletrar!
-Se vou mesmo ser um bom cronista, isso passa por encontrar meu próprio caminho e minha autenticidade.
-O que importa são as letras que surgem do coração!
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Se puder, ligue para alguns. Um velho e bom telefonema ainda é uma boa forma de se dar uma dica cultural.
Mas atenção: nessa época de falta de tempo, dê meu nome direito para que seja mais fácil encontrarem-me no Google, Insta ou Facebook. Gontof é o nome da minha empresa. Para os textos literários, o correto é Gontow.
Gontow! Ficou claro? G, de Guimarães Rosa; O, de Otto Lara Resende; N, de Nelson Rodrigues; T, de Tolstoi; O, de Oswald de Andrade; e W, de William Shakespeare!
Todos os textos de Airton Gontow estão AQUI.
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