Se você ainda não se deu conta disso, farei o favor de dar o toque: qualquer que seja a nossa função na vida, nossa ausência individual não faz muita diferença ao grande esquema das coisas. Nada melhora e nada piora lá fora enquanto dedicamos um tempo a fazer nada. Já aqui dentro… quanta diferença.
Na adolescência e no começo da vida adulta, raros são os que não costumam alimentar fantasias de fama e prestígio. A maturidade, especialmente quando já passamos da metade do caminho, nos dá a percepção de que o planeta segue girando, o relógio continua tiquetaqueando e pessoas não param de morrer e nascer apesar da nossa ausência. E termos consciência disso não apenas traz humildade, mas, quando sabemos aproveitar, tranquilidade e alívio.
Não estou falando de autoestima. Ser irrelevante para o macro não significa que sejamos dispensáveis para o nosso entorno, a nossa família, os nossos amigos e colegas de profissão. Aliás, em qualquer aspecto, se fizermos o nosso trabalho direito, quando viermos a faltar deixaremos um substituto capacitado ou autonomia suficiente para sermos substituídos a contento.
Profissionalmente, vale para quem trabalha em equipe, vale para quem, como eu, é empresa de uma pessoa só. Em 2017, percebi que fiquei quatro anos e nove meses sem usar a função de aviso de ausência temporária da conta de e-mail. Isso porque desde que assumi a gestão de mim mesma, em 2012, o receio de ficar sem trabalho me fazia ficar sempre atenta a qualquer contato – mesmo quando eu me dispunha a passar alguns dias sem traduzir para descansar. Assim, à beira de uma cachoeira em Gramado ou passeando pelo Rio de Janeiro com a família, eu abria e respondia a e-mails de oferta de trabalho. Quando era urgente, inclusive voltava para casa para fazer a tradução no notebook que sempre levava comigo.
Isso começou a cobrar um preço. Ao final daquele período, eu me peguei me atrapalhando mais do que o normal com questões práticas, tendo insônia e esquecendo de combinações pessoais e profissionais. Naquelas férias, há cinco anos, pela primeira vez decidi que, ao contrário das outras vezes, deixaria o computador em casa e realmente não traduziria uma linha sequer. Então escrevi um aviso deixando meu celular de contato para casos urgentes e especificando o dia em que retomaria as atividades.
Enquanto escrevo esta coluna, meu e-mail está enviando uma versão atualizada daquela mesma resposta automática, que venho usando todas as vezes em que preciso me desligar. A descoberta que fiz com esse hábito é que sou prescindível, ainda que o trabalho que realizo siga sendo apreciado quando estou em atividade. Muito raramente recebo contatos urgentes nesses tempos curativos que reservo para mim mesma e a minha família. O resultado é que volto à ativa sempre renovada e mais útil e eficaz do que antes. Fazendo alguma diferença com a minha presença.
Tire férias. De verdade.