Essa é uma expressão bastante comum de se dizer, dando a ideia de que podemos – ou deveríamos – exercer certa espontaneidade no nosso dia a dia e não nos preocupar tanto com as opiniões alheias. Não sei por que essa expressão passou pela minha cabeça hoje pela manhã, mas percebi que hoje o sujeito contemporâneo parece viver um certo dilema frente a essa expressão.
Vivemos em tempos que Guy Débord já chamava lá em 1968 de sociedade do espetáculo. Imagine se ele soubesse que em 2024, a questão da vida pública versus a vida privada teria suas bordas ainda mais borradas. Aliás, em tempos de comidas, treinos e até jantares “íntimos” compartilhados, onde mesmo foi parar a palavra íntimo? Outro dia buscando uma pessoa no aeroporto eu comecei a observar pessoas recebendo parentes/amigos/amores que ao saírem da área de desembarque já estavam, enquanto se dirigiam ao abraço de quem os esperava, sendo filmados em stories. Aquilo me incomodou tanto, mesmo que eu em meu lugar de voyeur, vendo vídeos de outros usuários da rede social fazendo exatamente esse tipo de story, ache até bonito ver o abraço prestes a acontecer. Mas e o abraço mesmo, fica onde? E a troca de olhares com os corpos se aproximando na iminência do encontro do corpo do outro antes do abraço propriamente dito?
Dance like no one’s watching passou de um aval de liberdade para uma sentença de aprisionamento. Quase como contente-se que ninguém está nem aí para você. E esse é o ponto nevrálgico de nossos dias. Alguém quer mesmo se deparar com a dura realidade de que, no fundo, bem lá no fundo, ninguém realmente está olhando? Fazemos histórias imediatas de nossos passos do dia a dia para nos alimentarmos da ilusão de que não só não estamos sós, mas de que nossa vida é gostável, via likes; é validada, com nossos corpos, nossos filtros e nossas roupas.
Esse tema não é novo. A sociedade do espetáculo não vem de agora. Ninguém tolera muito tempo se ver completamente só. E nos armamos de artifícios ilusórios para dar conta dessa solidão. O verbo é na terceira pessoa do plural porque em variados graus ninguém escapa desse desamparo. Eu aqui escrevendo também não, pensando se nessa semana a minha ideia de texto será bem aceita, se serei bem compreendida.
E o pior de tudo, é que, em meio a quem olha ou deixa de olhar, alguém lembra de como é bom simplesmente dançar?
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