O amor está no ar, literalmente.
Voando, etéreo. Fugaz e gasoso.
Ninguém tem conseguido pegar muito bem esse tal de amor, quem sabe poucos afortunados. E quando pegam, costumam agarrá-lo e sufocá-lo, até que ele sucumbe. Mas qual é a dose, qual é a espessura do amor e quem terá os dedos delicados o suficiente para saber senti-lo?
Percorro sextas-feiras em pensamento ao teu lado, de mãos entrelaçadas – já falei que acho mãos dadas a mais elevada tecnologia inventada pelo ser humano?
Gosto da tua altura, tu me confidencias, mesmo sabendo que não estamos mais juntos. Perguntas por que estou de braços cruzados e respondo que estou apenas me abraçando porque te abraçar já não posso. Teus braços já não são mais meus braços. A noite nos intriga e nos entrega à clandestinidade e à teimosia do reencontro. É dia doze de junho, você me diz. E daí? retruco. Você nunca deu bola para nenhum tipo de comemoração. Eu sei, o amor tem dessas coisas atemporais. E há temporais, muitos. Amamos trovões e nos afogamos em nós, apertados. Gosto de nos imaginar caminhando no impossível dos teus olhos e das estrelas que persegues. Gosto de reviver um adeus incompleto para doer até o fim.
É isso, vou criar um decreto de amor até o fim.
Fica decretado que maturidade de amar é uma vontade e não um tempo.
Fica decretado que Cazuza continua atemporal para canções de amor.
Fica decretado que apostar no amor é sempre uma ousadia – e um grande clichê.
Fica decretado que quem não procura já é justamente aquilo que procura – achar são sempre outros quinhentos.
Um caminho escolhido é sempre o melhor de todos, para que a gente não fique olhando para o outro que nem existe ou nem era possível no momento. Mas meu chapa, tem que escolher para colher qualquer coisa, fica aqui decretado.
Fica decretado que amor próprio deveria ser pleonasmo
Que amar ao próximo deveria ser delírio
Amar ao que se elege completo por conta própria, amar quem desacomoda a vista, quem desarruma a casa e faz a gente encontrar aquele brinco perdido há séculos junto ao brinquedo do cachorro que já morreu.
Fica decretado que escrever sobre o amor é sempre tarefa impossível, quase tanto quanto vivê-lo sentindo merecê-lo.
Amor anda comercial, instagramável.
Amor anda cansado, um pouco neoplásico até.
Amor anda chato, blasé e murrinha e ainda assim é a melhor coisa desse mundo se aprender a ser bom para quem sabe que não é sobre ter, mas sentir.
As mulheres mudaram a configuração das coisas, não precisam mais serem escolhidas, já entenderam que ser plebeia livre vale muito mais a pena do que uma princesa cansada e não compreendida. Não existe realeza no amor. Amor de si é coisa que supera qualquer monarquia. Não deveria nem haver plebiscito.
Amei de todas as formas que pude: retas, tortas, sinuosas, aceleradas, marcha lenta. Fantasias, adereços; pé no chão, asfalto, chão batido, poeira e buraco que quebrou a suspensão.
Ainda não casei nem cansei
Fica decretado que amor de si não casa nem cansa.
Namora e flerta eternamente com quem bancar.
Com sorte, a banca não perde
Com sorte, a pessoa permanece sempre nova e atual mesmo que a de sempre.
Amor é sorte escolhida. Amar é até o fim.
Foto da Capa: Freepik
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