Oi, tudo bem? Provavelmente você falará, tudo e você? Talvez por inércia, talvez por costume, por comodidade. Mas não está tudo bem. Não tem como estar tudo bem. Por trás de um “tudo e você?” tem sempre uma pessoa que não dorme bem, outra com problemas familiares, outra com dívidas, outra que não encaixa nos padrões da sociedade, outra com um vazio existencial enorme, outra com medo, com ansiedade, ataques de pânico, burnout.
O pior de tudo é que além de não estar tudo bem, não temos perspectiva que fique tudo bem. Guerras, catástrofes climáticas, violência policial, desemprego, miséria. Aos poucos ter esperança já parece não fazer sentido, porque o panorama está bem complicado. Então, venho oferecer algo melhor que esperança, venho propor utopias.
Utopia parece ser uma palavra cada vez mais em desuso, diria que até meio vedada. Outra que vem sendo bastante combatida é a ideologia. Hoje foram trocadas por “proposito de vida”. Acho superimportante saber e ter um propósito de vida, mas acho que ele não é suficiente para os tempos em que vivemos, por isso, proponho utopia.
Em minhas palavras, diria que a utopia é um sonho bom demais para ser verdade, um negócio muito difícil de alcançar, quase uma loucura, um delírio. Quando penso em loucura, vem a mente um poema do Fernando Pessoa sobre o rei Dom Sebastiao
Sem a loucura que é o homem
mais do que a besta sadia
cadáver adiado que procria
Sobre o mesmo tema, Miller afirma que somos todos loucos, tomando um pouco o que seu sogro Lacan antes disse: “Como fazer para ensinar o que não se ensina? Foi por aí que Freud caminhou. Ele considerou que tudo não passa de sonho, e que todo mundo (se tal expressão pode ser dita), todo mundo é louco, ou seja, delirante.”
Talvez aceitar nossa loucura inerente seja um primeiro passo. Nossa loucura não deixa de ser uma forma de nos conhecer mais, entender os nossos desejos, sonhos, de nos aceitar completamente, deixar florescer o que talvez a sociedade não nos permita.
A vida está tão difícil que perdemos a capacidade de sonhar. Estamos em modo sobrevivência e pensar no futuro é assustador. Mas não podemos perder essa capacidade, porque no fundo é o que nos move, é nossa pulsão. É preciso sonhar, é preciso acreditar que um mundo melhor virá. Não só isso, é preciso construí-lo, hoje, agora. Ainda que estejamos cansados, exaustos, é preciso crer na utopia de um futuro melhor.
Pode ser que muitos não ousem sonhar pelo medo ao fracasso, por medo do que vão falar, por medo de não ser mais aceito, por medo de alcançar e depois chegar em um vazio existencial ainda maior. O medo serve para colocar-nos em alerta, mostrar perigo, mas não podemos deixar que nos paralise. Nossa espécie chegou até aqui vencendo medos e é preciso continuar vencendo-o.
Te desejo um 2024 cheio de sonhos e também força para poder alcançá-los. Que você se permita delirar, desejar. Que seu medo te alerte, mas não te paralise. Desejo um futuro utópico e não distópico.
PS: deixo o texto do Fernando Guedes, publicado aqui na Sler, que tem mais definições sobre utopia, para que a gente se anime de novo a sonhar alto.
*Carolina Murgi. Sou contadora, no trabalho conto números dos outros, aqui conto minhas histórias.