O que espera uma Nação de um ex-presidente que deixara o poder há dois meses e mente, descaradamente, ao País? Primeiro, ele nega – “nunca pedi e nunca recebi presente nenhum” -, depois, confrontado por uma reportagem do Estadão, admite o recebimento, muda a versão e confirma a posse das joias. Claro, elas foram enviadas em “caráter personalíssimo”. Em resumo, os árabes enviaram presentes aos dois brasileiros mandatários que somam R$ 33 milhões. E o Itamaraty, sob nova gestão, buscou questionar os árabes quanto a motivação de vultoso presente?
Os brasileiros estão com várias pulgas atrás de suas orelhas. A ditadura da Arábia Saudita presenteou Bolsonaro e a primeira-dama Michele. Por quê? O presidente quebrou três recordes sucessivos em número de visitas ao País árabe. Numa delas, Bolsonaro fechou parceria para investimentos que podem chegar a US$ 10 bilhões. Benefícios para os dois países? Há questionamentos sobre os presentes milionários, que surpreenderam o País. E devem avolumar aos seis processos de denúncias contra o ex-presidente. O príncipe Mohammed Bin Salman foi o anfitrião signatário dos acordos. Para lembrar a quem acusa o Presidente Lula de ladrão, os móveis de seus crimes, o sítio em Atibaia e o triplex no Guarujá, somariam três milhões de dólares. Menos de dez por cento dos presentes em ouro. Na ocasião, o ministro Onyx Lorenzoni prometeu organizar um conselho de cooperação entre Brasil e Arábia para a definição das áreas e a velocidades que os recursos seriam aplicados no Brasil. O fato ocorreu em 2019 e desde lá a sugestão/pedido dos árabes para o conselho não foi executada. Rendeu notícia na ocasião, bem menores e menos significativas das atuais.
Bolsonaro está sangrando. O episódio rendeu dúvidas e abalos no suposto prestígio que teria saído da eleição perdida. Ainda no autoexílio, perde espaço crescentemente em que poderia ser o líder da oposição a Lula. O medo, por vezes, imobiliza. Bolsonaro está com medo, mas não quando declara como bens públicos as joias e relógios avaliados em R$ 16,5 milhões. Isso contraria frontalmente o fixado pelo Tribunal de Contas da União desde 2016, segundo o qual só presentes que sejam de uso pessoal ou de caráter personalíssimo podem integrar o acervo privado de um presidente. As joias seriam personalíssimas? A Aduana brasileira tem instruções normativas da Receita Federal que não dão margem para que presentes de Estado sejam transportados como bagagem pessoal. Caso isso ocorra, é preciso a declaração à alfândega de que o destino é privado, com pagamento de 50% de tributos sobre o valor que exceder US$ 1.000.
Um atento e experiente jornalista gaúcho relembra um episódio de 1983, constante de relatório da Diretoria de Cadastro e Avaliação do Exército, no qual há referências ao então tenente Jair Bolsonaro. Paralelo à caserna, ele tentava a sorte no garimpo. Procurava ouro, pedras, diamantes. Não encontrou e depois foi à reserva (remunerada) por atos de insubordinação. Na sua ficha do futuro, que pesquisadores podem pesquisar hoje ou no futuro, para recontar a história do Brasil, consta a seguinte observação: O tenente aparenta “demonstrações de excessiva ambição em realizar-se financeira e economicamente”.
É! Com outros personagens e outras situações, o delírio do ouro continua a afetar nosso ex-presidente.