O gol de Vinicius Jr. na final da Liga dos Campeões garantiu ao jogador e a seu clube, o Real Madrid, o título da competição de clubes mais badalada do planeta e marcou a indiscutível tomada do trono de maior craque do futebol brasileiro pelo atacante merengue. O momento sacramentou a ascensão da geração Z e o ocaso da geração Y, também chamados de millenials.
Neymar, considerada a principal estrela do futebol brasileiro nos últimos anos, nasceu em 1992, sendo parte da geração Y, enquanto Vini Jr., nascido no ano 2000, joga no time da geração Z. Estrelas globais, revelam as diferenças geracionais dentro e fora de campo.
Dado Schneider, que trabalha as questões decorrentes da convivência entre as diferentes gerações, principalmente no meio empresarial, diz em seu livro “Desacomodado” que:
Nas minhas aulas para millennials, quando ainda eram jovens, eu os alertava para a rapidez com que seriam “envelhecidos” pela (nova) geração Z: isso aconteceria ainda mais rapidamente do que quando a geração Y “envelheceu” os baby boomers e a X.
Como ele diz:
A geração Y tem sido surpreendida a todo momento pela Z: afinal, ela foi educada/criada no séc. XX, assim como a geração X e os baby boomers.
A geração Y, de Neymar, é chamada de “pioneiros digitais”. Nascidos antes dos primeiros smartphones, foram responsáveis por desbravar as redes sociais, a comunicação instantânea e a revolução digital causada pela conectividade 24 horas por dia, 7 dias por semana. Os millenials foram para as redes sociais para mostrar suas vidas, tornando públicos seus pensamentos, opiniões e cada passo do seu cotidiano. E com muitas fotos de comida, claro.
A geração Z, de Vini Jr., já nasceu nesse mundo conectado. Como disse Luis Felipe Nascimento, em sua coluna “geração Z: geração perdida ou salvadora do mundo?”, publicada aqui na SLER: “Dizem que em vez do cordão umbilical, eles nasceram com um cabo HDMI, eles “não entram na internet, estão sempre conectados”.
Eles valorizam mais sua segurança digital e privacidade, sendo bastante seletiva ao compartilhar informações online. Não por acaso, sabemos da vida pessoal de Neymar em seus mínimos detalhes, já que ele ostenta riqueza, mulheres e amigos. Já a vida pessoal de Vini Jr. não é de domínio público, sendo ele mais lembrado por seus gols e por seu posicionamento antirracista.
Como todo grande craque, Neymar muitas vezes sofre com a violência dos adversários, o que já lhe causou numerosas lesões. O jogador ficou marcado pelas quedas exageradas, sendo acusado também de simulação. Os memes com o jogador rolando após alguma falta viraram motivo de chacota. Postura diferente da tomada por Vini Jr., como nos mostra a genial Patrícia Carneiro, em coluna falando sobre a potência da geração Z negra: “Vini Jr. ao ser xingado bate no peito. Reage. Não aceita de cabeça baixa”.
Se Neymar, como no famoso poema de Fernando Pessoa, é um fingidor que “finge tão completamente, que chega a fingir que é dor, a dor que deveras sente”, Vini Jr. expõe a dor da violência física a que é submetido em campo assim como a violência simbólica, racista, que sofre de forma contínua e em uma dimensão que nenhum outro jogador passou.
Um é chamado de menino, o “menino Ney”, sempre prestes a ser perdoado por suas travessuras, como se fosse um eterno Peter Pan vagando milionário em uma realidade paralela. Já Vini teve a juventude roubada pelo racismo como tantos outros jovens negros nas periferias. Sua coragem, ao encarar multidões de cabeça erguida, contrasta com a baixeza de seus adversários que usam a violência e o racismo para desestabilizá-lo e com a inércia, quando não a condescendência ou cumplicidade daqueles que deveriam protegê-lo.
Aqui, voltamos à coluna do Luis Felipe, ao afirmar que “A Gen Z é apaixonada pela justiça racial, direitos LGBTQQICAPF2K+, valoriza inclusão, diversidade, igualdade e defende mudanças”, explicando que “essa geração apoia causas”. É preciso dizer que Vini Jr. não apenas defende a causa antirracista, mas a personifica. Seu corpo, seus dribles são um manifesto antirracista sem que precise abrir a boca. Mas ele fala, mesmo que tantos não queiram ouvir o que ele diz.
Vinicius, por seu talento com um esporte de massas global, sendo o astro de um time de torcida planetária, atinge o que seria uma das grandes aspirações dos jovens da Gen Z: ser um “cidadão global”, em uma geração que se comunica com seus pares ao redor do mundo em um ritmo nunca visto antes, vestindo as mesmas camisas de time e sendo contado em peso entre os mais de 300 milhões de espectadores estimados da grande final.
O atacante brasileiro ainda é o grande favorito para conquistar a Bola de Ouro como melhor jogador do mundo na temporada, premiação que não é dada a um brasileiro desde 2007. Sua carreira contrasta com Neymar, tido como o melhor jogador da Seleção canarinho nas duas últimas Copas do Mundo, mas que tem se notabilizado mais por suas condutas extracampo, pontuada de escândalos midiáticos.
Enquanto Vini Jr. ascendia ao estrelato global, Neymar, na contramão da geração Z, passou a semana defendendo a Proposta de Emenda Constitucional, patrocinada pela extrema direita, que diminui a proteção ambiental no litoral e é acusada de querer privatizar as praias. Tudo coroado com um bate-boca com ofensas machistas e misóginas contra a atriz Luana Piovani. Nada mais distante da geração Z e suas preocupações com o meio ambiente e a equidade de gênero.
No momento em que Vinicius Jr. era coroado como novo craque global, ocupando o posto de ídolo do Real Madrid e de maior esperança do torcedor brasileiro, Neymar, quem diria, de “menino da Vila” virou um “tiozão do pavê”.
Foto da Capa: Montagem com reprodução das redes sociais.
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