Tempo de comemorar!
Abro a nova edição afirmando que meu coração está aos pulos. E está! Do final de 2020 – quando o livro, que tem a assinatura da Pubblicato Editora, foi para as livrarias sem o lançamento desejado por conta da pandemia que chegava sem freios – até o início de 2022, a caminhada foi contida, mas inundada de afeto e retornos estimulantes. Primeiro, a repercussão inesperada e os encontros online que colocavam o conteúdo em debate. Depois, a primeira sessão de autógrafos na 67ª Feira do Livro de Porto Alegre no dia 4 de novembro de 2021, um convite do presidente da Câmara Rio-Grandense do Livro na época, Isatir Bottin Filho. Quase três horas de caneta na mão, recebendo amigos, familiares, pessoas conhecidas e pessoas que conheci ali. Eu olhava para aquela fila imensa feliz e orgulhosa por estar naquele espaço tradicional dos livros, tão querido por todos nós, celebrando a arte e reafirmando a importância da luta contra a discriminação de qualquer natureza. Emoção que se repetiu em 21 de abril de 2022, data do meu aniversário, quando lancei o livro em São Francisco de Paula na Miragem Livraria da amiga Luciana Soares, um lugar instigante, criado para celebrar a produção literária e a memória que nos dá identidade.
Falo sobre nanismo, discriminação e inclusão a partir do que minha irmã e eu vivemos. E reafirmo a urgência de relações mais humanas, contra o preconceito de qualquer natureza.
Para marcar esta edição, que chamo de comemorativa, incluí o perfil da Mariane Rotter, autora da foto da capa, e do Amaro Abreu, autor dos desenhos das capas internas. Incluí também trechos de comentários que reafirmam a importância da escrita e da busca por acessibilidade, inclusão e respeito. Assim como não podemos tolerar o racismo, o preconceito de classe, o desprezo pelas minorias e o descaso com o meio ambiente. Nosso país é absurdamente desigual e injusto e a discriminação deve ser combatida com políticas públicas abrangentes e transparentes. Até porque o preconceito com os povos originais, quilombolas, negros, ciganos, comunidade LGBTQIa+ e com quem tem alguma diferença, como as pessoas com nanismo, ganhou requintes de crueldade e extermínio. Ao naturalizar o uso de armas, banalizou-se ainda mais a violência e a morte.
É urgente escancarar as portas para relações agregadoras e construir em parceria o mundo que queremos. É urgente entender que temos a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), instituída em 6 de julho de 2015, no governo de Dilma Roussef, para assegurar e promover a igualdade de condições, o exercício de direitos e liberdades fundamentais, visando inclusão social e cidadania de pessoas com algum tipo de deficiência. Lei que não pode ficar na gaveta!
No período agudo da pandemia, de renúncias e isolamento, escrevi muito e me abasteci de leituras. Descobri autores que apontam outras realidades excludentes, calcadas no preconceito estrutural, como Conceição Evaristo, Djamila Ribeiro, José Falero, Itamar Vieira da Cunha, Jeferson Tenório e Juliana Teixeira. Li “João aos Pedaços” (Diadorim Editora, 2021), do jornalista Flávio Ilha, biografia comovente e ousada do escritor João Gilberto Noll. Acompanhei a produção do livro “Os filmes pensam o mundo” (ediPUCRS, 2021), do psicanalista, filósofo e economista Enéas de Souza, um amigo com quem aprendo muito. Acompanhei também a produção de um livro que me comoveu, “Jaquirana, um pequeno resgate”, de Vanete Pereira Nunes (Pubblicato Editora, 2022), minha amiga desde a infância nos campos de cima da serra. Li “Furos no Futuro” (Artes & Ecos, 2022), do psicanalista Edson Luiz André de Souza e “para meu amigo BRANCO” (Agir, 2022), do jornalista e ativista Manoel Soares. Li o romance “Alice deve estar viva”, do ator Werner Schünemann (Minotauro, 2021). Ganhei o livro, vi o documentário e me comovi muito com “5 Casas”, do artista visual, diretor e fotógrafo Bruno Gularte Barreto. Em maio de 2022 fui convidada por Luiz Fernando Moraes para ser colunista da plataforma Sler – rede social para ler e escrever, o que faço com entusiasmo e alegria. Estou relendo “Quando eu andar para trás” (editora Bestiário, 2022), da minha amiga Denise Macedo. Acabei de revisar uma obra instigante que fala do ofício de guasqueiro. Estou envolvida com a produção do livro de uma amiga recente, Kris Prates. E no finalzinho deste ano mais um livro chegou para me emocionar: “Botas Batidas e, assim, me conto o que está próximo”, do Vitor André Rolim de Mesquita (Pubblicato Editora), meu editor e meu amigo. Viagens por universos próximos e instigantes que muitas vezes desconhecemos.
Como disse a mineira Conceição Evaristo, “o ato da escrita é muito solitário e quando o texto reverbera e ganha amplitude é maravilhoso”.
O fato é que jamais imaginei que a minha escrita fosse tocar tanto as pessoas. “E fomos ser gauche na vida” é um projeto antigo meu e da Marlene, minha irmã. O desejo era refletir sobre o preconceito que a diferença provoca a partir de experiências pessoais e profissionais diversificadas como as nossas, trazendo pesquisas e estudos que Marlene fazia sobre linguagem, psicanálise, literatura e a força da palavra, que muito nos amparavam. Fizemos inúmeras tentativas de começar, mas o trabalho vertiginoso, meu e dela, não dava trégua. Com a morte da Marlene, em 5 de abril de 2015, fiquei atordoada, perdida e quase desisti. Um ano depois fui convidada para escrever no Sul21. Amparada por amigos, criei o blog Isso não é comum que possibilitou reflexões sobre deficiência, discriminação, nanismo. Nos quatro anos em que escrevi, juntei fragmentos das nossas tantas conversas/anotações e senti que o livro criava asas. Entendi que lutar contra o preconceito, com os olhos voltados para a diversidade humana, era urgente. Criei coragem, escrevi e chegar à segunda edição neste final de 2022 é uma prova de resistência que me alegra muito.
Que 2023 seja mais humano e arejado!
Em Porto Alegre, meu livro está nas livrarias Bamboletras e Isasul e, em São Francisco de Paula, na Miragem Livraria e na loja Essência da Serra.