“Quando ergueres tua casa, estarei lá, invisível e eterno.
A chama em meu ser que ardia por ti nunca se apagou;
Sim, nunca se apagará. (…)
Tudo o que eu queria era sonhar ao teu lado, sempre.
Quando reconstruires tua vida, chama-me de lar. (…)”
Poema “Nuvens ao Amanhecer”*
A poesia muitas vezes transcende a lógica e as estruturas racionais. Ela fala diretamente ao coração, evocando emoções, sensações e experiências que não podem ser facilmente explicadas em palavras lógicas. É nesse espaço onde a criatividade e a intuição se encontram que a verdadeira beleza da poesia se revela. O que importa é a conexão que ela cria, não necessariamente a clareza do seu significado.
Neste poema, “lar” transcende a mera moradia física; é um abrigo emocional onde o eu lírico anseia por permanecer na vida da amada, garantindo-lhe segurança e amor. A amada pode ser tanto uma mulher quanto a sua própria alma.
O conceito de “lar” ressoa profundamente, evocando a necessidade humana de retorno ao self, de preencher o vazio interior que explica desencontros e confusões modernas. É um chamado para o autoconhecimento, para desenterrar talentos e conectar-se com planos superiores, tornando-se presente e atuante, capaz de resolver as complexidades da vida com maestria.
Ainda ontem, enquanto as sombras do crepúsculo dançavam com os meus pensamentos, eu me deixei levar pela figura lendária de Anita Garibaldi, a heroína que cruzou os mares e os destinos de dois mundos. Era como se o vento sussurrasse segredos sobre aqueles que, neste vasto palco da vida, têm a sorte rara de experimentar o despertar espiritual.
Imaginei Anita, nos dias dourados de sua juventude, curvada sobre a máquina de costura na pacata cidade de Laguna, em Santa Catarina, onde os sonhos pareciam costurados em retalhos. Ali, no século XIX, cada ponto que ela fazia era um sopro de vida, uma promessa ainda não revelada.
Então, como a primeira luz da manhã rompendo a escuridão, ela conheceu Giuseppe Garibaldi. Num instante, a costureira deu lugar à mulher guerreira, aquela que, mesmo grávida, desafiou as balas e os medos, lutando valentemente na Revolução Farroupilha, tanto no Rio Grande do Sul quanto no Uruguai e na Itália.
Como milhões de outras jovens, poderia ter envelhecido e morrido em uma máquina de costura, mas, ao despertar, sua bravura ressoou como um tambor em meio ao caos. A história, em gratidão, ergueu, no coração da Itália, um monumento com sua imagem montada a cavalo, eternizando sua força em bronze.
Imagine se Mahatma Gandhi tivesse permanecido preso à pasmaceira do cotidiano; ele nunca teria libertado a Índia do domínio britânico, nem inspirado milhões a lutar por justiça e paz. Seu despertar e coragem não apenas transformaram seu país, mas também reverberaram pelo mundo, provando que o compromisso com a força e a verdade interior de cada um tem o poder de mudar o curso da história.
Entretanto, milhões de almas vagam por aí, presas em correntes invisíveis, vivendo uma vida miserável, longe do despertar que Anita e Gandhi vivenciaram. Essas vidas, como flores apanhadas pela tempestade, guardam dentro de si grandes homens e mulheres, potencialidades que poderiam transformar o mundo.
No entanto, permanecem aprisionadas nos grilhões da mente, sufocadas por crenças limitantes e molduras miseráveis, como pássaros que, mesmo com asas, não conseguem voar e retornar para casa, para o lar interior, e se tornar o ser grandioso que estão destinadas a ser.
Que os ecos dos exemplos de Anita e Gandhi ressoem como um farol de esperança, iluminando o caminho de todos aqueles que buscam romper suas próprias correntes e descobrir o ‘lar’ interior — o lugar de poder, o jardim secreto onde a verdadeira essência de cada um aguarda como um botão de flor, ansioso por desabrochar em toda a sua plenitude. É hora de voltar para casa!
*Poema do livro Ultraverso da Alma, de João Francisco Rogowski
João Francisco Rogowski é jurista, escritor, mentor e professor. Ele acorda antes do nascer do sol, em busca de inspiração e conexão com seu propósito.
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Foto da Capa: Praça Anita Garibaldi, em Roma.