Mexendo nos livros para dar espaço nas estantes às preferências literárias da Eduarda, 14 anos e boa leitora (não passa por uma livraria sem entrar e sair com alguma nova obra), encontrei uma quase preciosidade de exatos 40 anos.
O livro Entrevero, coletânea de contos, crônicas, trechos de novelas e de romances editado em duas partes. No Livro 1, obras de autores gaúchos. O livro 2 traz textos de grandes autores ainda do Rio Grande do Sul e de outras regiões.
Hoje, você dá uma gugada e encontra vários exemplares do Entrevero a veda até por R$ 7,00… Mas quando foi lançado, em dezembro de 1983, acho que não foi muita gente que teve o prazer de curtir esse Entrevero de textos da melhor qualidade. O livro fez parte da Coleção Adão Juvenal de Souza.
Um dos pioneiros da moderna propaganda gaúcha, Juvenal propôs, e a direção da MPM Propaganda topou, que, para marcar o Ano Novo, a MPM distribuísse um livro a seus clientes. Uma campanha, ao mesmo tempo, de incentivo à leitura e divulgação dos autores nacionais.
Começou em 1973 com Solo Clarineta, Volume 1, autobiografia do Érico Verissimo, que eu também recebi. E seguiu com Mário Quintana, Drummond, Menoti Del Picchia, Gilberto Freire, Graciliano, Jorge Amado, Fernando Sabino, Guimarães Rosa…
Não sei se a coleção seguiu para além da passagem de 1983/1984 quando o presente de réveillon foi o Entrevero. Afinal, a MPM rodou muito. Comprou outras marcas, foi comprada, fechou e – vejo na Wikipedia – hoje faz parte de um dos grupos do Nizan Guanaes.
E, também, nestes tempos de hiperconexão, parece que dar livros físicos, com muitas páginas, está meio fora de moda, né? Quem sabe um link para o cliente acessar o livro que ele escolher na hora que melhor lhe convier e deixar na nuvem sem ocupar espaço da TV de 50 polegadas nem a gaveta dos tablets, dos I Pads…
Carlos Reverbel, jornalista e escritor, patrono da Feira do Livro de Porto Alegre em 1993, falecido em 1997, selecionou os textos, organizou a edição de Entrevero e, quem sabe prevendo a invasão do tecnologiquês e do internetês à nossa inculta e bela linguagem, abriu espaço no Entrevero para, nas palavras dele, fornecer ao leitor não familiarizado com a dialetologia gaúcha (bem assim como os castelhanismos nela introduzidos e os arcaísmos nela conservados) um pequeno vocabulário…
Mas olha só! Enquanto leio o texto do Reverbel, nesta tarde de domingo, 21 de julho, chega a notícia que não deveria surpreender ninguém, mas que acontecida, provoca verdadeira comoção mundial. Criticado até por aliados próximos por causa da idade, como se idade fosse atestado de incapacidade, mostrado ao mundo tropeçando nas palavras e nas próprias pernas, Joe Biden desistiu de disputar a reeleição.
Na comunicação rápida (e rasteira diriam os mais puristas e conservadores) das redes sociais, a notícia é essa: pressionado, Biden desiste da candidatura. Coincidência. Mas uma passada no vocabulário do Reverbel nos dá pistas para um texto mais humanizado da renúncia. Veja aí:
Abombado, para não se achicar diante dos cueras que criam chasques por causa da idade dele, Biden resolve sair do entrevero da eleição e acoitar-se na Casa Branca.
Opinião minha com ajuda do Reverbel:
A retirada da candidatura Biden cria um salseiro no Partido Democrata. Vai haver um entrevero de candidatos, apesar do apoio do presidente à vice Kamala Harris. Vai ser um salseiro. No fim das contas, os americanos vão eleger o maula do Truman e arriscar o pelego de todos nos Estados Unidos e no mundo. Afinal, o republicano já mostrou que é um trabuzana.
E assim aproveito a volteada, boleio a perna e vou bombear as notícias. (Será que alguém acompanhou até aqui este verdadeiro entrevero de frases?)
Foto da Capa: Divulgação
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