3,2,1… Feliz Ano Novo! A contagem regressiva para a virada começou e, em poucas horas, estaremos em 2023. Um calendário todinho em branco com doze meses para fazer acontecer uma vida melhor. Faça você ou façamos nós, é imperativo o agir. O futuro é o passo seguinte de quem se move para transformar o mundo ao seu redor, tem a mudança como resultado de ações concretas. Nesta época em que olhamos para as realizações e projetamos os nossos desejos, eu lembro de três amigos das boas palavras: Paulo Freire, Mario Sergio Cortella e Eduardo Galeano. Eles alimentam o meu pensar sobre a esperança, renovada a cada ciclo: esperançar é preciso.
Esperançar é um verbo que adotei há poucos anos, não o conhecia antes. O uso do verbo é frequentemente associado ao pedagogo Paulo Freire (1921-1997), o educador esteve no fogo cruzado das polarizações políticas por ocasião do seu centenário de nascimento em 2021. Em meio à pandemia de Covid-19, milhares de mortes, entraves no acesso à informação e o caos na gestão da saúde, esperançar nunca fez tanto sentido para mim. Freire desenvolveu uma proposta de método pedagógico de diálogo entre professor e aluno para construir conhecimento a partir da leitura social e contextual. Foi taxado de subversivo e, perseguido após o golpe militar, viveu exilado por 15 anos. Os livros de Freire são hoje pilares de referência para as metodologias ativas de ensino, na qual crianças, jovens e adultos são estimulados a engajar em dinâmicas de aprendizagem. As metodologias ativas são tidas como fundamentais para a fixação e aplicação de conceitos teóricos.
Esperançar, como ensinava o pedagogo da autonomia, é levantar-se, construir e não desistir. O verbo representa o agir na esperança da transformação da realidade individual com consciência social. É diferente da esperança em modo espera, aquela em que é sonho e desejo dormentes, atribuída aos que dependem do outro, projetam realizações na espera pelo governo, pelo vizinho, pela família, pelo professor. Desejar uma vida melhor no próximo ano e não fazer a mudança acontecer é inviabilizar a realização. O esperançoso que espera tende a ser frustrado, o esperançoso que age é aquele que realiza.
O ano passou e o famoso “emprego dos sonhos” não chegou? O problema são os métodos de recrutamento, o algoritmo do LinkedIn, as empresas que usam QI como critério, o amado e odiado “quem indica”, ou seja, a culpa é do outro. Mas será que quem está procurando um emprego melhor ou uma nova oportunidade sabe mesmo o que quer no futuro, traçou etapas para evoluir na empregabilidade, ampliou a rede de contatos, fez cursos gratuitos online para qualificação, participou de eventos. Esperar o emprego dos sonhos sem agir é contentar-se com o desemprego ou com a mediocridade. Talvez haja algo de atraente nesta condição. Se não houver, a oportunidade de fazer acontecer é hoje.
Como no trabalho, é assim no amor romântico, na saúde, nas finanças, no engajamento social. O esperar sem agir é inútil diria Mario Sergio Cortella, o filósofo pop brasileiro, que, ao escrever sobre Freire, nos ensina que “a vida é de fato muito curta para ser pequena”, em alusão à ideia de educação pela cidadania plena. De que adianta conquistar o emprego dos sonhos se o lugar onde vais viver e trabalhar não for também aprazível e se a empresa não adotar estratégias de sustentabilidade e socialmente responsáveis? Construir uma comunidade com senso coletivo e viabilidade potencializa a própria vida individual – e o contrário também é verdadeiro. É preciso agir na esperança para alcançar a inovação viável para si e para a sociedade.
Esperançar é ir atrás, persistir, não desistir, até que o inédito transborde, o conhecimento transforme, o coletivo inclua. Para Cortella não basta colocar água apenas no seu copo, é preciso dar vazão para que a água extravase e mate a sede também daqueles que estão no entorno. Talvez o caro leitor ou leitora se pergunte: com tantos problemas sociopolíticos a assolar o Brasil de hoje: fome, desemprego, polarização política, como adotar o viés otimista para o nosso futuro?
Para responder, recorro ao terceiro amigo das letras que volta no final de ano para visitar meu pensamento. Eduardo Galeano em As palavras andantes no brinda com uma fala, já tomada como uma manifestação clássica sobre a utopia, amiga fiel do esperançar. “A utopia está no horizonte. Se caminho dez passos, ela se afastará dez passos. Por mais que caminhe, jamais a alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso, para caminhar”. Por mais que os desejos elevados sejam utópicos, o esperançar traça os passos para evoluir no trajeto. E é caminhando que se faz o caminho.
Desejo que em 2023, esperançar seja o meu e o seu verbo do ano!