Como você contrata um prestador de serviço? O que te leva a contratar pessoas para a sua empresa? Como você escolhe qual será a sua parceira em determinado empreendimento? Quais os seus critérios de seleção?
Antigamente, havia um grande e detalhado livro, de miúdas letras e folhas quase transparente, chamado lista telefônica. Algumas pessoas faziam o uso deste que podemos chamar hoje de “artefato”, já que usamos o mesmo para apoiar bancos, mesas ou até os computadores.
Mas a maioria das pessoas usa a indicação, e essa foi a minha resposta em uma entrevista sobre a minha estratégia de captação para clientes.
Sim, para além de palavras, textos e escrita, os meus empreendimentos se sustentam, hoje, basicamente e especificamente, por conta das outras.
E, sim, mulheres que indicam mulheres. Pode até ser um tipo de marketing, sabia? O marketing da indicação.
É importante entender quem me indica? Vamos ao caso. Cá estou em pesquisas de prestadores de serviço para outras pessoas, portanto, não usei qualquer mecanismo de pesquisa usual, qualquer rede social, eu visualizei em outros colegas o uso de ferramentas e de serviços que eu queria contratar.
E este texto é um desabafo triste, porque muitas pessoas não me indicaram os seus colaboradores, os seus prestadores de serviço, sugerindo que eles não tinham condições de me atender.
Sim, voltamos ao regime totalitário e feudal no qual as pessoas e os serviços que elas prestam pertence exclusivamente e tão somente a pessoa que lhe é contratante.
Que vínculo é esse que você está estabelecendo com as pessoas que trabalham com você, a ponto de você não indicar, a ponto de você sugerir de que esta pessoa não dispõe de tempo para os outros?
Ora, ora cá estamos diante dos defensores de uma legislação ausente perante as relações de trabalho, perante as relações de serviço.
A vaga para trabalhar aqui é de freelancer, autônomo, prestador de serviço, colaborador, parceiro, mas o seu tempo, aqui, é só meu.
E sim, fiquei com raiva. Como é que viemos parar aqui, onde nos mantemos vinculados e donos do tempo dos outros, donos dos serviços a ponto de impedir oportunidades e conexões?
Substantivo feminino, indicação é, além de uma ação, a validação que você exerce perante o serviço ou o produto de outra pessoa. Uma ação que envolve a análise e a emissão de juízo de valor sobre algo, seja um serviço, produto, desempenho, reconhecimento da qualidade de algo, expressando a opinião ou a percepção de alguém em relação a determinado objeto ou situação.
Quem é você para dizer que a sua parceira, empreendedora, não pode me atender?
E aqui, exatamente aqui, trago Gloria Anzaldua para falar sobre os papéis sociais que todos nós desempenhamos como seres relacionais: “Há muitos papéis, ou formas de ser, de agir, e de interagir no mundo. Para mim, eles se reduzem a quatro básicos: ponte, ponte levadiça, banco de areia e ilha. Ser uma ponte significa ser uma mediadora entre você mesma e sua comunidade e pessoas brancas. (…) Você seleciona, conscientemente ou inconscientemente, a qual grupo se ligar como ponte. (…) Ser uma ponte levadiça significa ter a opção de tomar dois cursos da ação. (…) estar para cima, ou seja, retrocedidas, afastada das conexões físicas (…) estar “abaixada” pode significar uma perda parcial de si mesma. Estar disponível para as pessoas o tempo todo, mediando o tempo todo traz o risco de ser atravessada e usada (…) ser uma ilha significa que não há caminhos, não há pontes, tampouco balsas (…) banco de areia parece uma ponte mais natural, que conecta uma ilha ao continente (…) significa ter um respiro de ser uma ponte perpétua ou ter que retroceder completamente (…) é mais fluido e mudar de localização, permitindo mais mobilidade mais liberdade.(…) escolher ser uma ponte, uma ponte levadiça ou um banco de areia nos permite nos conectarmos, coração a coração, com corazones abiertos.”
Os perfis de Glória falam sobre o agir, sobre a ação.
Em tempos de descobrir-se branco e privilegiado, (sim, às pessoas estão se descobrindo), muitos brancos buscam compreender qual seria a sua configuração dentro desta sociedade que, convenhamos, ainda falta um caminhar de aprendizagem de gerações, eis que ainda encontramos posturas vestidas de empatia, nas entrelinhas dos discursos antirracistas.
Ao indicar uma empreendedora e um empreendedor preto, você homem/mulher branca e privilegiada, está agindo.
E, por favor, desapegue-se das posturas dos seus ancestrais escravocratas, não lhes cabe restringir as possibilidades dos seus colaboradores de se conectarem e se relacionarem com outros clientes.
Equilíbrio entre as necessidades operacionais pessoais e respeito pelas liberdades individuais dos colaboradores é o que há de bonito.
Juro de dedinho.
*Christiane Baladão, bicho raro, formada e por coração advogada, na época em que o curso levava sociais em seu nome, escritora por necessidade de expor a palavra, bailarina porque o corpo exige, professora porque a experiência da vida precisa ser compartilhada.