Eu respeito minhas obsessões. A mais recente é do time das melhores: aquelas que não tem nenhuma explicação consciente ou racional para me invadirem. Aleatoriamente, despretensiosamente, me dei conta que fico sempre atenta e acesa quando algo relacionado a faróis cruza meu olhar ou minha escuta.
Resolvi vir aqui falar sobre isso para entender ou então me livrar dela, se for o caso.
Faróis são construções junto ao oceano, com uma luz potente feita para orientar navios em alto mar. Altos, muitas vezes construídos em rochas em meio a um enorme nada feito de mar, orientam navegadores. Para mim, uma das maiores belezas dessa construção é ver vídeos onde ondas gigantes estouram nessas edificações, muitas vezes quase as cobrindo por completo. Fico intrigadíssima sobre como elas resistem, como não sucumbem à força monumental e sistemática das ondas? E quem lá dentro vive, isolado em meio ao oceano, provavelmente um barulho ensurdecedor e exaustivo, intercalado por provavelmente também ensurdecedores silêncios em momentos de calmaria. Talvez seja a solidão do faroleiro que faça o farol ser importante, bem como sua escuridão.
Drexler e Ramil já nos ensinaram que o que mais importa no farol não é a luz, mas os doze segundos de escuridão que leva a volta completa que o farol dá.
A psicanálise também ensina que a pulsão – essa força psíquica e também corporal que nos move tanto à vida quanto à destrutividade – para ser viva precisa da oscilação. Ninguém suportaria ser somente pulsão de vida nem somente pulsão de morte. O pisca alerta dos carros também só exerce sua função de alerta pela alternância da luz acesa e apagada.
Quem é capaz de viver sozinho em um farol? Como suportar a solidão? Ser farol do outros é suficiente para evitar colisões ou naufrágios? Os faróis em terra até me parecem mais suportáveis, mas aqueles em meio ao oceano me intrigam rotundamente. Alguém precisa estar lá. Alguém precisa cuidar para perceber se a luz queimar.
Por falar em queimar, lembrei do pai do meu primeiro namorado que certa vez veio nos contar sobre um processo seletivo ao qual foi submetido e uma das dinâmicas aplicadas aos candidatos era a pessoa riscar um fósforo e apresentar-se no tempo em que o fósforo queimasse. Nunca me esqueci e nunca consegui pensar no que eu falaria se tivesse o tempo de um queimar de fósforo para contar o que eu sou.
Talvez eu venha pensando em meus faroleiros internos, quão assustados eles estão, se são bem alimentados, se encontram paz mesmo em meio a ocasionais tormentas e tempestades dos meu mares. A questão é escolher bem os navegadores, mais do que acertar os faróis. Obsessões são respostas que se adiantaram a perguntas que precisamos nos fazer? Nesse caso, o que os faróis estão me sinalizando? Serei eu a faroleira?
Foto da Capa: Ilustração gerada por Pikaso
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